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Opinião

Três viejitos y un guri

Três viejitos y un guri

Artigo por RED
10/01/2023 10:42 • Atualizado em 29/11/2023 19:56

DE ALCEU VAN DER SAND

Há vários dias vinha adiando um escrito, que teria a ver ainda com as emoções da posse do primeiro dia do ano. Não é que uma semana depois, somos surpreendidos com a tremenda barbárie ocorrida em Brasília.
Mas o meu escrito, após a tragédia, cresceu em mim e tomou dimensão muito maior. Minha intenção era resgatar uma cena da posse de Lula, a qual, para mim, foi um dos maiores exemplos de civilidade do evento. Se trata dos “viejitos” do Uruguai.
Pessoalmente, mantenho amizades duradouras com pessoas do Uruguai. Aprendi a conhecer não só o Uruguai turístico como Montevideo, Colonia del Sacramento, Punta del Este, o icônico Cabo Polônio e outros. Conheço um pouco do interior, da vida rural, das paisagens pastoris e, em especial, Melo. A cidade que protagonizou um lindo filme, El baño del Papa. Até uma viagem apoiando amigos ciclistas fiz pela República Oriental del Uruguay. Aprendi a admirar a forma de vida desse povo. Para nós, o tempo lá, anda a passos mais lentos. Ah, alguém que for ao Uruguai, não deixe de ir ao Mercado del Puerto. Para uma boa carne, recomendo a Cabaña Verónica. Eu teria muitas passagens pitorescas a relatar, as deixarei para um, talvez, escrito de memórias.
Na primeira década deste século, viajei muito ao Uruguai a trabalho. Minhas andanças exigiam contatos com setores especializados na esfera de governo. Sempre ia acompanhado por um amigo uruguaio, do interior. Uma pessoa discreta, daqueles que não aparentam grandes articulações políticas. Mas para cada assunto a ser tratado, ou burocracia a ser vencida, ele dizia: ” isso é com fulano, eso es con mengano”, e assim seguíamos. Até que um dia perguntei a ele. Mas amigo, você conhece muita gente hein? E a resposta veio na hora: “Acá, nos conocimos a casi todos”. Mas é claro, um país de três milhões de habitantes, com uma área menor que o nosso Rio Grande. Ouvi essa expressão também do Presidente Mujica quando da implantação do regime de venda e consumo de

maconha no país. Ele se referia aos usuários e aos mecanismos de controle da canabis. Quem quiser entender isso com algum tipo de preconceito, uso o jargão que o ministro Haddad usou há poucos dias atrás. “Vá se informar”. É assunto para outro momento.
O que me interessa relatar hoje se relaciona à posse de Lula. A cena dos cumprimentos da delegação Uruguaia, assim como tantas outras, me emocionou. Lá vieram o Presidente Lacalle Pou, acompanhado de não mais nem menos de que outros dois ex-presidentes, ícones uruguaios: o ex-Presidente Julio Maria Sanguinetti e o ex-Presidente Pepe Mujica. Sanguinetti foi o primeiro presidente eleito após a sanguinária ditadura uruguaia. Foi também contemporâneo de Sarney, no Brasil, e, Alfonsin, na Argentina. De braços dados, o jovem presidente liberal conduz, juntamente com Sanguinetti, o mundialmente aclamado, Pepe Mujica. Três vertentes políticas distintas, mas que convivem com civilidade. A foto abaixo mostra bem o que o momento simbolizava.
Na hora em que os quatro se abraçavam, eu recordava que o nosso inominável, covardemente fugiu. Não foi capaz de um último gesto de civilidade. Esta foto, assim como tantas outras, que mostra a convivência de Lula com inúmeros líderes internacionais, me encheu de esperança. É daquelas que os mais velhos educam os mais jovens com exemplos. Enfim, uma imagem de muitos significados.
Um país pequeno, onde quase todos se conhecem, e aprenderam conviver com civilidade e respeito, vem aqui, e nos dá uma lição de democracia.

Repito um jargão: existe gente que não vê nada demais em cenas como essas, não se emociona. E existem seres humanos.
Como eu gostaria que fôssemos um pouco mais uruguaios.

 

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