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Opinião

A “Operação L” e as Tarefas da (Re)Soberania do Brasil

A “Operação L” e as Tarefas da (Re)Soberania do Brasil

Artigo por RED
19/11/2022 11:25 • Atualizado em 20/11/2022 19:02
A “Operação L” e as Tarefas da (Re)Soberania do Brasil

De ILTON FREITAS*

A conclusão bem-sucedida da fase eleitoral da “Operação L”, com a vitória do presidente Lula no pleito de 30/10, lavou a alma de milhões e milhões de brasileiros! Sobretudo daqueles que se orgulham das potencialidades de seu País e nutrem esperança para a (re)construção de uma nação soberana, democrática, inclusiva e desenvolvida! A rigor foi a liderança do presidente Lula e a memória histórica do que foram seus dois mandatos anteriores (2003-2006 e 2007-2010), combinadas com a resistência democrática e popular ante a ameaça neofascista, que permitiram a estupenda vitória política e eleitoral. Um verdadeiro levante cívico de defesa do estado de direito e que galvanizou a resistência dos verdadeiros patriotas em todo o território nacional. Talvez números absolutos expressos eleitoralmente ilustrem um processo de resistência admirável protagonizados pelas classes populares brasileiras, sintetizadas na eleição de sua maior liderança, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Enquanto Bolsonaro aumentou sua votação em pouco mais de 408.000 (quatrocentos e oito mil votos) em relação ao segundo turno das presidenciais de 2018, Lula aumentou em 13.305.000 (treze milhões e trezentos e cinco mil) votos em relação ao desempenho de Haddad, e com notória recuperação eleitoral nas regiões sudeste e sul.

Creio que esse processo de resistência popular e democrática que culminaram na vitória eleitoral de Lula, vem sendo bem analisado e suficientemente aquilatado em publicações, blogs e comentários na mídia-esfera progressista. Sobretudo por que não se tratou de uma eleição entre dois projetos políticos mais ou menos liberal, e/ou, estatizante. A candidatura da extrema-direita consistia numa ameaça existencial ao País e a seu frágil arcabouço institucional democrático corroído pelas oligarquias nativas! O que foi contido com a vitória do presidente Lula foi o aniquilamento do estado-nação brasileiro. À destarte da tentativa do governo neofascista que lançou mão de expedientes mais do que suspeitos como o orçamento secreto para sua reeleição, bem como para eleger deputados e senadores. E mais, o governo Bolsonaro instrumentalizou órgãos do estado como a Polícia Rodoviária Federal para impedir a manifestação do eleitor no nordeste, e usou e abusou eleitoreiramente de programas sociais como o Auxílio Brasil e o empréstimo consignado. Em resumo, o que pretendiam com a reeleição do bolsonarismo era a ampliação da escalada da barbárie e do caos social como modus operandi (des)governamental, tendo em vista o despejo de nossa formação social no mais absoluto estado de natureza hobbesiano. Isto é, da luta de todos contra todos para regozijo da elite compradora nativa e de seus amos da América do Norte.

Contudo, os inimigos do País e das classes populares e trabalhadoras foram contidos, mas é prudente remarcar que não foram derrotados historicamente. O fascismo militante nas estradas/ruas e seu comportamento delinquente atesta isso, assim como a eleição de governadores de direita em SP, RJ e MG. Outrossim, e levando em consideração os grandes desafios de reconstrução do País, a partir da grande vitória eleitoral do campo progressista, se impõe as enormes tarefas da (re)soberania do Brasil. Mas quais seriam essas tarefas?

Por suposto que pelos limites das publicações do blog não há como aprofundar conteúdos de natureza estratégica, e que versam sobre temas complexos que impactam desde a política externa até os temas domésticos mais sensíveis como, e, sobretudo, o combate sem quartel à desigualdade social, a chaga da miséria e da pobreza extrema. Sendo assim me atrevo a enunciar três diretrizes estratégicas que a meu juízo organizam e justificam um governo de frente ampla, mas vertebrado por um partido de esquerda que priorize a defesa das classes populares e trabalhadoras e a soberania nacional sobre o território, as riquezas naturais e o patrimônio público/estatal. Sem ordem de importância ou hierarquia penso nas seguintes diretrizes gerais:

  • Brasil, pátria da inclusão social e da emancipação dos trabalhadores e das classes populares;
  • Brasil, pátria soberana e construtora do mundo multipolar e dos BRICS;
  • Brasil, pátria livre do fascismo e sua versão tropical, o bolsonarismo!

