A estratégia de combate das esquerdas

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Por CELSO JAPIASSU*

Com o crescimento da extrema direita na Europa, que hoje lidera as pesquisas em novembro países e ocupa o segundo lugar em outros nove, a esquerda pergunta a si mesma o que fazer. Nas eleições do ano passado para o Parlamento Europeu, houve o que muitos classificam como “uma viragem acentuada à direita”. Os partidos de esquerda reagiram a esse avanço com uma nova Aliança de Esquerda Europeia pelo Povo e pelo Planeta dispostos a conter o aparente sucesso da direita radical.

Mas nem tudo foi vitória reacionária. O grupo europeu A Esquerda cresceu nas eleições, principalmente nos países onde a extrema direita está no poder ou condiciona o governo.

Na França, uma frente popular uniu organizações de esquerda, obtendo sucesso contra o partido de Marine Le Pen e há esforços para manter uma grande coalizão entre partidos populares, socialistas e liberais na União Europeia. No Reino Unido, o Partido Trabalhista adotou uma abordagem moderada com um candidato pragmático e propostas para problemas reais da população. Venceu as eleições.

As Estratégias

Na elaboração de suas estratégias eleitorais, partidos como La France Insoumise defendem plataformas de cunho social, rejeitando medidas de austeridade e políticas xenófobas e antiecológicas. Os partidos de centro-esquerda passaram a se posicionar firmemente em oposição a temas caros à direita como a glorificação da violência, xenofobia, homofobia e ultranacionalismo.

A esquerda defende o investimento em educação e pesquisa e se posiciona na defesa de programas nas áreas de educação, mídia, saúde mental e apoio às famílias para prevenir a radicalização. Ao mesmo tempo em que cria centros de pesquisa especializados no estudo do extremismo.

Os partidos progressistas buscam se unir para criar frentes amplas contra a extrema direita. Na Alemanha, há entendimentos para formar uma aliança entre social-democratas, ex-comunistas e verdes e em outros países há abordagens pragmáticas como a aproximação com partidos de centro para preservar a União Europeia, que sofre constantes ataques da extrema direita.

 Procura-se fortalecer a luta nas ruas e a construção de uma nova hegemonia a partir da base. O Instituto Rosa de Luxemburgo, da Alemanha, criou eventos internacionais como o “Good Night, Far Right” para debater estratégias antifascistas em nível global.

Há posicionamento firme de alerta sobre os riscos da normalização de mensagens extremistas na sociedade e a criação de uma grande coalizão no Parlamento Europeu.

Apesar desses esforços, a extrema direita continua ganhando força em algumas regiões, o que tem levado a debates sobre a eficácia das estratégias atuais e a necessidade de novas abordagens para enfrentar o grande desafio político.

França

O governo francês, liderado pelo primeiro-ministro centrista François Bayrou, sobreviveu recentemente a duas moções de censura apresentadas pela esquerda. O orçamento para 2025 foi aprovado e visa reduzir o déficit para 5,4% do PIB pelo corte nas despesas e o aumento de impostos.

Há entendimentos para a formação de blocos centristas com o objetivo de combater a extrema direita, embora com algumas divergências internas sobre como lidar com o Rassemblement National (RN) de Marine Le Pen, que há pouco foi declarada inelegível por desvio de verbas oficiais. E a obrigação de uso de tornozeleira eletrônica.

Recentemente, ocorreram protestos de massa contra o racismo e a ascensão da extrema direita. Cerca de 90 mil pessoas participaram em todo o país.

Alemanha

As recentes eleições federais resultaram em uma vitória dos conservadores da CDU (União Democrata Cristã), com 29% dos votos, mas também o avanço da extrema direita.

O partido neonazista AfD (Alternativa para a Alemanha) obteve um resultado classificado pela imprensa como histórico, com a conquista de 25% das cadeiras no parlamento.

Friedrich Merz, líder da CDU, afirmou categoricamente que seu partido “nunca” trabalhará com a AfD, que nomeou como “o adversário mais importante”.

Há debate sobre o impacto da queda demográfica e da migração de jovens das áreas rurais para as cidades, o que tem favorecido o crescimento da extrema direita.

Ambos os países estão enfrentando pressões para endurecer suas políticas migratórias, enquanto tentam manter o equilíbrio político e combater o avanço da extrema direita. A situação permanece tensa e em constante evolução, com protestos e debates públicos intensos sobre o futuro político dos dois países que lideram a União Europeia.

Redes sociais

Alguns partidos de esquerda têm tido destaque nas redes sociais como é o caso do Podemos (Espanha) que tem alto engajamento nas redes, especialmente no Facebook. O Bloco de Esquerda (Portugal), embora com menor engajamento que o Podemos, tem utilizado as redes sociais para comunicação direta com o eleitorado, especialmente o jovem.

O Partido Trabalhista do Reino Unido, partido social-democrata de centro-esquerda, tem mantido posição relevante no cenário político e o AKEL (Partido Comunista de Chipre), um dos partidos comunistas mais bem-sucedidos da Europa, está presente nas coalizões que governam o país.

O Tik Tok e o Instagram têm se revelado como as mais bem sucedidas plataformas junto ao público jovem e a esquerda europeia tem aumentado nelas a sua presença. Os partidos de esquerda acumularam 17 milhões de curtidas no Tik Tok e Jean-Luc Mélenchon, líder de esquerda na França, tem cerca de 40 milhões de curtidas nessa plataforma.

Na criação de conteúdo, procura-se utilizar linguagem direta e acessível ao público jovem, formatos que buscam viralização e uso de humor para despertar a atenção, com foco nas questões que preocupam os jovens, como a garantia da paz na Europa. Na França, influenciadores populares estão usando suas plataformas para apelar aos jovens que votem contra a extrema-direita. Na Alemanha, o partido A Esquerda (Die Link), que registrou um ingresso recorde de novos filiados, com média de idade de 28 anos, foi o mais votado (21%) em uma eleição simulada entre menores de 18 anos.

Apesar desses esforços, os partidos de esquerda ainda enfrentam dificuldades para competir naquelas plataformas com a extrema-direita no desafio de atrair os eleitores jovens. A simplificação excessiva das questões políticas e a formação de bolhas ideológicas são preocupações associadas tanto ao uso do TikTok quanto do Instagram.

A estratégia da extrema direita nas redes é a de cooptação gradual. Para atrair seguidores, inicia com abordagens aparentemente inofensivas escalando gradualmente para conteúdos mais extremos. Explora preconceitos latentes e aproveita-se das frustrações para assim moldar identidade conservadora e alimentar a intolerância.


Publicado originalmente em Fórum 21.

*Celso Japiassu é autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).

Foto de capa: Macron foi considerado o grande perdedor das eleições para a União Europeia na França / AFP

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