Curtas
Juízas e juízes são promovidos à titularidade no TRF4
Juízas e juízes são promovidos à titularidade no TRF4
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) realizou na tarde desta terça-feira, 02, a solenidade de posse de nove juízas federais substitutas e quatro juízes federais substitutos que foram promovidos aos cargos titulares de juízas e juízes federais.
O evento aconteceu no Plenário da corte, em Porto Alegre, com a presença de autoridades e membros da Justiça Federal da 4ª Região, além de convidados dos empossados. A cerimônia também foi transmitida online pela plataforma Zoom.
A juíza Ana Inês Algorta Latorre, a magistrada mais antiga entre os promovidos, falou em nome do grupo, destacando os desafios da carreira em tempos tecnológicos bem diferentes do início da sua trajetória. (Confira o discurso na íntegra no final desta matéria).
Além disso, Latorre lembrou em seu discurso o papel social fundamental do Poder Judiciário na defesa, manutenção e exercício da Democracia em nosso país:
“O Poder Judiciário segue sendo, por atribuição constitucional, o Poder da República que tem a função de dirimir os conflitos e garantir a paz social. Além disso, como pude experienciar na jurisdição cível e previdenciária, bem como trabalhando na conciliação, muitas vezes somos quem tem a condição de alcançar os direitos econômicos, sociais, culturais e ecológicos quando são negados aos mais vulneráveis. O trabalho do juiz é essencial à ordem democrática e à promoção de uma sociedade de paz. A democracia é um valor em si, reconhecido constitucionalmente, em razão do qual podemos ter a liberdade de ser quem somos e nos expressar como tal e podemos também integrar o corpo decisório dos rumos da nossa sociedade. Aliás, é função do Poder Judiciário garantir que o sistema decisório esteja íntegro e seja respeitado, como recentemente aconteceu”, frisou a Juíza.
Os novos juízes e juízas titulares da Justiça Federal da 4ª Região
Pelo critério de antiguidade, foram promovidos os seguintes juízes e juízas federais à titularidade, que vão para as seguintes varas federais:
1 – Ana Inès Algorta Latorre, 2ª Vara Federal de Carazinho (RS);
2 – Daniela Cristina de Oliveira Pertile Victória, 2ª Vara Federal de Erechim (RS);
3 – Leonardo Cacau Santos La Bradbury, 1ª Vara Federal de São Miguel d’Oeste (SC);
4 – Diego Viegas Véras, 4ª Vara Federal de Cascavel (PR);
5 – Dienyfer Brum de Moraes, 2ª Vara Federal de Santo Ângelo (RS);
6 – Joel Luís Borsuk, 1ª Vara Federal de Cruz Alta (RS);
7 – Andrea Momolli, 1ª Vara Federal de Santana do Livramento (RS).
Pelo critério de merecimento, foram promovidos os seguintes juízes e juízas federais à titularidade, que vão para as seguintes varas federais:
1 – Clarides Rahmeier, 1ª Vara Federal de Ijuí (RS);
2 – Marta Weimer, 1ª Vara Federal de Concórdia (SC);
3 – João Paulo Nery dos Santos Martins, 1ª Vara Federal de Toledo (PR);
4 – Fernanda Bohn, 1ª Vara Federal de Pato Branco (PR);
5 – Gabriele Sant’anna de Oliveira Brum, 1ª Vara Federal de Telêmaco Borba (PR);
6 – Lívia Mesquita Mentz, 1ª Vara Federal de Bagé (RS).
Confira o discurso de Ana Inês Algorta Latorre na íntegra:
Boa tarde a todas e todos. Cumprimento os presentes na pessoa do Exmo Presidente deste Tribunal, Des. Ricardo Teixeira do Valle Pereira. Cumprimento minhas colegas e meus colegas que estão tomando posse comigo, bem como nossos amigos e familiares. Cumprimento as colegas juízas e os colegas juízes, as servidoras e os servidores desta Casa. Este é um momento de alegria e realização para nós que tomamos posse no cargo de juiz federal. E, para mim, é uma honra, na condição de decana desta turma de colegas promovidos, me dirigir a vocês para trazer algumas palavras. Ao mesmo tempo, é um belo desafio, pois falarei em nome de um grupo diverso, procurando representar a todas e todos.
