Curtas
COP30 no Brasil será marco na diplomacia do clima, mas sucesso depende de participação popular
COP30 no Brasil será marco na diplomacia do clima, mas sucesso depende de participação popular
Especialistas veem oportunidade de cúpula mais democrática, enquanto ativistas amazônidas preparam mobilização para 2025
O Brasil sediará pela primeira vez uma cúpula mundial do clima das Nações Unidas, o evento mais relevante do segmento. De forma inédita e emblemática, a COP30 acontecerá em novembro de 2025 em Belém (PA), uma metrópole no coração da floresta amazônica, seis anos após o governo Bolsonaro se negar a receber o encontro no país.
A COP é um evento anual que reúne dezenas de milhares de autoridades governamentais, cientistas, organizações e ativistas de todo o mundo. A realização em solo brasileiro coloca o país como centro da discussão sobre como salvar o planeta.
Especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato afirmam que a conferência poderá ser um marco histórico para a diplomacia mundial do meio ambiente e tem o potencial de gerar resultados concretos em termos de proteção dos biomas e diminuição das emissões de carbono.
Mas a oportunidade de mudanças reais pode ir por água abaixo se não forem ouvidas as populações indígenas, comunidades tradicionais e moradores pobres das áreas urbanas da Amazônia. Ativistas amazônidas alertam que é preciso incluir os moradores locais nas discussões técnicas e políticas.
Brasil chega fortalecido se fizer a lição de casa
Para Márcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima (OC), o Brasil chega fortalecido se conseguir manter os primeiros resultados positivos na proteção da Amazônia. No bioma, o desmatamento diminuiu 68% em abril de 2023, primeira grande redução no governo Lula, após um início de mandato marcado por números negativos.
“Isso é importantíssimo para a conferência porque o país sede, no caso o Brasil, é quem preside as negociações e os trabalhos. É ele quem pode pressionar os delegados, os presidentes, representantes dos outros países, para serem mais ambiciosos, para colocarem soluções mais concretas em cima da mesa”, avalia Astrini.
O otimismo de Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), reside no fato de que o evento em Belém rompe com a lógica de realização de COPs em países autoritários, “como no caso do Egito e Emirados Árabes”, segundo ele.
Para o presidente do Proam, a participação democrática nas conferências do clima é um elemento fundamental para impulsionar a efetividade dos acordos climáticos. “O Brasil, como um país de uma economia emergente, pode reivindicar mais, e o governo tem mais poderio em termos de decisão”, analisa.
“A realização da COP no coração do maior ecossistema florestal do mundo, que detém a maior biodiversidade, é emblemática não só para o Brasil, mas para o mundo, porque há uma imersão na perspectiva de proteção do ecossistema. É simbólico, visceral e importantíssimo que se tenha esse vínculo local de envolvimento da população e do ecossistema”, aponta Carlos Bocuhy.
A COP tem que ser também para as baixadas
Em fevereiro deste ano, Belém (PA) sediou um encontro climático menor e mais discreto, a chamada COP das Baixadas. Como os encontros da ONU são restritos a convidados, a proposta foi aproximar a discussão ambiental das populações periféricas da Amazônia, que sofrem na pele as piores consequências das mudanças no clima.
Um dos idealizadores da COP das Baixadas e morador da capital do Pará, o ativista Jean Ferreira, aponta que a realização da cúpula em Belém não é garantia de mais participação popular no tema.
“Mesmo no Brasil, os problemas de participação da COP serão os mesmos. Essas conferências muitas vezes se dão no território apenas de forma geográfica, não de forma participativa, às vezes nem mesmo representativa”, critica Ferreira.
Diante do desafio, a coalizão COP das Baixadas, que reúne 20 organizações populares, prepara uma mobilização para marcar o evento em Belém. Os movimentos discutem se atuação se dará no interior da COP30 ou de forma paralela.
“Os políticos normalmente estão mais preocupados em atender os requisitos hoteleiros dos sheiks árabes”, ironiza o ativista. “Então o desafio de fazer a discussão continua o mesmo, mesmo com um governo federal simpático à questão socioambiental.”
Sem participação popular não há justiça climática
Marcio Astrini, do Observatório do Clima, concorda que o Brasil perderá muito se não contemplar a questão social nas tratativas. Sem isso, a reivindicação por mudanças reais na política de emissão dos países ricos perde força. Já está claro, segundo ele, que sem pressão popular não haverá medidas concretas para frear o desastre climático.
“A gente precisa fazer um encontro em que as populações indígenas, as populações tradicionais e os movimentos sociais estejam presentes. Que eles façam pressão, porque tem que ser uma COP marcante, tanto do ponto de vista de negociação, quanto da participação social.”
Jean Ferreira, da COP das Baixadas, diz que a cúpula do clima em Belém pode impulsionar as reivindicações de populações marginalizadas em territórios vulneráveis da Amazônia, rural e urbana. A crise climática, lembra o ativista da Amazônia, afeta a todos, mas de forma extremamente desigual.
“No mundo inteiro estão falando sobre nossos territórios, mas tem gente morando aqui. Estão falando da foz do rio Amazonas, onde tem culturas e economias dependentes daquele lugar. Estão falando sobre carros elétricos para localidades onde as pessoas morrem por questões mais básicas. Por isso é preciso fazer justiça climática”, defende Ferreira.
Matéria do Brasil de Fato
Foto: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil
Toque novamente para sair.