Por hora basta enunciar em relação as duas primeiras diretrizes que a construção do mundo multipolar guarda estreita relação com o combate às desigualdades sociais. E , sobretudo, com a emergência em dar combate de imediato ao flagelo da fome e da insegurança alimentar que assola quase a metade da população. Qual a relação entre o combate à fome e a construção do mundo multipolar? É muito simples. Como bem ensina o presidente Lula, para o País se desenvolver é necessário fazer a roda da economia girar disponibilizando renda para o consumo popular através da retomada dos programas sociais como o Bolsa Família, recuperação do salário mínimo, pensões e aposentadorias. E para tornar esse desenvolvimento sustentável é necessário que o estado recupere sua capacidade de promover investimentos públicos (PAC 3) e atraia os investimentos internacionais produtivos e em infraestrutura, o que só será possível com a construção decidida de blocos comerciais e políticos como o BRICS, UNASUL e CELAC.

Mas para os propósitos dessa breve reflexão quero me ater à diretriz que denominei como “Pátria Livre do Fascismo e de sua versão tropical, o bolsonarismo”. Talvez o principal fruto podre do desencadeamento da “Guerra Híbrida” imperial contra o estado e o povo brasileiro tenha sido a organização de uma extensa e razoavelmente nutrida “quinta coluna”. Desde Sun Tzu é sabido que estimular e forjar grupos de indivíduos dispostos a traírem sua pátria em troca de privilégios faz parte da dominação de um “reino” sobre o outro, ou, mais contemporaneamente de um Estado-nação sobre o outro. Ainda mais num contexto de relações assimétricas entre os países, onde uma potência hegemônica (no caso os EUA) lance mão e demande a exploração desenfreada dos povos e das nações em desenvolvimento. Nesse sentido as “jornadas de junho” de 2013, as “revoluções coloridas” dos “patos amarelos” de 2015 e 2016, e a insurreição bolsonarista pós-eleitoral nas estradas e ante os quartéis do exército brasileiro, ilustram sobremaneira um fenômeno que deita suas raízes ao longo da história.

Portanto, candidatos a cumprirem papel de quintas-colunas a serviço das classes proprietárias e de países estrangeiros direta, ou, indiretamente não constitui um fenômeno novo. E também não é novo que ajustar as contas com os “quintas colunas”, ou, gusanos, conforme os cubanos, é desiderato fundamental para remover um entrave doméstico, tendo em vista a soberania e o desenvolvimento do País.

Mas “acertar as contas” não pressupõe perseguir ou impedir as manifestações dos intolerantes e daqueles que almejam privilégios e viver como colonizados pelo decadente imperialismo norte-americano, e que não querem reconhecer o resultado das eleições. As “tias do Zap”, ou, os decrépito(a)s cidadãos e carpideiras a perorar asneiras e gerar “memes” à frente dos quartéis, merecem quando muito o desprezo dos brasileiros e brasileiras decentes. Por óbvio que aqueles que cometeram ou cometem delitos e ameaças à integridade física e ao patrimônio dos cidadãos nas ruas e nas estradas, devem e deverão responder à lei penal. E que sua aplicação recaia de modo exemplar aos devidamente identificados e implicados em crimes, sobretudo, aqueles que financiam a baderna e os baderneiros. Agentes públicos que estiverem dando guarida à turba bolsonarista e facilitando a baderna também devem responder perante à lei.

Contudo, o que deverá ser desmontado e no ritmo que as circunstâncias permitirem é a remanescente estrutura do estado oligárquico brasileiro, que ao fim e ao cabo é o que permitiu a aberração bolsonarista governar o País. Porquanto é o estado oligárquico e boa parte de sua institucionalidade que guarda relação orgânica com o imperialismo norte-americano, e que serve aos seus propósitos de dominação e de colonização eterna do País. Vide , por exemplo, o caso da “Lava à Jato” e a destruição do setor mais dinâmico e competitivo da economia nacional na oportunidade, isto é, a cadeia produtiva do petróleo e do gás estimulada e coordenada pela Petrobras. A destruição de nossa economia foi levada à cabo por agentes públicos do judiciário e do ministério público federal, e o as instituições do estado oligárquico pouco ou nada fizeram para impedir o estrago. Sendo assim e para ser claro não basta ocupar os espaços vazios ou permitidos pela “Casa Grande” aos representantes da “Senzala”. Se trata é de demolir a “Casa Grande” e suas instituições oligárquicas pouco permeáveis e não controladas pelo interesse público, posto que somente o controle publico e popular do estado é que pode salvaguardar a sociedade da ameaça fascista

