Da REDAÇÃO
Projeto da dosimetria provoca efeitos colaterais que podem beneficiar outros crimes além dos atos golpistas
O Projeto de Lei da Dosimetria (PL 2.162/2023), aprovado ontem pela Câmara dos Deputados, tem gerado preocupação entre especialistas do direito penal por suas consequências que vão além do escopo original. Além de reduzir penas e facilitar a progressão de regime para condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, o texto pode abrir brechas para beneficiar outros tipos de crimes, como incêndio doloso, coação no curso do processo e associação criminosa, dependendo da interpretação judicial.
O projeto modifica regras do Código Penal e da Lei de Execução Penal e permite que a progressão de regime para o semiaberto ocorra após o cumprimento de apenas um sexto da pena em casos que envolvem violência ou grave ameaça, desde que os crimes não estejam entre os mais graves do código. Além disso, autoriza a remição de pena por estudo e trabalho mesmo em regime domiciliar.
Crimes contra o Estado Democrático de Direito são foco principal
Apesar dos efeitos colaterais em outros crimes, o foco principal do projeto é beneficiar os condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro. Entre os beneficiados estão pessoas condenadas por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e outros crimes inseridos após os ataques às instituições.
O novo critério de dosimetria determina que, quando há vários crimes praticados no mesmo contexto, aplica-se apenas a pena mais grave com acréscimo proporcional, evitando a soma de penas que aumentava significativamente o tempo de prisão. Além disso, quem participou em “contexto de multidão”, sem papel de liderança ou financiamento, pode ter a pena reduzida de um terço a dois terços. Juristas e membros do Ministério Público alertam que esse tipo de redução funciona, na prática, como um incentivo a novas tentativas de golpes de Estado e ataques à democracia, ao sinalizar uma resposta branda do sistema penal a crimes que ameaçam as instituições democráticas.
Contradição na base da direita
A proposta foi articulada por deputados da direita, que tradicionalmente defendem penas mais duras e menos benefícios penais. A aprovação do texto, porém, contraria esse discurso e levanta questionamentos sobre o uso seletivo do direito penal para proteger aliados políticos. Para a oposição, trata-se de uma “anistia branca” disfarçada de ajuste técnico.
Ilustração da capa: À sombra da lei – Bolsonaro na cela na PF em Brasília – Imagem gerada por IA ChatGPT.




