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Opinião

O padre que nunca existiu

O padre que nunca existiu

Artigo por RED
14/05/2023 14:00 • Atualizado em 16/05/2023 10:48
O padre que nunca existiu

De SOLON SALDANHA*

Fake news não são apenas aquelas produzidas para difusão através das redes sociais. Apesar de essas serem a potencialização da mentira, com alcance antes sequer imaginado, ainda se engendram algumas fora destes meios, que resultam também na certeza de uma verdade que nunca existiu. E podem até virar folclore, circunstancialmente, como a de uma história ocorrida na Irlanda, no ano de 2004.

Surgiu uma placa colocada no parapeito de uma das pontes existentes na mais importante cidade daquele país, que é Dublin. Pontes, apenas as existentes sobre o Rio Liffey, conectando os lados sul e norte da capital, são 23. Nela estão dizeres exaltando a figura de um padre que teria morrido na busca pela independência da Irlanda. Seu óbito fora em circunstâncias bem suspeitas, em 1919. A partir de então, o local passou a ganhar atenção de muitas pessoas, que traziam flores para prestar as suas homenagens ao religioso.

Muita gente, entre aquelas que têm maior volume de informação, cultura e interesse por história, passou a ter suspeitas sobre esse fato. Porque ninguém lembrava da figura e nem livros registravam sua presença. Ao final, foi descoberto que o tal padre na verdade nunca existira. Fora uma brincadeira feita por dois irmãos, que mandaram confeccionar a placa e a instalaram pessoalmente.

O nome atribuído ao padre fictício, Pat Noise, foi resultado do uso de uma expressão em latim, pater noster, que significa “nosso pai”. E a fotografia usada era a do próprio pai deles. Quanto à assinatura dos que a colocaram, se trata de um anagrama: HSTI. Seria a alteração de letras da palavra inglesa shit (merda). Basta trazer a segunda letra para a frente e a quarta para a terceira posição e está pronto. Após tomarem conhecimento da realidade, as autoridades locais optaram por não retirar a placa, entendendo que se tratava de uma piada e que isso já estava incorporado ao “patrimônio” imaterial da cidade.

Dublin tem cerca 1,5 milhão de habitantes na sua área metropolitana, sendo uma cidade muito alegre e vibrante, que recebe muito bem os visitantes, de modo diverso ao que fazem os ingleses. Os dubliners são simpáticos e adoram uma diversão. Que o digam quem teve oportunidade de participar de um festival que se realiza todos os anos, em 17 de março. Falo do Lá Fhéile Pádraig, nome oficial no idioma irlandês, que passou a ser conhecido mundialmente também pelo nome em inglês de Saint Patrick’s Day – hoje em dia essa festa acontece até mesmo em Porto Alegre. Tenho certeza que eles preferem o primeiro, uma vez que se tornaram independentes da Grã-Bretanha através da Guerra Anglo-Irlandesa, travada entre 1919 e 1921.

A Irlanda é um país católico, ao contrário da Irlanda no Norte, que segue integrando o Reino Unido com Inglaterra, Escócia e País de Gales, todos protestantes. São Patrício havia sido bispo e se tornou o santo principal entre os cristãos irlandeses, sendo o padroeiro do país. O uso da cor verde como símbolo na festa se deve ao fato de que Patrício, enquanto bispo, usava um trevo de três folhas para explicar aos celtas pagãos a Santíssima Trindade. Hoje o que não tem explicação é a excelente qualidade da cerveja que eles produzem e o volume que dela bebem neste evento.


Como bônus do autor temos hoje uma música irlandesa dançante, que integra seu folclore – não foi possível levantar o seu nome. Depois veremos a gravação de uma sapateadora irlandesa se apresentando em uma rua da cidade de Galway. O interessante é apreciar uma criança próxima tentando o tempo todo acompanhar, fazendo os movimentos ao seu modo.


*Jornalista e blogueiro. Apresentador do programa Espaço Plural – Debates e Entrevistas, da RED.

Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades.

As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.

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