Ao iniciar a minha fala, não posso deixar de agradecer aos meus pais, Ana Cristina e Juan, aqui presentes, por tanto que recebi e recebo deles ao longo desta jornada, ao meu companheiro Sérgio por compartilhar a vida, ao meu lado neste momento e em tantos que vieram e virão, e aos meus filhos, principalmente à Rochele, aqui presente, por significar para mim a esperança e a continuidade.
Ao preparar este momento, lembranças de quase vinte e cinco anos de magistratura, desde minha posse como juíza federal substituta, ao final do século passado, vieram à minha mente. Muita coisa mudou desde então. Àquela época tínhamos os processos de papel, mal se falava em informatização do judiciário, e, na minha primeira lotação, ainda não havia acesso à Internet. Não se fazia conciliação na Justiça Federal, e sequer tínhamos ouvido falar em Justiça Restaurativa. Ainda estávamos em processo de interiorização. A AGU era uma carreira bastante nova, os procuradores federais ainda eram autárquicos, a DPU ainda não havia sido instalada, não existia o CNJ. Também não havia redes sociais.
De lá para cá, foram muitas mudanças na forma de ver e de prestar a jurisdição. E também mudanças de etapa de vida, que permitiram a mim, e a cada um de nós, cada um com sua trajetória, com mais ou menos tempo de magistratura, aceitar a promoção ao cargo de juiz federal e passar a viver mais uma etapa na nossa carreira. Carreira esta que demanda responsabilidade, capacidade de trabalho, coragem e inventividade, além de visão humana e sensibilidade.
No meu caso, tendo ingressado bastante jovem, fiz a escolha de permanecer em Porto Alegre onde estava a rede de apoio para mim e meus filhos. Tinha uma experiência de um primeiro ano de magistratura em uma cidade do interior, com a dificuldade de chegar em um lugar novo, sem conhecer as pessoas, estranhando as diferenças de cultura e sentindo falta do anonimato que Porto Alegre proporcionava. De uns anos para cá, estudos sobre a condição da mulher na magistratura visibilizaram que essa escolha de não avançar na carreira tão logo quanto possível, devido ao ônus pessoal e familiar que significa a mudança para o interior, não foi apenas minha, e sim de muitas outras mulheres juízas, e se devem a uma questão bastante estrutural de nossa sociedade. Atualmente, na maturidade, minha condição para dar este passo é muito diferente.
Assim como as demais colegas e os demais colegas que ora tomam posse, venho construindo uma carreira na qual já trago na bagagem realizações, desafios vencidos, muitas alegrias e um tanto de dores. E assim é a vida, em toda a riqueza das experiências que se nos oferecem. Não traçamos um caminho linear, e sim, com nosso andar, construímos cada uma, cada um, uma trajetória singular.
Por outro lado, o mundo capitalista vive uma crise sem precedentes, e mudanças drásticas no clima, na economia, na geopolítica mundial e na cultura se sucedem em alta velocidade. Os riscos se acentuam, e o aquecimento global e suas catástrofes, o colapso econômico, as convulsões sociais e as guerras, os fascismos, os fundamentalismos, os discursos de ódio, as fake News, e outras formas de manipulação de massa, as expulsões e exclusões ameaçam os projetos de vida de países, povos, grupos e pessoas.
Neste contexto, o exercício do nosso trabalho se torna desafiador, e nos deparamos com questões que não surgiam antes. Se por um lado a tecnologia nos possibilita eficiência e celeridade, por outro recebemos outro patamar de exigência e estamos sujeitos a um controle muito mais rigoroso. A carreira também vive uma crise remuneratória e até de reconhecimento. Há poucos dias, a Dra. Marga Tessler marcou seu discurso de aposentadoria pela inconformidade com a pouca valorização à magistratura. No final de semana que passou, o concurso para a AGU teve cerca de cem colegas juízes federais inscritos, invertendo o fenômeno que se dava no passado, quando os advogados públicos costumavam se apresentar nos concursos para juiz. Uma das colegas que postulava esta promoção conosco deixou a carreira para assumir um cargo de cartorária, que, como sabemos, tem uma remuneração muito superior à nossa. São fatos que nos convocam à reflexão e, com certeza, a agir no sentido de reverter essa situação. Temos muito trabalho pela frente.
