Curtas
Vinícolas ligadas a trabalho escravo têm R$ 66 mi em empréstimos ativos no BNDES
Vinícolas ligadas a trabalho escravo têm R$ 66 mi em empréstimos ativos no BNDES
Banco público estuda medidas que podem ser tomadas contra as empresas Salton, Aurora e Garibaldi
Três vinícolas que usavam mão-de-obra de trabalhadores terceirizados mantidos sob condições análogas à escravidão têm ao menos 18 empréstimos ativos no Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), os quais totalizam R$ 66,2 milhões.
Os dados de contratos firmados pelo BNDES com as vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton estão disponíveis no site do banco.
Empréstimos ativos são aqueles que não foram quitados pelas empresas. O site do BNDES não informa eventuais pagamentos parciais dos financiamentos. Isso quer dizer que é possível que uma parte dos R$ 66 milhões já tenha retornado ao banco.
Ao todo, essas mesmas empresas obtiveram 147 empréstimos com recursos do BNDES, no valor total de R$ 148 milhões. Desse total, 129 empréstimos, totalizando R$ 82 milhões, já foram liquidados.
Aurora, Garibaldi e Salton estão sediadas na chamada Serra Gaúcha. Foi lá – mais especificamente em Bento Gonçalves (RS) – que foram resgatadas 206 pessoas, entre 18 e 57 anos, que colhiam uvas usadas pelas vinícolas a serviço de uma empresa terceirizada: a Fênix Serviços Administrativos e Apoio a Gestão de Saúde LTDA.
Em entrevista ao UOL na terça-feira (7), Tereza Campello, diretora da área socioambiental do BNDES, afirmou que o banco está fazendo um levantamento sobre medidas que podem ser tomadas contra as empresas. “Há um procedimento legal que tem que ser seguido”, ressaltou.
Segundo Campello, em último caso, o BNDES poderia determinar a antecipação do pagamento dos financiamentos ativos. “Se a empresa entra na lista suja do trabalho escravo, dependendo da situação, a empresa tem que devolver o dinheiro.”
Aurora
- 25 empréstimos, com valor total de R$ 49 milhões
- 6 empréstimos ativos, com valor total de R$ 29,2 milhões
- Último empréstimo é setembro de 2022, de R$ 10 milhões
Garibaldi
- 45 empréstimos, com valor total de R$ 25 milhões
- 10 empréstimos ativos, com valor total de R$ 13,9 milhões
- Último empréstimo é setembro de 2022, de R$ 1,4 milhão
Salton
- 77 empréstimos, com valor total de R$ 73 milhões
- 2 empréstimos ativos, com valor total de R$ 23 milhões
- Último empréstimo é abril de 2022, de R$ 13 milhões
Total
- 147 empréstimos, com valor total de R$ 148 milhões
- 18 empréstimos ativos, com valor total de 66,2 milhões
Caso exemplar
Campello disse também que espera que o caso das vinícolas se torne um marco no combate ao trabalho análogo à escravidão. “Eu acho que esse caso vai ser exemplar”, disse. “É uma vergonha, uma tragédia, mas vai cumprir um papel, que é mostrar que daqui para frente as coisas vão ser diferentes.”
“Nossas regras estão sendo revisadas para impedir o atraso [trabalho análogo a escravidão]”, acrescentou. “Temos um dever de casa a fazer.”
Procurado para comentar os empréstimos específicos para as vinícolas, o BNDES informou que não compactua com empresas que estejam na chamada Lista Suja do Trabalho Escravo, elaborada pelo Ministério do Trabalho. “Prova disso é que já existem normativos do banco que impedem a realização contratos com empresas que estejam na referida lista.”
O BNDES confirmou que também pode punir empresas que entrarem na tal lista. “Caso alguma empresa com operação já contratada com o BNDES seja incluída no referido cadastro, essa operação será submetida imediatamente a cancelamento e vencimento antecipado”, reforçou o banco.
O BNDES declarou que está acompanhando as investigações sobre o caso. Lembrou que as empresas mencionadas obtiveram empréstimos indiretos do banco, ou seja, por meio de outras instituições financeiras.
A vinícola Garibaldi também não se pronunciou sobre os empréstimos e eventuais punições do BNDES. Aurora e Salton não responderam.
As empresas divulgaram em seus sites cartas abertas se solidarizando com os trabalhadores resgatados e prometendo melhorias em seus processos.
Matéria publicada originalmente pelo Brasil de Fato.
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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