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Opinião

A democracia precisa ajudar a fragilidade humana

A democracia precisa ajudar a fragilidade humana

Artigo por RED
10/08/2023 12:30 • Atualizado em 14/08/2023 22:32
A democracia precisa ajudar a fragilidade humana

De EDELBERTO BEHS*

“Basta de querer tratar o Brasil como atingido também de subdesenvolvimento intelectual”, alertava o bispo de Olinda e Recife, dom Hélder Câmara, como registrado no seu livro Revolução dentro da paz, editado em 1968.

“Deixou de ter sentido a leviandade de chamar de subversivo e comunista quem tem fome de justiça e de paz; quem se recusar a reduzir o mundo a duas únicas opções: capitalismo ou comunismo”, escreveu há 55 anos.

Se vivo fosse, dom Hélder certamente ficaria estarrecido ao olhar o Brasil atual. A onda fascista que se alastrou pelo país nos últimos anos ainda recorre ao mantra do comunismo como uma grande ameaça. Mantra tão repetido até mesmo em campanha eleitoral!

Há 55 anos, dom Hélder já admoestava que não era mais possível usar o singular, mas o plural, “porque não há mais socialismo, mas socialismos, como não há mais capitalismo e sim capitalismos”. No Brasil vige um capitalismo selvagem, bem distinto daquele praticado, por exemplo, na Finlândia, Noruega, Suécia.

Embora a era colonialista tenha acabado, ao menos oficialmente, permanece “quase sempre, dentro dos países subdesenvolvidos, o colonialismo interno que permite enriquecimento fácil à custa de massas mantidas em situação infra-humana”, dizia dom Hélder. Não é essa a situação brasileira?

Ainda dá para colocar o Brasil no quadro dos países subdesenvolvidos? Do ponto de vista econômico, o Brasil não cabe mais nesse grupo. Mas política e culturalmente a nação estagnou no colonialismo interno e ainda persegue defensores dos direitos humanos e qualifica pessoas que defendem uma reforma agrária ou uma justa distribuição de renda de “comunistas”.

“’Liberdade’ é palavra sem sentido para quem não tem casa que mereça o nome de casa, nem verdadeiro alimento, nem vestido de verdade, nem um mínimo de condição de educação e de trabalho real”, definia o bispo no seu livro. Será que brasileiros e brasileiras, ao menos uma parte, entendem, em 2023, esse sentido de liberdade plena?

Em 1968, dom Hélder tinha questionamentos quanto ao papel da educação. “A dúvida consiste em saber se educação tira escamas dos olhos de ricos, rompe carapuças de egoísmo, revolve consciências, muda mentalidades, conduz a reformas de estruturas econômico-sociais”, dizia. Diria, certamente, o mesmo nos dias atuais.

Alcunhado de “bispo vermelho” e proibido pela ditadura cívico-militar de 64 de ser mencionado na imprensa brasileira, dom Hélder frisava, em 1968, o papel da Igreja, enfatizando que “o cristianismo não se prende a nenhum sistema econômico, social ou político, exige apenas a salvaguarda do bem-comum e a prática da justiça e da caridade”.

No livro, dom Hélder deixa um apelo: “Valorizem o homem como o centro e o fim da atividade econômica”, indicando, também, que “a democracia precisa ajudar a fragilidade humana”. Admoestação que não perdeu o sentido no passar dos 55 anos!


*Professor, teólogo e jornalista.

Imagem: reprodução acervo Vatican News.

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