O Poder Judiciário segue sendo, por atribuição constitucional, o Poder da República que tem a função de dirimir os conflitos e garantir a paz social. Além disso, como pude experienciar na jurisdição cível e previdenciária, bem como trabalhando na conciliação, muitas vezes somos quem tem a condição de alcançar os direitos econômicos, sociais, culturais e ecológicos quando são negados aos mais vulneráveis. O trabalho do juiz é essencial à ordem democrática e à promoção de uma sociedade de paz. A democracia é um valor em si, reconhecido constitucionalmente, em razão do qual podemos ter a liberdade de ser quem somos e nos expressar como tal e podemos também integrar o corpo decisório dos rumos da nossa sociedade. Aliás, é função do Poder Judiciário garantir que o sistema decisório esteja íntegro e seja respeitado, como recentemente aconteceu. E, evidentemente, o julgador, num sistema heterocompositivo, sempre irá desagradar ao menos uma das partes. É a natureza do Poder Judiciário, pois sabemos que nem sempre as conciliações são possíveis, embora sempre desejáveis.
Em uma democracia, o Poder Judiciário não pode sofrer ameaças de quem quer que seja em razão do conteúdo de suas decisões. Não se pode admitir, seja qual for a instância do Poder Judiciário, que haja o ataque com ameaças pessoais aos julgadores e com ameaças à existência da própria instituição judicial. E menos ainda se pode admitir que este tipo de ataque advenha de autoridades de outros poderes do sistema federativo. Também não se pode admitir que o poder midiático se atribua o direito de determinar o conteúdo dos julgamentos, ou que o Poder Judiciário seja instrumentalizado para favorecer interesses ou perseguir inimigos políticos de quem quer que seja.
No exercício de nosso trabalho diário, precisamos reafirmar nosso compromisso com os direitos humanos, o que nos exige um especial cuidado sempre que seus titulares estejam em situação de vulnerabilidade. Via de consequência, é muito importante que possamos trabalhar pela ampliação do acesso à Justiça. A diminuição da desigualdade é fundamental na construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Também precisamos reafirmar nosso compromisso com o combate ao racismo, bem como a toda e qualquer discriminação baseada em preconceitos de classe, orientação sexual, identidade de gênero, origem, padrão corporal e de funcionalidade física ou mental e todo e qualquer outro preconceito.
É importante que reconheçamos a herança colonial do Brasil, para assim compreender a origem e a finalidade dos movimentos sociais, podendo constatar que as lutas dos menos favorecidos se destinam ao reconhecimento de seus direitos, e muitas vezes causam a perda de privilégios. Compreendendo este jogo de forças que existe em nossa sociedade, percebe-se o equívoco no discurso de criminalização dos movimentos sociais.
Ainda, é nosso mister estar atentas e atentos para que não aconteça em nossos ambientes de trabalho qualquer tipo de assédio, tanto com relação aos integrantes de nossas equipes de trabalho quanto com relação ao nosso público. Nenhum tipo de violência baseada em relações de poder assimétricas pode ser tolerada. Precisamos construir ambientes de trabalho os mais sadios possíveis, em que haja respeito, diversidade e cooperação.
Por fim, é importante lembrar que nosso trabalho não é apenas nosso, e sim uma construção institucional e coletiva. Que possamos sempre valorizar aqueles que nos cercam e, principalmente, que nos auxiliam nas nossas tarefas diárias, das mais simples às mais complexas.
Com tantas complexidades e desafios, sem dúvida temos à nossa frente tempos de grande crescimento e aprendizado. Que possamos ter a sabedoria e a força necessária para atender às nossas responsabilidades e realizar os sonhos que nos levaram a fazer este movimento em nossas vidas. Que possamos contribuir com nossa bagagem e nosso esforço para a manutenção da ordem democrática e para a construção diária de uma melhor Justiça Federal e de uma sociedade melhor e mais fraterna, onde estivermos.
Muito obrigada.
Imagem: divulgação no site do TRF4.
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