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Opinião

Desmascarando a desinformação na Folha de São Paulo sobre economia

Desmascarando a desinformação na Folha de São Paulo sobre economia

Artigo por RED
11/12/2023 05:30 • Atualizado em 13/12/2023 09:09
Desmascarando a desinformação na Folha de São Paulo sobre economia

De PEDRO PAULO ZAHLUTH BASTOS*

Alguém sabe dizer se o jornalista Vinicius Torres Freire (Folha) é megalomaníaco? Ele é jornalista profissional com graduação em sociologia e mestrado (lato ou stricto sensu?) em administração, mas ontem resolveu chamar de “tosco-mágico” o campo de pesquisas teóricas e empíricas em economia que refutam o que ele vem repetindo há anos sobre déficit público e juros sem se preocupar em checar. O nível da arrogância (sem base científica) do VTF é chocante, e normalmente deveria ser esquecido, mas temos que perder tempo com isso porque alguém está sendo desinformado. Cansei de desinformação. O campo estigmatizado como “tosco-mágico” pelo jornalista envolve hoje Nobels como Paul Krugman e (às vezes) economistas como o Blanchard, para não citar heterodoxos que já demonstram isso há muito mais tempo.

O argumento de VTF é que mais déficit público primário gera elevação de juros da dívida pública. Ele vem “prevendo” isso desde que o presidente Lula sugeriu a PEC da transição de novembro de 2022, que permitiu que o gasto federal aumentasse 9% esse ano, bem acima do PIB. Não se preocupou em checar se estava certo, mas voltou a repetir isso ontem.

O terrorismo bem tosco dos lobistas do mercado financeiro que o VTF repete é o seguinte: se o déficit público aumentar, isso vai elevar a taxa de juros cobrada do governo enquanto o governo absorve mais poupança privada, o que vai diminuir o consumo e o investimento privados. Com o aumento do déficit público e da taxa de juros, a confiança dos credores vai diminuir, logo a taxa de juros que o governo paga vai crescer ainda mais, assim como o de todo mundo.

O suposto é que o PIB está fixado como a renda de uma casa de família. Dada esta renda (o PIB), o que essa casa chamada Brasil gasta com o governo, o consumo privado e o investimento privado depende do déficit público. Se ele aumenta, o resto diminui. Logo, se o déficit público aumentar, os juros cobrados aumentam, a poupança privada absorvida pelo governo aumenta, diminuindo o consumo e o investimento privado, certo?

Errado. Essa estória da economia doméstica é uma bobagem para quem já passou da época dos manuais simplórios de nível basicão de macroeconomia. Para começo de conversa, o volume de ativos financeiros no mundo é muito maior que o PIB mundial. O mesmo vale no Brasil, em que apenas o estoque da dívida pública bruta em relação ao PIB chega a 74,4%, para não falar do resto. Afora o fluxo de crédito novo, o estoque de “poupança” disponível para investimento financeiro não é um pedaço do fluxo anual do PIB.

A curto prazo, os juros são definidos pelo Banco Central, e o governo não precisa se endividar antes de gastar, pois tem o poder de emitir. E vários estudos mostram o óbvio: o PIB não é dado, e o gasto público estimula sim o crescimento do PIB, embora nem sempre compense inteiramente uma desaceleração do gasto privado se o estímulo não for forte o suficiente dado o tamanho da desaceleração.

VTF não precisa saber teoria econômica, mas poderia pelo menos checar os dados, jornalista econômico que é. Parece que isso é pedir demais para um “sabe-tudo”. Olha o gráfico seguinte. É de um site de consultoria privada de acesso livre (Investing.com).

O que mostra o gráfico? Que, de um ano para cá, quanto VTF fez sua previsão sobre a elevação de juros gerada pela PEC da transição, e hoje, quando VTF repete o argumento sem checar os dados que refutam a sua fantasia teórica, a taxa de juros para títulos públicos caiu!

Aliás, no último mês, quando o terrorismo do mercado financeiro e da imprensa “especializada” aumentou por causa do debate sobre o déficit público zero em 2024, a taxa de juros além dos nove meses voltou a cair. Cadê a relação entre trajetória do déficit público e da dívida pública, de um lado, e os juros, de outro, que a egotrip do VTF diz existir?

Eu não vou explicar agora o que aconteceu com os juros entre seis e nove meses de um mês, mas a explicação também refuta o VTF. Quero ler antes a nova explicação genial do VTF.


*Professor (Economia-Unicamp), presidente da ABPHE (2009-2011) e do DPHE-Unicamp (2008-2012), professor visitante Universidade da California, Berkeley (2017-8).

Publicado originalmente nas redes sociais do autor.

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