Opinião
A coragem de Irena Sendler
A coragem de Irena Sendler
De SOLON SALDANHA*
Era uma polonesa que trabalhava em um serviço bastante simples e com certeza pouco invejado, como especialista em encanamentos e esgotos no Gueto de Varsóvia, a capital do seu país. E fazia isso justamente nos anos em que se vivia na Europa os piores horrores da Segunda Guerra Mundial. Seu nome: Irena Sendler.
O Gueto de Varsóvia foi criado logo após a ocupação da Polônia pelos alemães nazistas, em 1939. Tratou-se da primeira e mais importante ação de isolamento da população judaica. Existiu durante pouco mais de três anos, em sua plenitude. Mas, nesse período, a população inicial que era estimada em 380 mil pessoas foi reduzida para apenas 90 mil. As razões para isso foram mortes por fome e doenças, deportações para campos de trabalhos forçados e, principalmente, execuções feitas na câmara de gás, no campo nazista de extermínio na cidade de Treblinka.
Em função de conhecer como poucos o emaranhado de caminhos nos quais atuava diariamente, Irena conseguiu fazer um trabalho monumental em se tratando de salvar crianças judias. Ela as contrabandeava, a pedido dos próprios pais, quando ainda vivos, para fora do perímetro perigoso controlado pelos nazistas. Os bebês eram escondidos numa caixa de ferramentas, enquanto que para crianças maiores fazia uso de um saco de aniagem. Não há informação precisa sobre o número que conseguiu salvar, mas não foram poucas. Estimativas apontam para algo próximo de 2.500. Interessante é que, para cobrir barulhos que poderiam fazer os muito pequenos, a denunciando, ela treinou um cachorro para latir nos momentos em que isso se fazia necessário.
Um dia foi surpreendida pelos soldados nazistas, que lhe aplicaram uma violenta surra. Quebraram seus braços e pernas, o que a deixou fora de atividade por um bom tempo. Mesmo assim, ela prosseguiu colaborando com o esforço da resistência. Uma das coisas importantes que fez foi um registro no qual colocou os dados possíveis de boa parte das crianças que salvou. Os escritos depois eram colocados dentro de uma jarra de vidro, que enterrava no quintal. Foi através deles que ela desempenhou outro papel incansável, após o término do conflito militar: localizar os pais sobreviventes e reunir outra vez as famílias. Nisso teve sucesso muito menor, uma vez que a maioria dos pais haviam sido mortos nas câmaras de gás. Mas as crianças, quase todas, foram colocadas em lares adotivos.
O trabalho de Irena foi reconhecido, posteriormente. De tal forma que ela chegou a ser indicada ao Prêmio Nobel da Paz, no ano de 2007. Mas não conseguiu vencer Al Gore, que terminou sendo o agraciado, devido à atuação no combate ao aquecimento global. Em 2008 faleceu, ainda na sua querida Varsóvia, que nunca abandonou desde o nascimento, em 1910. Já era viúva, na ocasião, mas deixou três filhos: Janira, Andrzej e Adam. Deixou também um legado, uma inspiração, comprovando que todos os que se esforçam fazem diferença. E que a luta contra o ideal fascista deve ser de todos os que amam a vida, a democracia e a plena liberdade. Que empatia, altruísmo e compaixão podem de fato levar esse mundo a ser melhor.
Quanto ao bônus musical de hoje do autor, trata-se da música Coragem, com Diogo Nogueira.
*Jornalista e blogueiro. Apresentador do programa Espaço Plural – Debates e Entrevistas, da RED.
Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades.
Montagem com fotos de Irena Sendler em três momentos de sua vida, disponibilizada pelo autor.
As opiniões emitidas nos artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da Rede Estação Democracia.
Toque novamente para sair.