Opinião
Ao presidente da CBF
Ao presidente da CBF
De SOLON SALDANHA*
Caro presidente Ednaldo Rodrigues! O senhor não me conhece e nem haveria motivo para tanto. Mesmo assim, este ilustre desconhecido pede permissão para cometer a ousadia de lhe sugerir uma providência. Isso porque o senhor mesmo, com uma nota oficial divulgada depois daquilo que ocorreu em Brasília, dia 8 de janeiro, demonstrou uma preocupação que eu também tenho, apesar da minha estar apenas no âmbito de um torcedor comum. Concordo plenamente com o teor do documento, pois de fato “a camisa da seleção é um símbolo da alegria do nosso povo” e não deveria de modo algum ser associada a coisas como vandalismo e desrespeito às instituições e até à vida. Deste modo, o resgate de tudo aquilo que ela já representou tem que ser prioritário, uma decisão que cabe mesmo ao senhor e quem mais comande o futebol brasileiro. Não pode mais pairar dúvida sobre esse papel agregador, de união de todos nós, que a Seleção sempre cumpriu.
Quero lembrar ao senhor que no passado nossos atletas jogavam com uma camiseta branca. Isso perdurou até o trauma que foi a derrota de virada para o Uruguai, em pleno Maracanã, na final da Copa do Mundo de 1950. Então foi dada a largada em um movimento que pretendia fazer uma troca, para “exorcizar” aquele manto. E coube, coincidentemente, a um gaúcho como eu criar o novo modelo, que foi escolhido após uma grande campanha. O pai da “canarinho” foi Aldyr Garcia Schlee, que era desenhista em Pelotas. Ele revelou, depois, que até chegar ao modelo definitivo havia feito mais de cem tentativas. Mas, o resultado final ficou de fato muito bom, senhor presidente.
Na final da Copa do Mundo de 1958, disputada na Suécia e na qual a camisa amarela iniciava uma trajetória vitoriosa, criou-se um impasse. Os donos da casa, que também chegaram à decisão, atuavam – o que fazem até hoje – com uma camisa amarela. Apesar do regulamento prever que caberia ao visitante escolher a cor do uniforme com o qual entraria em campo, os suecos protestaram e exigiram um sorteio. Com ele, acabaram ganhando essa primazia. Bateu medo em vários dos nossos atletas, supersticiosos que temiam usar outra vez o branco e trazer de volta a maldição antiga. Então o chefe da delegação do Brasil, que era Paulo Machado de Carvalho, fez uso de um subterfúgio para que o temor se tornasse uma força motivacional a mais. Providenciou uniforme na cor azul, dizendo que essa era a cor do manto da padroeira, Nossa Senhora Aparecida. E o primeiro título mundial foi conquistado, com um sonoro 5×2.
Nem seria necessário repetir isso tudo aqui, porque o senhor na certa conhece todas essas histórias muito mais do que eu. Fiz apenas para dizer que três das quatro cores de nossa bandeira já foram ostentadas com orgulho na camiseta oficial da Seleção Brasileira. Atuamos de branco, de amarelo e de azul. Ora, senhor presidente, agora que chegamos a outro momento que é crucial, nos resta fazer uso daquela que ainda falta. E que é linda. Com ela poderemos superar esse novo trauma, que tem origem diferente do outro que veio com o “Maracanaço”, mas que tem proporções talvez ainda maiores e mais nefastas. O verde pode jogar fora a crise com repercussões esportivas, que vinha se arrastando e explodiu de vez com o “Brasilianaço”.
Quero citar, senhor presidente, que o verde está inclusive em alta com a retomada do esforço de preservação das nossas florestas. Que o verde representa esperança – e precisamos dela para quebrar esse novo jejum indesejável de títulos mundiais. Que ele aponta para o futuro, aquele que sonhamos possa ser comum de todos os brasileiros. Com essa nova cor podemos partir na busca do tão desejado hexa. E, melhor do que essa conquista, que na certa nos orgulharia muito, podemos com ela alcançar uma pacificação necessária. Podemos dar ao esporte mais amado no Brasil e no mundo a chance de ser outra vez um lenitivo, não alienante como tantos sempre gostaram de afirmar, mas agregador. O senhor estaria prestando um serviço inestimável ao nosso país. Por favor, pense nisso com a atenção e o carinho necessários. Um abraço deste otimista incurável.
Abaixo, você tem acesso ao bônus musical do autor, que é composto por dois áudios distintos: Brasil Hexacampeão, música de Agostinho Silva, com a Banda Folia Brasileira; e Volta Por Cima, de Paulo Vanzolini na voz de Beth Carvalho.
*Jornalista e blogueiro. Apresentador do programa Espaço Plural – Debates e Entrevistas, da RED.
Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades.
Imagem de divulgação da Nike, que em 2022 chegou a usar a cor verde, mesmo que não sozinha, em camiseta de treino da Seleção Brasileira.
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