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Guerra no Oriente Médio elimina qualquer traço de humanidade

Guerra no Oriente Médio elimina qualquer traço de humanidade

Artigo por RED
07/10/2024 19:00 • Atualizado em 07/10/2024 12:40
Guerra no Oriente Médio elimina qualquer traço de humanidade

Por EDELBERTO BEHS*

O calendário indica nesses dias um ano da guerra em Gaza. Os tais acordos de paz, tão propalados, não passaram de minutas em papel. Ao contrário, nesse período, o conflito só se alastrou, as bombas se estendendo para o Líbano, o que provocou a reação do Irã. Depois da II Guerra Mundial, o mundo desenhava a utopia de guerra nunca mais.

O “resultado” em Gaza é assustador. Segundo a Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA), 11 mil crianças morreram no conflito. O número pode ser maior, porque muitas vítimas estão soterradas em escombros. Cerca de 1,9 milhão de pessoas teve que se deslocar e 41 mil foram mortas! O Centro de Satélites da ONU (Unosat) levantou, em análise de imagens, que 66% das estruturas na Faixa de Gaza sofreram danos.

O comissário-geral da UNRWA, Philippe Lazzarini, definiu a situação em Gaza como um pesadelo sem fim, um lugar inabitável. Montanhas de lixo se acumulam nas áreas centrais de Gaza, o esgoto vaza para as ruas, o que representa a ameaça de um desastre de saúde iminente.

Desde o início do conflito, repórteres internacionais reclamam que não têm autorização para entrar em Gaza, “exceto para viagens raras e escoltadas, organizadas pelo exército israelense”, impedidos, assim, de realizarem o seu trabalho: reportar.

Setenta e uma organizações de comunicação e veículos da imprensa internacional endossaram carta elaborada pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas, dos Estados Unidos, solicitando que “Israel cumpra seus compromissos com a liberdade de imprensa, fornecendo à mídia estrangeira acesso imediato e independente em Gaza”.

Por que Israel proíbe a circulação da imprensa estrangeira em Gaza? O que é preciso esconder? Relatos de representantes de organizações que atuam na região são estarrecedores. Em entrevista à revista +972 e à Local Call, seis soldados, cinco sob anonimato, contaram, após serem dispensados do serviço ativo, o que viram em Gaza.

Viram uma paisagem de cadáveres de civis, deixados assim como morreram para apodrecerem. O exército se limita a escondê-los antes da chegada de comboios de ajuda internacional, para que “não apareçam imagens de pessoas em estado avançado de decomposição”, relatou um dos soldados.

“Há um cheiro horrível de morte”, disse outro entrevistado. Um terceiro soldado contou que civis se dirigiam para as áreas por onde passavam os comboios de ajuda humanitária para procurar restos que pudessem cair dos caminhões. “No entanto, a política era de atirar em qualquer um que tentasse entrar” nesses corredores.

São relatos que confirmam o que testemunhas que trabalham no local, como médicos sem fronteiras, médicos palestinos, religiosos, ativistas dos direitos humanos e representantes das Nações Unidas mostram ao mundo. Como é difícil distinguir os civis dos combatentes em Gaza, revelou um soldado entrevistado pela +972, “todo homem entre 16 e 50 anos é suspeito de ser um terrorista”.

O consultor de saúde Dr. Bassam Abu Hamad, ao participar de uma conversa virtual promovida pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI), informou que algo em torno de 70% das unidades de saúde em Gaza foram destruídas e que 400 mil pessoas com doenças crônicas ficaram sem tratamento. “A guerra não tem regras. Não há respeito pelos direitos humanos, e a matança é indiscriminada”, disse.

Onde fica a humanidade dos que se reportam às contribuições éticas, morais, espirituais, do arcabouço judaico-cristão que dá suporte à sociedade ocidental? Qualquer crítica ao governo de Israel é apontada como atividade antissemita ou de defesa dos terroristas do Hamas. A defesa de dignas condições humanas está acima de qualquer Gre-Nal a favor deste ou contra aquele. O que está em jogo são VIDAS!

Dá para acusar profetas do Antigo Testamento, que questionaram o comportamento do povo hebreu e de suas lideranças como uma atividade antissemita, embora essa ameaça não existisse na época? Não foi Daniel que ouviu a palavra do Senhor queixando-se da teimosia do povo? O rei Saul não foi questionado? O profeta Natã não se apresentou de dedo em riste diante de Davi? Profeta algum atinge Netanyahu!

Ora, quantos já imploraram pela paz em Gaza? Quantos apelos são necessários ainda para que as Forças Armadas Israelense (IDF) cessem sua ceifa de matanças e que o Irã desista das bombas? Quantos apelos o Papa Francisco terá que apresentar, ou quantas orações terá que proferir, para que seja atendido um cessar-fogo em Gaza?

Quantos apelos o Conselho Mundial de Igrejas precisará emitir para que o povo palestino consiga retomar a normalidade (numa terra arrasada!)? Quantos judeus ainda terão que levantar a voz contra essa política destruidora? Quantos quilômetros manifestantes vão ter que percorrer em ruas mundo afora para exigir a paz? Quantos traumas, em ambos os lados, essa guerra entre primos já não provocou e como será o futuro das crianças que estão sem lar?

 

A conta é sem fim

O fundamentalismo está presente nos dois lados. Teofacistas, reunidos no Partido Religioso Sionista e apoiadores de Netanyahu, encaram a guerra em Gaza como o prelúdio para o domínio total sobre a terra bíblica de Israel, que se estende do Rio Jordão ao Mediterrâneo. O Hamas define, na sua carta de fundação, em 1988, a terra da Palestina como um legado inalienável de acordo com a lei islâmica, uma habiz islâmica, como explica Shlomo Bem-Ami, doutor em História pela Universidade de Oxford, em matéria para a revista Nueva Sociedad.

É a religião sendo usada, mais uma vez entre tantas na História, para justificar a guerra, a matança, o extermínio. Enquanto persistirem tais fundamentalismos, a loucura no Oriente Médio não terá descanso.

Como disse em artigo para Domani o professor italiano de Relações Internacionais na Universidade para Estrangeiros de Perugia, Mario Giro:

– As lágrimas das mães, em Israel e Gaza, clamam por paz, mas o cinismo da política não as ouve.

*Edelberto Behs é Jornalista, Coordenador do Curso de Jornalismo da Unisinos durante o período de 2003 a 2020. Foi editor assistente de Geral no Diário do Sul, de Porto Alegre, assessor de imprensa da IECLB, assessor de imprensa do Consulado Geral da República Federal da Alemanha, em Porto Alegre, e editor do serviço em português da Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação (ALC).

Foto:Reuters

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