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Os Partidos Políticos e os Velhos e Novos Desafios
Os Partidos Políticos e os Velhos e Novos Desafios
Por LINCOLN PENNA*
O tema proposto é espinhoso, mas não deve por isso ser evitado. Não se trata de interferir na atividade dos quadros militantes, especialmente dos partidos de esquerda, mais refratários a eventuais colocações que venham de fora da organização partidária. Não me refiro tanto aos de direita em razão destes terem pouca disposição no trato dessa questão, pois em geral dispensam sugestões alheias, sobretudo, aqueles da direita extremada.
Tenho percebido que de uns tempos para cá a multiplicação de legendas que se intitulam partidos. Essas legendas costumam sr limitar a uns poucos dirigentes voltados quase sempre para apresentar candidaturas aos pleitos eleitorais, não tendo qualquer vida partidária. A finalidade consiste apenas na apresentação de candidatos arrebanhados sem critérios. Ou seja, são o que denomino de escritórios eleitorais. O único fator mobilizador desses ditos partidos tem a ver com interesse pessoal, jamais o interesse público. Este figura apenas nos discursos de campanha.
Essa questão se torna relevante não em função exclusivamente das eleições que possam ter favorecido e até fortalecido ou não um determinado partido, mas em virtude de se conviver em nosso mundo político e eleitoral com siglas ou legendas voltadas quase exclusivamente para os pleitos eleitorais, que deveriam eleger os representantes da vontade de seus eleitores, com base nas promessas de quem as produziu. Contudo, o que ocorre é a prevalência do interesse privado do candidato e nada mais. E quando compartilham com projetos distintos o fazem para tirar proveito de alguma forma.
Diferente é o caso de partidos que praticam o exercício do que chamaria de consenso mínimo, de modo a ter a possibilidade de interagir tanto com a direita quanto com a esquerda. Não se trata essencialmente de uma conciliação. Esta consiste em abrir mão de suas concepções, para costurar acordos. A construção de consenso é comum em situações embaraçosas ou em relação a atos antidemocráticos. Situações em que é justo e necessário que se pactue um arco de interesses comuns para evitar o pior. Mas os protagonistas do consenso mínimo pode vir da esquerda ou até da direita. Já o Centrão é uma falácia. Trata-se de um grande escritório eleitoral.
A atitude fisiológica dessas siglas de aluguel a se juntarem de maneira oportunista a quem esteja momentaneamente no exercício governamental, não importa se na esfera municipal, estadual ou federal, é que define o caráter do que estou batizando de escritório eleitoral. Uma medida correta, embora cravejada de críticas apressadas, foi a da adoção da cláusula de barreira. Não se trata, a meu ver, de uma legislação contra os pequenos partidos, sejam eles de cunho ideológico ou não, mas uma forma de provocar que aquelas legendas que desejam efetivamente se tornarem uma representação de uma parte da sociedade assim o faça mediante a implementação de atividades que mereçam a denominação de partidos políticos.
Os desafios não se limitam a essas observações, mas a questões que me parecem muito mais instigantes e que precisam ser enfrentadas. Uma delas é a capacidade de assumir projetos que venham ao encontro do conjunto da cidadania, mesmo que um determinado partido tenha afinidades e ou identidades com determinadas classes sociais.
Afinal, numa sociedade de classes com desigualdade bem acentuada , como a brasileira e a de tantos outros países que não resolveram até hoje esse grave e trágico problema, deve haver uma configuração que abrigue uma direita que sustente a manutenção das instituições injustas porque dela tira enormes vantagens; e, uma esquerda cujo papel é o de propor e lutar por transformações que liquidem essas estruturas obsoletas e antidemocráticas.
O uso por vezes abusivo do centro como uma alternativa às tendências de direita ou esquerda, de modo a qualificá-lo como campo ideológico é equivocado porque em política só existem dois lados. O centro não é lado. Na realidade, o centro não é nada, a menos que se entenda tratar-se de uma corrente que aposta como projeto permanente na construção de consensos, tal como mencionei anteriormente. Nesse caso, faz sentido, como sentido também faz a qualificação de centro-direita e centro-esquerda, ou seja, ações de um desses dois lados de natureza ideológica capazes de fazer política.
Sobre isso, penso que essas formas de identificar diferenças no campo da esquerda como do campo da direita de tendências que se aproximam do centro enquanto lugar de acertos possíveis e negociáveis, como a de não se aferrarem de suas matrizes fundamentais é um equívoco no sentido de negarem as aftjculações politicas que são inerentes às lutas parlamentares e ou sindicais. E o pior é que essa negação decorre geralmente dos próprios membros de cada um desses lado na disputa política e ideológica. Em geral, nos países ocidentais essas diferenciações ou não existem, ou quando muito são aplicadas em momentos de luta interna de alguns partidos de forma a qualificar mais fortemente os que seriam autênticos em relação aos não tão autênticos assim, mas isso não chega a ganhar maior destaque na mídia ou até junto ao eleitorado de ambas as correntes.
Esse é um desafio permanente porquanto se trata da matéria-prima da ação dos partidos justamente por serem instâncias do jogo de interesses políticos. A recusa do diálogo, dos embates ao nível da argumentação e não da intolerância, que desqualifica os embates democráticos, representa, nunca é demais repetir, a negação da própria política. E como a política se ocupa da polis, isto é, de nossas moradias que são as cidades geridas pelos nossos representantes é indispensável que examinemos o que se passa na nossa moradia maior, enfim, na nossa casa, que é o planeta Terra.
Eis, um outro desafio que se encontra na ordem do dia. Ou bem através da política se conscientize a humanidade de que está em curso um processo de mutação climática com implicações severas ainda inimagináveis, diante dos já denominamos de eventos extremos, ou seremos todos afetados duramente pelo que vem por aí. Particularmente as novas e novíssimas gerações, cuja existência nos cabe proteger minimamente.
*Doutor em História Social; Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON); Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos).
Foto: Divulgação
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