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Opinião

Os bastidores de uma guerra suja

Os bastidores de uma guerra suja

Artigo por RED
14/04/2024 05:25 • Atualizado em 15/04/2024 20:19
Os bastidores de uma guerra suja

De LENEIDE DUARTE-PLON*, de Paris

O excelente documentário de José Joffily revela a postura ética do brasileiro que resistiu às pressões de Bush

O mundo inteiro viu Colin Powell, secretário de Estado de George Bush, tentando provar na ONU que Saddam Hussein fabricava e detinha um arsenal de armas químicas, proibidas pelo direito internacional. Com um pequeno frasco na mão, Powell defendeu uma aliança internacional para destituir o presidente Saddam Hussein, um dos governantes que a administração Bush apontava como o “eixo do mal”, juntamente com os aiatolás do Irã e Bachar El Assad, da Síria. A invasão do Iraque foi preparada e instrumentalizada pela coalizão americano-britânica, de 2001 até 2003, após a destruição das torres gêmeas.

A cena da ONU e a propaganda americana tentavam legitimar a invasão do Iraque para tomar posse das imensas reservas de petróleo do país, como se vê claramente no filme “Sinfonia de um homem comum”, documentário de José Joffily – exibido no 26° Festival do Cinema Brasileiro em Paris, em abril, organizado sob a batuta competente de Kátia Adler.

O filme conta a história de um homem íntegro. Um resistente que não cedeu a pressões monumentais. No documentário de Joffily, somos apresentados a esse homem extraordinário, que resistiu a todas as investidas americanas para ratificar a “informação” dos EUA sobre armas químicas de Saddam Hussein. Este homem é o diplomata brasileiro José Mauricio Bustani, primeiro diretor-geral da OIAC (Organização para a Proibição de Armas Químicas, afiliada à ONU) que sabia que Saddam Hussein não tinha mais armas químicas. Bustani tentou impedir a destruição do Iraque mas teve que se curvar à pressão dos Estados Unidos, que precisavam de um pretexto para justificar a invasão e a destruição do país. 

Como a Organização para a Proibição de Armas Químicas sob a direção de Bustani não quis entrar no jogo sujo dos americanos, o diplomata brasileiro pagou o preço de sua integridade.

FHC se curvou a Bush

O filme é um deleite para quem se interessa pelos meandros da política internacional que determinam a paz ou a guerra. 

Apaixonado por música, Bustani – ex-embaixador em Londres e em Paris durante o governo do presidente Lula – é visto ao piano em diversas cenas e se mostra um músico experiente ao exigir que o piano mais afinado seja colocado no palco no lugar de outro, quando se apresenta com uma orquestra de jovens.

Em seu depoimento, Fernando Henrique Cardoso revela o caráter submisso de seu governo e a lealdade sem falha ao aliado norte-americano. Ele cedeu a todas as manobras para afastar o diplomata brasileiro do órgão de controle de armas químicas. FHC mostra sua pusilanimidade tentando justificar sua falta de coragem e sua tibieza. Celso Lafer simplesmente conta o contrário do que se passou na realidade.

Extremamente bem documentado com arquivos de imprensa, além de vídeos e depoimentos relevantes, o documentário é importante para historiadores, pesquisadores e para todo cidadão que se interessa pela política internacional e pelo funcionamento dos órgãos multilaterais.

Fernando Henrique Cardoso, Celso Lafer, Bush, Colin Powell, colaboradores e capachos de Bush, como Tony Blair, vão para o lixo da História. José Maurício Bustani entra na galeria de grandes homens públicos de quem o Brasil pode se orgulhar.

O documentário “Sinfonia de um homem comum” obteve uma Menção Honrosa do Jury no Festival Millenium de Bruxelas, que homenageava Oliver Stone e participou de mais dois Festivais Internacionais, em Amsterdã e no Canadá.


*Jornalista internacional. Co-autora, com Clarisse Meireles, de Um homem torturado – nos passos de frei Tito de Alencar (Editora Civilização Brasileira, 2014). Em 2016, pela mesma editora, lançou A tortura como arma de guerra – Da Argélia ao Brasil: Como os militares franceses exportaram os esquadrões da morte e o terrorismo de Estado. Ambos foram finalistas do Prêmio Jabuti. O segundo foi também finalista do Prêmio Biblioteca Nacional.

Imagem de divulgação.

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