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Opinião

A poderosa retórica de Lula na posse rompe a conciliação do andar de cima

A poderosa retórica de Lula na posse rompe a conciliação do andar de cima

Artigo por RED
08/01/2023 04:00 • Atualizado em 09/01/2023 18:17
A poderosa retórica de Lula na posse rompe a conciliação do andar de cima

De ALEXANDRE CRUZ*

Sempre tive um fascínio pela oratória. Na Espanha, todos os domingos saía num suplemento do jornal El País um livro de cada orador. Na lista havia desde o então presidente da Espanha, Manuel Azaña, ou o líder dos Direitos Civis nos Estados Unidos, Martin Luther King, ou Winston Churchill, De Gaulle e tantos outros.

Muitas vezes me flagro no espelho realizando o exercício da oratória. Em Santo Ângelo, coloquei em prática na Câmara Municipal. Por sinal, a platéia gostou com aplausos e depois muitos cumprimentos no final da plenária.

Além do conteúdo, a linguagem importa. Eleger as palavras importam. O discurso bem realizado, coeso, apelando a paixão é um recurso poderoso para convencer o povo.

Um dos discursos que mais me impactaram  foi o do senador Marco Antônio após a morte do imperador Júlio César. O imperador tinha sido assassinado no Senado pelo Cássio e pelo Brutus. Era um momento tenso da política romana. O Marco Antônio, que não estava envolvido na conspiração, foi escolhido pelos assassinos para realizar o discurso para o povo. Constrangimento criado. A narrativa quase consolidou que o César era um tirano. Mesmo assim, Marco Antônio usou uma das peças da oratória mais brilhantes que conseguiu reverter o sentimento de raiva do povo a Júlio César e deixar mal os líderes que conspiraram contra a morte do imperador.

A fala do Luiz Inácio Lula da Silva no parlatório deveria ser registrada como uma peça de oratória a ser estudada. Ele realiza dois movimentos. Um é o discurso institucional, no Congresso Nacional, que é sempre mais formal, mais comedido, em que defende justiça e não o revanchismo. Adota a bandeira da punição. Em seguida, Rodrigo Pacheco, presidente do Senado,  busca a defesa da conciliação.

É no púlpito onde discursa para o povo que Lula defende o seu capital político quando foi presidente em dois mandatos, e revela o diagnóstico da equipe de transição que mapeia as políticas de destruição de Jair Bolsonaro, que conduziu um índice alto da miséria, da fome e dos medicamentos. Mostra que o líder da extrema direita governou para os ricos e excluiu os pobres das políticas públicas. Um verdadeiro vendaval de destruição do tecido social. Neste momento o povo compreendeu que tinham feito um crime contra a Nação, e os presentes reagiram: “Anistia não! Anistia não! Anistia não!”.

As lideranças de direita, se ainda seguiam costurando um perdão para o Bolsonaro, certamente recuaram. Se a direita midiática buscou em algum momento etiquetar revanchismo no presidente recém empossado, arquivaram qualquer tipo de narrativa. A poderosa retórica do Lula nos anima a afirmar que a conciliação do andar de cima, que blinda as punições, desta vez na história da República não irá suceder.

Teve muitos simbolismos na posse, principalmente pelo segundo artigo da nossa Carta Magna ter sido levado praticamente ao pé da letra: “Todo o poder emana do povo (…)”. E isso vimos quando uma mulher negra entrega a faixa ao presidente Lula. No domingo, primeiro de janeiro, se compreende porque os romanos davam uma importância à oratória muito mais que as artes, literaturas e até acima da poesia. O que vimos no primeiro dia do ano é muito animador!


*Jornalista.

Imagem em Pixabay.

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