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Opinião

Proposta principesca e desonrosa

Proposta principesca e desonrosa

Artigo por RED
16/03/2023 05:30 • Atualizado em 18/03/2023 00:22
Proposta principesca e desonrosa

De NUBIA SILVEIRA*

Preconceito e massa de pão, me parece, dividem uma mesma característica – quanto mais se bate neles, mais crescem –, apesar das diferenças entre os substantivos. Do preconceito não se espera nada de bom. A massa de pão, ao contrário, é a promessa de que logo teremos algo saboroso para provar. Alguém pode contestar esta minha afirmação e dizer que a sociedade brasileira já avançou muito contra os filhos indesejados do preconceito: intolerância, discriminação, racismo, xenofobismo, misoginia, misandria, transfobia e tantas outras palavras com caráter negativo. Eu respondo com as notícias que leio na internet, nos jornais, nas redes sociais: trabalhadores sendo escravizados, PM chicoteando um homem negro, jovens atacando uma colega por ter o dobro (ou mais) das suas idades, deputado recolhendo assinaturas para propor uma PEC  (Proposta de Emenda à Constituição) com o fim de extinguir o MPT – Ministério Público do Trabalho, o TST – Tribunal Superior do Trabalho e os TRTs – Tribunais Regionais do Trabalho. Por mais que lutemos, os rebentos preconceituosos estão por aí, nos assustando.

A velha, surrada e bem humorada frase do jornalista Aparício Torelly, o Barão de Itararé, é perfeita para se definir o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP): “De onde menos se espera, daí é que não sai nada”. Ou sai a vontade de retroceder ao século XVI, quando o Brasil, algumas décadas depois do seu descobrimento, começou a importar africanos, que seriam escravizados.

Descendente da dinastia de Bragança, iniciada em Portugal por Dom João IV, em 1640, o “príncipe” declarou, em 2019, em discurso na Câmara, que “a escravidão é tão antiga quanto a humanidade, é quase da natureza humana”. Para ele, explorar, espoliar, subjugar, castigar alguém é “da nossa natureza, faz parte do ser humano”. Inacreditável que um membro da família Orleans e Bragança, surgida pelo casamento da Princesa Isabel com o Conde D’Eu, em 1864, tenha feito tais afirmações. Pior: elas foram feitas durante uma sessão solene em homenagem à Lei Áurea, assinada pela princesa em 13 de maio de 1888.

O deputado, que teve o descaramento de desrespeitar a memória de sua trisavó, agora despreza a inteligência de brasileiros e brasileiras. Sua proposta de acabar com o MPT e os Tribunais do Trabalho, responsáveis por combater o trabalho escravo, conta com o apoio, em especial, de parlamentares de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. A direita não respeita os trabalhadores, já se sabe. Mas chegar ao ponto de agir politicamente para beneficiar exploradores e escravocratas, como os encontrados aqui no RS, é muito descaramento.

Segundo o DCM – Diário do Centro do Mundo –, a proposta do autointitulado “príncipe do Brasil” (escravizar deve estar no DNA do proponente) conta com o apoio das bancadas da Bíblia e da Bala (acredite, elas existem). O brabo é que de grande parte deste Congresso pode-se esperar de tudo. Até que um dos herdeiros de Dom Pedro II conquiste as 171 assinaturas para a apresentação desonrosa da PEC. Vivemos numa república democrática, mas “dom” Luiz e seus apoiadores lutam por uma república autoritária. Ou, se der, pelo retorno da monarquia escravista.


*Jornalista, trabalhou em jornal, TV e assessoria de imprensa, em Porto Alegre, Brasília e Florianópolis. Foi repórter, editora e secretária de redação. Idealizadora do programa Espaço Plural da RED – Rede Estação Democracia.

Imagem em Pixabay.

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