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O Entendimento Urgente que nos Interpela

O Entendimento Urgente que nos Interpela

Politica por RED
02/09/2024 12:02 • Atualizado em 04/09/2024 13:44
O Entendimento Urgente que nos Interpela

Por SANDRA BITENCOURT*

Nesta semana que passou, em meio a notícias de um excêntrico e mal-intencionado milionário desafiando a justiça brasileira e de um charlatão já condenado sobressaindo pela via da idiotia na eleição da maior cidade da América Latina, são acontecimentos positivos que me inspiram a pensar esta quadra do mundo que nos coube e as arenas de pensamento que nos restam.

O Observatório da Comunicação Pública (da qual sou conselheira) completou nove anos prestando um serviço fundamental neste cenário de crise democrática e de caos informacional. Com investimentos do CNPQ, o Obcomp, um farol localizado na UFRGS, com estrutura organizacional coordenada de modo voluntário por professores de graduação e pós-graduação, e pesquisadores de diferentes instituições, para observar criticamente e abrigar a produção científica sobre comunicação pública, transformou-se em espaço único na produção de reflexões e práticas sobre comunicação pública e política, nas palavras de sua idealizadora e coordenadora, professora Maria Helena Weber. Não é pouca coisa quase uma década compartilhando saber acumulado sobre comunicação, um campo que hoje define disputas e pode, para o bem ou para o mal, ser determinante para a qualidade democrática.

Enquanto assoprava as velinhas do Obcomp, esse mesmo valente grupo, o Nucop (Núcleo de Pesquisa em Comunicação Pública e Política- PPGGCOM-UFRGS) comemorava também o lançamento da segunda edição do livro Pactos e disputas político-comunicacionais sobre a presidenta Dilma, também com organização da professora Maria Helena Weber e que reúne em cinco capítulos 30 artigos com valiosas e diversas abordagens, porque nas palavras dela “não podemos esquecer a trajetória e o impacto de Dilma Rousseff na política brasileira”. Nesse livro, sou autora, junto com a professora Fiorenza Carnielli, do artigo Dilma em três tempos frente ao aborto: direitos reprodutivos, influência religiosa e temas morais no debate público. Ao reler esse texto, especialmente a parte teórica, imediatamente vinculei a uma experiência que estou tendo a oportunidade histórica de participar.

Diz, num dos trechos do artigo: “Nos ensina Foucault (1996) que as práticas de fala pública e os discursos que as atravessam se constituem como uma combinação do que é visível e do que é enunciável em cada estrato histórico. As formações discursivas, são, portanto, as lentes por meio das quais em cada tempo e lugar as pessoas percebem todas as coisas ao seu redor. Esses quadros históricos que norteiam a percepção sobre o que falar, pensar e fazer permitem posições de modo singular. Podemos, então, observar como um tema sensível é apropriado, usado estrategicamente, silenciado ou reinterpretado em momentos diferentes, não raro pelos mesmos personagens”. (…) Para Habermas (1997), os discursos não dominam por si mesmos, mas têm potencial libertador, já que é a sua força comunicativa que influencia e permite certos tipos de legitimação. Esse poder da comunicação não pode ser suplantado por ações instrumentais.

Essa reflexão, tomando emprestadas visões de Foucalut e Habermas, se presta para compreender a ousada costura política e a delicada comunicação pública contidas no Movimento Cívico Carta Pró- RS. A partir de uma longa e ampla construção do Instituto Novos Paradigmas (do qual sou diretora executiva), mas que se transformou num plural movimento cívico, a iniciativa propõe ao Presidente Lula a criação de uma Agência Interinstitucional de Recuperação e Desenvolvimento no RS. A ideia é que essa estrutura coordene as ações desenvolvidas pela União, em articulação com o Estado, municípios e setor privado, para execução de um plano estratégico de recuperação do desastre climático e de implementação de ações de desenvolvimento do RS, nos médio e longo prazos. A proposta conseguiu um entendimento tão difícil quanto amplo. Do campo político reúne cinco ex-governadores (Tarso Genro, Olívio Dutra, Antônio Britto, Germano Rigotto e José Ivo Sartori) e três vices (João Gilberto, Beto Grill e Vicente Bogo). No entanto, a iniciativa não se caracteriza como um movimento partidário. Pelo contrário, busca reunir lideranças sociais, intelectuais, acadêmicas, jurídicas e empresariais. Aliás no meio empresarial, tem o empenho pessoal de uma de suas personalidades mais importantes do Estado e do País, Jorge Gerdau.

A ideia de que a despeito das desinformações que correm pelos subterrâneos, das crenças e vaidades nem sempre publicizadas, dos preconceitos e ranços que possam vicejar em determinados ambientes, investimos no que pode ser enunciado, no que conquista convergência, no que sinaliza espírito público e interesse coletivo. E são muitos os contribuintes para essa lógica. É o discurso, a voz pública ponderada e responsável, o entendimento às claras, que permite legitimação. Isso, em tempos ásperos, de mãos crispadas e elogio aos insultos nas interações digitais, é uma ousadia e tanto. Uma novidade e uma esperança que pode resultar em outro futuro para o nosso RS, em outros paradigmas de crescimento ambientalmente equilibrado, socialmente justo e tecnologicamente inovador para o país todo. Então viva a boa comunicação e as pessoas de boa vontade, seja para observar, construir conhecimento, registrar memória ou escrever uma nova e avançada etapa da nossa história.

*Sandra Bitencourt é Doutora em Comunicação e Informação, Jornalista, Pesquisadora e Professora Universitária.

Foto da capa: Redes Sociais.

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