Meta Democrática Civilizatória e Republicana

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De JORGE ALBERTO BENITZ*

Até a direita civilizada e republicana sabe e concorda com as prioridades do novo governo que são o combate à miséria e meio ambiente, embora tucanos mais emplumados gananciosos, grãos- senhores da banca, no sentido dado por Elio Gaspari, queiram uma fórmula que mantenha intocado o teto de gastos públicos, considerado um limite quase sagrado posto que, suponho, inscrito nas Tábuas Bíblicas do Deus Mercado.

Ao meu juízo existe outra prioridade não menos importante que é retirar da indigência cultural ideológica, uma quantidade significativa da sociedade brasileira que vive abaixo do limite mínimo de civilidade, senso democrático e republicano. Retirar da miséria econômica é uma empreitada relativamente mais fácil. Quem está abaixo da miséria econômica não está ali porque quer. Ao contrário, dos indigentes culturais que, a julgar por seus atos e pensamentos, estão satisfeitos onde estão. Pior, lutam furiosamente contra os que o querem desalojar e a quem consideram seus inimigos reais ou imaginários.

Diferente do combate à miséria que se constitui em uma questão urgente, a indigência cultural ideológica exige um projeto mais longo e mais amplo que o feito anteriormente pelos governos petistas que incluíram grandes contingentes de pessoas via consumo ao mercado consumidor fazendo pouco ou nada no sentido de conscientização ideológico cultural. O que resultou na constatação de que muitos beneficiários das políticas sociais e econômicas se tornaram bolsonaristas dos mais fervorosos. Fenômeno que já se vislumbrava antes do advento do bolsonarismo quando, por exemplo, nos deparávamos com o filho do porteiro, beneficiários das políticas de cotas ou dos financiamentos universitários, admirador dos valores neoliberais e se achando alguém que chegou aonde chegou mais devido aos seus méritos do que por políticas sociais inclusivas.

A indigência cultural ideológica se aprofundou na esteira da hegemonia do neoliberalismo. É cria dileta do pensamento único neoliberal adotado como cartilha política defendida em uníssono por toda a mídia impressa, falada e televisiva brasileira. Suas teses principais defendiam a ideia de que a política e os políticos não prestam, o Estado deve ser mínimo, qualquer ação política coletiva é condenável, os empresários empreendedores são o caminho a verdade e a vida para a solução dos problemas de qualquer ordem. Enfim, o egoísmo foi elevado a valor maior. Um ideário muito atrativo para uma socieda de, acrescente- se nossa herança escravista, obrigada pela repressão a não discutir política durante a ditadura e que depois recebeu via imprensa falada, impressa e televisiva um kit completo de pensamento acerca de política que afaga o ego do sujeito alienado que terceirizou este assunto preferindo repetir, de forma acrítica, o dito, ouvido e visto nos jornalões, rádios e TVs. Com certeza, disso não resultaria algo nada bom. E não resultou mesmo.

Quando se pensava que o estilo político tucano de ser significava o mais acabado modelo antiPovo, antiEstado, antiDemocrático, veio um tsunami montado nas ferramentas de última geração tecnológica (Whatsapp) varrendo o que restava de decoro republicano e civilidade. Instaura- se o caos bolsonarista, tendo como receita e indo além, muito além, do modelo neoliberal tucano que a despeito de defender uma agenda que priorizava o mercado, dando ênfase a liberdade no binômio igualdade/liberdade, como ensina Norberto Bobbio,  mantinha respeito à democracia representativa e aos valores iluministas liberais no comportamento e costumes, isto é, não adotava in t otum o negacionismo dos valores republicanos, democráticos e civilizatórios, como faz a extrema direita bolsonarista.

Não se trata de um resgate de todo o contingente bolsonarista. Seria impossível. Muitos deles, são almas perdidas para a democracia, a civilidade e o republicanismo, seja porque sua visão de mundo coincide com a pulsão de morte de extrema direita bolsonarista representada por interesses que lucram com a destruição do meio ambiente, com a desigualdade social, política e econômica, seja porque são conservadores e mesmo reacionários de carteirinha em questões de costumes e comportamento.

Enfim, trata- se de um assunto que não deve ser negligenciado e deixado para que uma, parafraseando Adam Smith, espécie de “mão invisível” democrática a solucione, como nos governos petistas anteriores que apostou quase todas as fichas na inclusão via consumo. Um governo comprometido com a democracia tem a obrigação, sob pena de legitimarmos e consolidarmos uma agenda de extrema direita que tanto retrocessos e males tem trazido a sociedade brasileira e mundial, e tantos ainda pode causar, caso não se assuma esta tarefa como uma de suas principais metas; isto é, caso nada for feito no sentido de combate, via conscientização po lítica republicana, as bandeiras antitudo que represente valores democráticos.


*Jorge Alberto Benitz é engenheiro e escritor

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Publicado originalmente no Jornal GGN

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