Por ANGELO CAVALCANTE*
A estranha “ditadura do judiciário” não admite tortura como meio de obtenção de provas ou confissões; não suplicia infelizes para a entrega de nomes ou de “culpados” e diferentemente, estabelece regras claras, públicas e republicanas para todos os seus procedimentos.
Na “ditadura do judiciário”, vejam bem, advogados adentram no mais íntimo e profundo de cadeias e presídios para verificar a situação de presos e condenados; da mesma forma, guardas, policiais e outros agentes, no abuso de suas funções, são denunciados sem titubeios ou vacilos.
Alguns são repreendidos, outros são expulsos de suas funções e outros, pior ainda, são presos.
Na “ditadura do judiciário”, acusações são formalizadas, os acusados podem e devem se defender até aos “confins do mundo”; podem constituir defesas onde advogados atentos e preparados entram em cena; não por menos, os mesmos acusados podem, quando quiserem, trocar de advogados.
Na “ditadura do judiciário”, as partes se encontram em debates e embates públicos onde, por sinal, pessoas do comum, podem assistir, acompanhar tais discussões.
Ao fim, a tese derrotada pode recorrer, exigir revisão de provas, documentos e quem sabe, pode ainda solicitar a nulidade deste ou daquele julgamento.
Na “ditadura do judiciário” juízes e desembargadores não fazem o que querem… Jamais fazem o que querem; cumprem códigos, leis, protocolos e determinações e que, por sinal, amparam e reforçam a lei pública.
Na falta ou na impostura de um magistrado, eu, você ou o seu Francisco e que vende pipocas, podemos denunciar esse mesmo juiz.
Aliás, além das ouvidorias dos tribunais de justiça, há ainda um órgão nacional de acompanhamento e observância dos juízes do Brasil, se chama, se diz Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Nesse particular, juízes, caso cometam crimes, podem ser desligados, exonerados e detidos.
Na “ditadura do judiciário”, um processo segue um rito previsível e anunciado desde seu protocolo inicial; há tempo de estudo e preparo às causas em questão; há um calendário de audiências previamente anunciado e tudo é público, comum e publicado.
Na estranha “ditadura do judiciário” as audiências da principal corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF), reparem bem, são televisionadas.
Qualquer um de nós, do próprio telefone celular, pode acompanhar tais e quais julgamentos e deliberações de casa, do bar ou da praia.
Bom, uma coisa é certa na “ditadura do judiciário”: ninguém será condenado à forca; ninguém será decapitado sob uma guilhotina afiada e; ninguém será submetido a pelotões de fuzilamento.
Na “ditadura do proletariado”, mulheres e homens condenados não estarão nas mesmas celas; ao contrário, seguirão para presídios masculinos e femininos.
Na “ditadura do judiciário”, crianças não podem ser condenadas e presas; uma condenada, caso esteja grávida, poderá ter seu filho e do mesmo modo, poderá amamentar seu rebento.
A esse específico respeito, deixemos claro, o sistema prisional brasileiro é uma tragédia e aberto atentado aos direitos mais fundamentais da pessoa humana, ainda assim, a “ditadura do judiciário” reconhece falhas, erros e impossibilidades.
A “ditadura do judiciário” firmou e afirmou os plenos direitos de pessoas LGBT; reconheceu “terras de preto”, garantindo legitimidade, escritura e reconhecimento público aos territórios quilombolas; do mesmo modo, a terrível “ditadura da toga” garantiu terras e reservas indígenas por todo o Brasil.
A curiosa “ditadura do judiciário” reconhecendo que todos somos iguais e que todos estamos igualmente submetidos ao império da lei, acaba de condenar e aprisionar um ex-presidente por tentativa de golpe de Estado e que, por pouco, não desmantela essa “ditadura”.
Em que pese erros, falhas e contradições, um salve ao judiciário brasileiro!
Sem anistia!
*Angelo Cavalcante é economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Itumbiara.
E-mail : angelo.cavalcante@ueg.br
Foto de capa: Reprodução




