Opinião
O Brasil que me apavora
O Brasil que me apavora
De EDELBERTO BEHS*
O meu país tem cores. Sim, verde e amarelo são as cores predominantes. Estão registradas na bandeira. O verde simboliza as matas, o amarelo as riquezas minerais. Mas queimadas exterminam a floresta e o Pantanal. Garimpo invade terras indígenas. Mas isso não importa aos extremistas que andam para lá e para cá carregando a bandeira pedindo golpe, atentando contra o Estado de direito. A bandeira proclama “Ordem e Progresso” e, com ela em riste, promovem a desordem bloqueando rodovias ou se postando em frente a quartéis.
O mundo assiste cenas ridículas, que envergonham qualquer pessoa com um mínimo de civilidade, como a do manifestante que se dependurou na cabine de um caminhão dirigido por motorista que furou o bloqueio e assim percorreu quilômetros. Bolsonaristas inconformados, de extrema-direita, pedem, como dizia uma faixa “intervensão (sic) federal”. Assistindo tais manifestações fico com a impressão de que o capeta abriu as portas do inferno e soltou diabinhos Brasil afora.
Como entender a agressão de um militar policial aposentado, de 55 anos, contra um menino, atenção, um me-ni-no de 7 anos de idade, o Gabriel Azevedo, em Divinópolis, Minas Gerais, porque, perguntado se era bolsonarista, respondeu “Lula-lá”.
Ou de atirador, que matou o jovem Pedro Henrique Dias Soares, 28 anos, e feriu sua mãe e prima, além da adolescente Luana Rafaela Oliveira Barcelos, de 12 anos, que veio a falecer dias depois, em Belo Horizonte! Ele portava, no domingo, depois da divulgação do resultado da eleição, duas pistolas, 15 munições e dois carregadores! Ele era um CAC, um “colecionador autorizado”, possibilidade aberta pelo presidente Jair Messias Bolsonaro para que “pessoas de bem” pudessem defender a família.
Ah, mas esses agressores são desclassificados! – poderia alguém argumentar. O que dizer, então, do médico Igor José Saraiva, de Nova Andradina, dizendo que não atenderia petista, que, se em risco de vida, deixaria morrer. Viralizou e ele disse, então, que se tratava de brincadeira. Ou dos inconformados que invadiram um ônibus escolar em Jundiaí e agrediram secundaristas porque fizeram o “L” de Lula!
Como qualificar a atitude da professora bolsonarista Sheylla Susan, da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), que cancelou a orientação de doutorandos por serem “esquerdistas”. Uma educadora! Arrependida, disse que “no calor das eleições acabei me excedendo nas palavras onde disse para dois alunos que procurassem outro orientador”. Que fofa! Ou do “ídolo” das pistas, Nelson Piquet, para quem o lugar apropriado para Lula é o cemitério. Ou do vídeo produzido por alunos do Colégio Israelita, de Porto Alegre, zoando de pessoas pobres!
E as centenas de pessoas que bloqueavam a SC-163, em São Miguel do Oeste, Santa Catarina, ergueram a mão, numa típica saudação nazista, durante entonação do hino nacional. O Ministério Público apurou o fato, mas concluiu, em apuração preliminar, que os manifestantes não tiveram intenção de fazer apologia ao nazismo, mas, com o gesto, buscavam “emanar energias positivas”, segundo o empresário que comandava a manifestação. Quanta fofura!
Quantas “pessoas de bem”, da tradicional família cristã, branca, da raça superior defendem a violência, seja armada, seja falada, e expõem toda a ignorância de quem não sabe argumentar civilizadamente para defender seus pontos de vista. “Nossa bandeira nunca será vermelha”, gritam manifestantes. Mas o vermelho de sangue começa a tingir o verde e o amarelo. Esse é o Brasil que o presidente Jair Bolsonaro deixa como herança do seu governo autoritário, fascista, genocida.
Quem esperava que após o período eleitoral finalmente o país entraria num mar de calmaria se frustrou porque os defensores do golpe atacam a democracia, as leis. Com a conivência de autoridades, como a Polícia Rodoviária Federal, tão zelosa em vistoriar ônibus que transportavam eleitores no Nordeste, no domingo, 30 de outubro, mas não foi capaz sequer de pedir a documentação de caminhoneiros que pararam rodovias para descobrir a quem pertence o veículo e aplicar, no mínimo, a devida multa por obstrução de rodovia.
As manifestações antidemocráticas trazem à luz do dia esse bando de criminosos – sim, quem atenta contra o Estado de direito comete crime – que não consegue conviver com as diferenças. Não é esse Brasil que quero para meus filhos e netas. Mas extremistas atiçados por autoridades parecem não se importar com o legado que deixarão às gerações futuras.
*Professor, teólogo e jornalista.
Imagens – reprodução.
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