Por SOLON SALDANHA*
Vem do latim commandare o verbo comandar. Na sua acepção original buscava explicar o que é gerir, investir alguém com uma missão. Como em geral acontece, bastou que o termo fosse apropriado por militares e se tornou “dar ordens, determinar, obrigar”. Ou seja, um reforço ao velho conceito da imposição pela força, pela hierarquia. Ficaram com a parte final da palavra: coMANDAR. Quem pode faz isso enquanto os demais devem obedecer sem nada questionar. Desta forma, se torna algo totalmente avesso ao “liderar”. Quem lidera inspira, engaja sua equipe. Quem lidera conquista a confiança pelo exemplo, pelo conhecimento e experiência, pela real capacidade pessoal.
A Câmara Municipal de Vereadores de Porto Alegre tem como presidente desde 1º de janeiro de 2025 uma vereadora eleita pelo PL. Ela prefere se apresentar como “Comandante Nádia”, ao invés de fazer uso do nome próprio completo – ou uma parte dele –, que é Nádia Rodrigues Silveira Gerhard. Se agarra ao fato de ser tenente-coronel da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, onde entrou em 1989. Ela foi a primeira mulher a comandar um batalhão daquela instituição: o 40º, com sede no Vale do Taquari. Conhecida pela sua agressividade e truculência, durante este ano já se envolveu em casos bem emblemáticos, como aquele episódio recente no qual determinou que as forças de segurança fizessem uso de gás lacrimogêneo e balas de borracha contra populares e parlamentares da oposição, que se manifestavam pacificamente contra uma decisão. A vereadora Atena Roveda (PSOL) acabou hospitalizada.
Durante sua presidência também estão sendo pautados vários projetos de grande potencial polêmico, como o que pretendia penalizar pessoas e grupos de voluntários que oferecem alimentação para moradores de rua da Capital. Ou ainda o que determina a obrigatoriedade de instalação de câmaras – vídeo e áudio – em todas as salas de aula da totalidade das escolas municipais, para exercer controle sobre conteúdos e constranger os docentes. Podem ser incluídas a privatização do Dmae; a revisão do Plano Diretor, com a permissão de prédios mais altos e menor recuo, atendendo interesses de construtoras; e ainda a alteração no Código de Limpeza Urbana, que impacta na vida dos catadores, inviabilizando seu trabalho e afetando sua sobrevivência.
Pois agora a Comandante Nádia está pedindo a cassação de cinco dos 12 vereadores de oposição, o que facilitaria muito o trabalho da bancada situacionista. Interessante é a razão alegada: eles usaram uma sala que não poderia ter sido utilizada, posto que seu fim é distinto, para a leitura de um relatório paralelo da CPI do Dmae. Na representação que ela encaminhou pedindo o processo disciplinar, no entanto, não consta a informação de que o local inadequado foi a alternativa encontrada, uma vez que ela mesma negara ao grupo conversar com a imprensa na sala existente para esse fim. Assim sendo, Natasha Ferreira, Aldacir Oliboni e Juliana de Souza (três do PT), mais Giovani Culau e Coletivo (PCdoB) e Roberto Robaina (PSOL) ficam ameaçados de perder os seus mandatos.
Ao contrário da vida militar, comandar um poder legislativo sugere que a pessoa tenha uma enorme capacidade de diálogo. O exercício do cargo cobra condições pessoais para também ouvir, além de falar. Exige que tenha flexibilidade, condições para estabelecer negociações. Isso para aceitar a normal pluralidade dos pontos de vista em tudo. Nenhuma dessas habilidades integram a lista de qualidades da Comandante Nádia.
Já que iniciei esse texto explicando a origem de uma palavra, me deixem concluir fazendo o mesmo, sobre outras duas. NÁDIA se trata deum nome feminino de origem dupla. Deriva de Nadezhda (russo), que significa esperança; mas também lhe é atribuída uma raiz árabe, Naadiya, que aponta aquela que anuncia, a identificação de um espírito de luz. Conheço ao menos uma Nádia, desde minha época de estudante universitário, que é exatamente isso tudo, na expressão perfeita da sua generosidade e empatia. Mas, infelizmente, há quem não honre nada disso. Por outro lado, NAJA vem do sânscrito Nãga, que pode ser traduzido como cobra. Depois, foi o termo incorporado ao latim científico para identificar o gênero de muitas serpentes venenosas, as cobras-capelo, peçonhentas conhecidas por expandirem o pescoço ao se sentirem de algum modo ameaçadas. Existem pessoas tão perigosas quanto elas, algumas até em cargos eletivos.
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*Solon Saldanha é jornalista e blogueiro.
Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades.
Foto de capa: Comandante Nádia em entrevista para o Bom Dia Rio Grande na sexta-feira (9) | RBS TV/Reprodução




