Documentos históricos das atas das reuniões do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS) revelam que, desde pelo menos duas décadas, membros do colegiado registravam alertas sobre irregularidades nos empréstimos consignados feitos por aposentados e pensionistas — antes mesmo de operações recentes que reavivaram o escândalo.
As atas obtidas indicam que, em reuniões internas, já havia críticas ao volume de descontos indevidos e à falta de controle sobre entidades que operavam com descontos em benefícios previdenciários sem plena transparência ou autorização legal. Essas menções antecedem, portanto, as denúncias em curso, sugerindo que os problemas vinham sendo percebidos, mas sem medidas efetivas.
Histórico de alertas e omissões
Os relatórios das reuniões apontavam práticas como:
- concessão de consignados sem análise detalhada ou fiscalização adequada;
- entidades com contratos suspeitos de operar descontos em benefícios de forma não autorizada;
- falta de mecanismos de controle interno para confrontar os dados de empréstimos com os registros da Previdência Social.
Segundo fontes próximas ao acervo, alguns conselheiros chegaram a propor auditorias e exigências de relatórios extras, mas esbarraram em resistências políticas e jurídicas internas.
Escândalo atual
Atualmente, tramita no país a investigação conhecida como “Operação Sem Desconto”, que descobriu um esquema recente de descontos indevidos em benefícios do INSS, envolvendo entidades privadas com contratos irregulares. A operação já cumpriu mandados de busca e apreensão em vários estados e trouxe à tona supostas fraudes de diversos milhões de reais.
Esses novos documentos reforçam a tese de que as irregularidades não são fatos isolados recentes, mas refletem omissões sistêmicas históricas dentro dos mecanismos previdenciários.
Desafios para reparação e responsabilização
Com essas atas em mãos, advogados e parlamentares que acompanham as denúncias podem usá-las como provas para sustentar responsabilizações administrativas e judiciais. Entre os impactos possíveis estão:
- reforço à argumentação sobre prescrição ou interrupção do prazo de investigação;
- exigência de correção retroativa de valores descontados indevidamente;
- abertura de novas frentes de investigação interna nos órgãos previdenciários;
- pressão política para ampliar transparência e fortalecer controles no INSS e no CNPS.
Linha do tempo das irregularidades
- 2003 – Primeiros registros oficiais em atas apontam falta de fiscalização sobre convênios firmados entre bancos e entidades representativas de aposentados. Conselheiros alertaram que havia risco de descontos não autorizados em benefícios previdenciários.
- 2005 – Relatos destacam aumento no número de reclamações de aposentados sobre empréstimos realizados sem consentimento. Houve pedido para criação de um sistema de verificação digital, que não avançou.
- 2008 – Conselheiros registraram preocupação com a expansão rápida do crédito consignado, associada à ausência de auditorias periódicas. Relatório interno já citava “condutas abusivas” de correspondentes bancários.
- 2012 – As atas apontaram contratos de associações pouco conhecidas que realizavam descontos em folha de forma sistemática. Conselheiros pediram investigação específica, sem resposta efetiva da Previdência.
- 2015 – Debate interno reforçou suspeitas de que a prática de “descontos fantasmas” estava se consolidando. Membros do colegiado alertaram para o risco de judicialização em massa.
- 2019 – Foram registrados questionamentos sobre a efetividade dos mecanismos de bloqueio de fraudes criados em anos anteriores. Conselheiros afirmaram que denúncias chegavam sem retorno administrativo.
- 2023 – Às vésperas da deflagração da Operação Sem Desconto, atas já mencionavam pressão de entidades financeiras e o aumento expressivo das reclamações em ouvidorias.
Imagem destacada: Reunião da comissão Parlamentar Mista de Inquérito do INSS para ouvir o ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Marques de Carvalho – Lula Marques/ Agência Brasil.




