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Opinião

Para que Ministério das Cidades

Para que Ministério das Cidades

Artigo por RED
15/12/2022 15:00 • Atualizado em 16/12/2022 12:02
Para que Ministério das Cidades

De CLÁUDIO DI MAURO*

Um extraordinário avanço obtido no primeiro mandato do Presidente Lula foi a criação do Ministério das Cidades. Marca inédita e de suma importância.

Mas… com tristeza este Ministério foi submetido à desculpa de sempre, muitas vezes verdadeira… a garantia da governabilidade. Foi colocado nas mãos das “raposas que cuidam do galinheiro”.

Quase 90 % da população brasileira habita as Cidades. É “envergonhante” saber que após o crescimento e a derrocada aplicada ao Ministério das Cidades as populações urbanas continuam sem qualquer programa que lhes permita pensar em Urbanismo capaz de oferecer vida digna e decente.

Não se pode esquecer da diversidade e grandeza territorial do Brasil para se pensar suas cidades. As legislações habitacionais vigentes, por exemplo, não reconhecem as diversidades como:

– Na Amazônia a cidadania e seus povos em geral convivem com os rios, com as águas. Muitas palafitas se reproduzem nas cidades e habitantes vivem em casas sobre as águas. O convívio com as águas é uma das características marcantes e, portanto, seus projetos não podem ser iguais aos aplicados no Sudeste, como aqueles que chamamos de Carimbões (repetem-se em todo o País e devem ser construídos por engenheiros “especialistas na área”), feitos independente de suas características dos componentes da natureza e de suas relações sociais, econômicas e ambientais. Tudo tem que ser aplanado com cortes e aterros, uma verdadeira “barbaridade” que não reconhece e não respeita as diversidades naturais;

-No semiárido as características são também muito diversas. A necessidade de acesso à água é uma de suas condições de essência. O que se planeja para atender essa demanda?

-No Sul e no Sudeste o nível de ocupação dos territórios pedem projetos específicos, pensando nas contaminações das águas superficiais e nos impactos que são gerados para seus lençóis de águas dos aquíferos livres e subsuperficiais;

-Agora, quando já não estamos mais ameaçados, mas vivendo e enxergando “a olhos nus” as mudanças climáticas, o modelo migratório e as características da urbanização estão diante de seus verdadeiros caos. Secas e enchentes se alternam nos territórios e portanto nos tempos e espaços;

-Fomos levados ao verdadeiro caos urbano tendo em vista o caráter adotado pelos processos migratórios que levaram e ainda levam setores populacionais que habitavam territórios rurais em busca de condições de vida prometidas pela modernidade da urbanização. Esse é um componente das causas da profunda derrocada do sistema. Há quem imagine que isso ocorreu de maneira natural, portanto os responsáveis são os setores subalternizados que se deslocaram para as cidades. Ao contrário, isso foi tudo planejado pelos donos das terras, pelos setores financeiros, corporativos empresariais e pelos empreendedores imobiliários… Tudo isso em conluio e adotado nos projetos e “planejamento” governamentais. Se há inocentes nessas histórias, são as vítimas da ganância e do sistema. Em outras palavras, não houve acaso ou acontecimentos naturais, foi e é algo deliberado, planejado para atender os interesses dos donos do capital financeiro, empresarial corporativo e imobiliário. Afinal, vivemos em um sistema capitalista, interessado na gana da concentração de renda e dos componentes da natureza.

A derrocada do Ministério das Cidades ocorreu quando o governo federal retirou o caráter público definido em sua criação, para entregá-lo aos interesses privados comandados nas barganhas políticas. Ah! Governabilidade.

O que Lula e sua equipe planejam para reedição desse importante Ministério, sem os vícios que o levaram para o ostracismo e entrega aos poderosos do setor? Um Ministério que se destina a atender toda população urbana, não pode deixar de se constituir em prioritário.

Todas as políticas de saneamento, habitações, relações cidade-campo, alimentação e segurança alimentar, mobilidades devem se integrar a partir das políticas que estarão destinadas aos espaços de concentração das populações. Não pensar isso de maneira integrada e articulada é abandonar os interesses públicos.

Para que isso seja entendido, será necessária a definição de alguns pontos que possuem a centralidade na definição de qual será o País que se planeja implementar:

– em mãos de quem estará o Ministério das Cidades?

– os programas e projetos serão construídos em processos democráticos e participativos, sem que reclamem sobre a falta de tempo para tal construção coletiva?

– serão chamados para as mesas de negociação os setores populares que estão excluídos do acesso à cidade e suas edificações que deveriam cumprir funções sociais?

– o governo estará disposto a garantir um processo com despejo zero, especialmente para os setores sociais que não possuem residência própria? Como serão atendidos os movimentos de favelados e ocupações? Inclusive no processo de planejamento e execução das políticas?

– o setor de mobilidade urbana com o transporte coletivo estará sujeito e permitirá o uso por parte dos setores populares?

– os desenhos urbanos estarão dispostos a contemplar os setores sociais excluídos de acesso à cidade e à moradia digna? Inclusive com a organização popular para aplicação da Educação Popular, objetivando o desenvolvimento da formação cidadã?

– as políticas para as cidades e moradias receberão o aval da construção coletiva e receberão os financiamentos necessários para suas implementações?

Enfim, há muitas perguntas que precisarão ser respondidas nesse processo de organização do Novo Ministério das Cidades. Certamente se ele tivesse tido continuidade nos seus moldes originais, tais questões já poderiam estar respondidas.

Mas, agora, chegou a hora do governo que apoiamos demonstrar por onde caminhará.

Afinal, PARA QUE MINISTÉRIO DAS CIDADES?


*Geógrafo e ambientalista, docente em Planejamento e Gestão Urbana, e também em Territorial e de Bacias Hidrográficas.

Imagem em Pixabay.

As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.

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