Por ADELI SELL*
Desde que aqui cheguei (1972) tenho uma verdadeira paixão pela cidade.
Vivi cada momento destes 53 anos.
Tinha jurado que jamais sairia daqui. Afinal, aqui estudei, trabalhei, fui vereador por anos e anos, fui livreiro, professor. Tenho muitos amigos.
Porto Alegre tem encantos mil. Do Viaduto Otávio Rocha – faz seus 93 anos neste 2025,e está reforma há meia dúzia deles, encantou o Paulo José que a ele dedicou doces palavras à visão que tenho do meu apartamento da Praça da Matriz e entorno são não só os ipês floridos da Primavera que me encantam. Tudo me lembra de momentos de nosso passado.
Se eu desço até a Praça da Alfândega os encantos se repetem. Se vou ao Mercado ou ao Chalé, tudo me traz alegrias.
Mas de alguns tempos para cá isto tudo está sendo morto em minha alma pelas calçadas quebradas, pela sujeira, pelo mau cheiro que exala dos contêineres. Deixam-me atordoados os “loucos de todos os tipos” (isto é, dezenas de doentes mentais) que perambulam pelo centro, em cenas deploráveis. Deixam-me com dor no estômago os seres humanos jogados nas calçadas sem teto. Uma pessoa idosa não pode caminhar nesta cidade.
Os cidadãos ficam esperando ônibus em filas sem fim, sem falar que nos finais de semana nem adianta tentar que os ônibus não chegam.
Querem criminalizar quem doa comida na rua aos desvalidos como aqueles que catam lixo.
Nossa Câmara virou um palco de horrores, não reconheço aquele espaço onde exerci os mais dinâmicos momentos de democracia na cidade.
Querem nos impor um Plano Diretor que vai acabar com nossa Memória, vai tomar nossas paisagens, vai aumentar o calor, vai detonar com árvores mais do que já se detonou pelas mãos das autoridades.
Fomos vítimas do desdém do poder público e as águas de março de 2024 acabam com casas, apartamentos, bens materiais, memórias de centenas de pessoas.
Nada foi feito desde então, passado mais de um ano.
Não são apenas as autoridades que nos devem outra cidade, uma volta àquela Porto Alegre do Orçamento Participativo, da democracia direta, do Fórum Social Mundial.
As pessoas estão sendo deseducadas e isto que nos chamamos no passado de “cidade educadora”.
A cidade está insegura em todos os sentidos. A publicidade pública esconde todas as nossas mazelas.
Os motoristas avançam o sinal. Os pedestres não olham quando o sinal fechado e invadem a rua. Ciclistas alucinados atropelam e outros são atropelados por motoristas de carros mais alucinados ainda. As patinetes causam acidentes diários, derrubam velhos nas esquinas e nada se faz.
Em 12 anos Porto Alegre perdeu 76 mil moradores. Sem contar aqueles que se foram depois das enchentes. Temos 101 mil unidades de moradia ou comerciais fechadas.
A gente só vê placas de “Aluga-se”, “Vende-se” ou simplesmente “nada consta”; estão fechadas.
Legiões de aposentados, pagos pelo nosso erário, vão morar em Santa Catarina, fica lá o dinheiro, perdemos nós que aqui ficamos.
Ainda teimamos em ficar, em lutar, mas até quando? É a pergunta que jamais pensei em me fazer. Na atualidade me faço esta pergunta com frequência.
*Adeli Sell é professor, bacharel em Direito.
Foto de capa: Luiza Castro/Sul 21