O bolsonarismo é muito menos uma aberração sociológica e política. É fundamental que se compreenda que o fascismo tropical é um recurso político ad hoc. Posto que só pode sobreviver às expensas da “Casa Grande” , ou, de um estado oligárquico que não hesitará em promover milícias e milicianos contra os interesse da maioria do povo brasileiro, porquanto se sintam ameaçados existencialmente. Fascistas e bolsonaristas equivalem a bestas atiçadas contra a população. Por vezes perdem o controle e mordem seus próprios amos. Serão no limite sacrificados se adquirirem muita autonomia e resistirem à focinheira, e não retornarem ao canil como demonstrou a história do século XX.

Por seu turno, importa remarcar que o bolsonarismo deve ser devidamente individualizado e criminalizado na forma da lei, e os seus partidários comprovadamente criminosos devem ser banidos da convivência democrática em nosso País. Há que se desestruturar, processar e punir exemplarmente toda a rede de comando que promoveu o fascismo tropical, devidamente representado por Bolsonaro e por sua camarilha de malfeitores dentro e fora do governo. O estado brasileiro deve ser purgado da contaminação bolsonarista, e todos aqueles que cometeram ou que acobertaram delitos devem ser rigorosamente punidos. Há que se identificar as fontes externas de financiamento do bolsonarismo, identificar, processar criminalmente e banir seu ecossistema que se reproduz pelas redes sociais. Pois sem querer aprofundar o tema é mais do que necessário que as redes na internet reprodutoras de ódio e de fake News, os comandos e “altos comandos” que apoiam velada ou abertamente o neofascismo bolsonarista e que possuem vínculos orgânicos com a extrema-direita estadunidense, devem ser impedidos de permanecerem à margem da lei se escusando numa degradada e deturpada “liberdade de expressão”. Que as novas autoridades federais da área da segurança e da justiça estejam à altura para aplicar a lei e suas penalidades com o máximo rigor, e extirpar o cancro bolsonarista do debate público nacional.

No entanto, e para além da condenação moral, criminal e política da aberração bolsonarista, se faz mister saber emoldurar o fenômeno reacionário numa perspectiva mais ampla. No século passado o(s) fascismo(s) foram recursos políticos empregados pelos grandes detentores do capital junto a setores médios arregimentados, e que se beneficiavam das migalhas do parasitismo e da exploração das classes dominantes. Na medida em que o grande capital percebeu que seus interesses de classe estavam ameaçados pelo avanço dos representantes das classes populares, não hesitaram em mobilizar a besta do fascismo na Itália, na Alemanha e no leste europeu.

No caso do Brasil contemporâneo o bolsonarismo resultou da aplicação da dinâmica do caos cujo ponto de inflexão remonta às “jornadas de junho” de 2013. Em tempos de “Guerra Híbrida” imperial e a ênfase que seus formuladores empregam nos “conflitos indiretos” para fins de desestabilização de governos hostis aos interesses estadunidenses, a resultante do processo no Brasil desaguou no bolsonarismo, espécie de fascismo tropical turbinado pelo advento da digitalização e das redes sociais. Portanto, o fascismo tropical bolsonarista foi o arranjo resultante da aplicação da “Guerra Híbrida” e sua dinâmica do caos sobre o País. Com o beneplácito das oligarquias nativas foi o recurso de que lançaram mão para impedir as reeleições dos governos petistas e da afirmação das causas populares, democráticas e soberanas. Mas a história deu o troco com a resistência do povo brasileiro ao golpe de 2016 e ao fascismo tropical bolsonarista. A liderança do presidente Lula saberá honrar com os compromissos com o povo brasileiro, com o aprofundamento da democracia, com suas classes populares e trabalhadoras, com a remoção do entulho bolsonarista e com a inadiável e estratégica tarefa da soberania nacional para a edificação do mundo multipolar!


*Doutor em Ciência Política, historiador, foi pesquisador associado do Centro de Estudos Internacionais de Governos (CEGOV/UFRGS). Autor dos livros Transparência e Controle na Era Digital – A agenda da democracia brasileira, editado pela Armazém Digital, Porto Alegre, 2012; e Guerra Híbrida Contra o Brazil, editado pela Liquidbook, em 2019.

Imagem – reprodução redes sociais PT.

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