?>

Opinião

O equívoco dos Cursos de Pedagogia

O equívoco dos Cursos de Pedagogia

Artigo por RED
01/08/2023 17:00 • Atualizado em 03/08/2023 08:44
O equívoco dos Cursos de Pedagogia

De ESTHER PILLAR GROSSI*

Participei, ontem pela manhã, da banca de qualificação de um projeto de mestrado na Universidade Federal Rural do Semi Árido, em Mossoró, no Rio Grande do Norte.

Agradeço à UFERSA essa oportunidade. Ela me propiciou dar-me conta da contradição que encerram os inumeráveis Cursos de Pedagogia espalhados por nosso país. Os Cursos são de Pedagogia, mas credenciam seus egressos para serem professores. Isto é, serem profissionais de Didática.

Mas eles só podem ser profissionais de Pedagogia, isto é, da disciplina que se ocupa da educação primordialmente de crianças e do sentido do ensino, não diretamente de como se aprende. Essa definição de Pedagogia se encontra no credenciado dicionário francês, Robert. O Aurélio diz que Pedagogia é o conjunto dos ideais da educação, segundo uma concepção de vida e dos meios para efetivar esses ideais.

Enquanto isso, Didática é a ciência que tem que ver diretamente com a aprendizagem de campos conceituais. Segundo Hans Aebli, credenciado por Piaget, Didática é a ciência que se ocupa de fazer passar a quem não tem um conhecimento a tê-lo.

Nataly, a mestranda que qualificava seu projeto de dissertação se referia à pergunta que ela se fazia quando cursava Pedagogia: por quê tanta sociologia, tanta psicologia clínica, por quê tanta antropologia e tanta filosofia? Seu questionamento fazia pleno sentido. Quando alguém termina o Curso tem a responsabilidade e a prerrogativa de alfabetizar, de ensinar Matemática, Português, Historia, Geografia, Ciências até o 5º ano do Ensino fundamental, sem ter estudado, como é necessário, a Didática dessas disciplinas no Curso de Pedagogia. A mensagem que essa aberração da estrutura do nosso sistema de ensino propaga é que para ensinar não é preciso estudo, formação ou preparo. É só pegar os livros escolares e ir seguindo-os passo a passo. E ainda ser chamado carinhosamente de tia ou de tio. Assim, os professores são apenas motoristas da memória. Se os alunos se lembrarem do que foi lido alguns dias antes das avaliações regulares ao longo do ano letivo, pensa-se que se ensinou. Só que a memória é curta. Em pouco tempo ela se esvai.

Aprender de verdade é para toda a vida. O cérebro registra sólida e perenemente. Mas o cérebro só registra conjunto estruturado de conhecimentos que correspondem a uma nova competência. Por exemplo, o cérebro só registra o resultado de uma longa caminhada rumo à escrita e à leitura, quando o alfabetizando é capaz de ler um texto com compreensão e é capaz de escrever um texto que se possa também compreender. Daí ninguém retorna. É conquista de uma competência para sempre. Salve! Viva! Essa pessoa nasceu de novo. Nasceu para se sentir integrado no universo dos que falam duplamente , daqueles que conseguem se comunicar com essa coisa mágica que só com 26 letras consegue encher as bibliotecas e as livrarias da joia que é a literatura ou que são as ciências.


*Educadora, Doutora em Psicologia da Inteligência na Universidade Sorbonne e coordenadora de pesquisa do GEEMPA – Grupo de Estudos Sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação. Também foi deputada federal e secretária de Educação de Porto Alegre.

Imagem em Pixabay.

Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com. Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

Toque novamente para sair.