Por BENEDITO TADEU CÉSAR*
Duas pesquisas divulgadas em setembro de 2025 — uma da Ipsos-Ipec e outra da AtlasIntel — mostram que o governo Lula entrou em trajetória de recuperação na opinião pública. Ambas registram melhora em relação a levantamentos anteriores, mas os números finais divergem: enquanto a Ipsos-Ipec indica aprovação de 30% e desaprovação de 38%, a AtlasIntel aponta 50,8% de aprovação contra 48,3% de rejeição.
A diferença decorre de metodologias distintas. O Ipec ouviu cerca de 2.000 pessoas em 132 municípios, em entrevistas presenciais. A AtlasIntel consultou 7.291 respondentes online, com margem de erro de apenas 1 ponto percentual. São instrumentos diferentes, que não permitem comparação direta, mas ambos captam um mesmo movimento: a rejeição ao governo recuou e a aprovação cresceu.
Além disso, o critério de avaliação utilizado foi diferente em cada pesquisa. A Ipos-Ipec ofereceu três alternativas de resposta, ou seja, Ótimo/Bom ou Aprovação, Ruim/Péssimo ou Desaprovação e Regular/Neutro enquanto a pesquisa AtlasIntel limitou-se às duas primeiras, sem a alternativa Regular/Neutro, forçando a definição do eleitor entrevistado.
Comparação geral de aprovação
| Pesquisa | Período | Ótimo/Bom ou Aprovação | Ruim/Péssimo ou Desaprovação | Regular/Neutro |
| Ipsos-Ipec | 4 a 8/9/2025 | 30% | 38% | 31% |
| AtlasIntel | 10 a 14/9/2025 | 50,8% | 48,3% | — |

Inflação: calcanhar de Aquiles
Na Ipsos-Ipec, 49% consideram ruim ou péssima a atuação do governo no controle de preços, contra apenas 21% de avaliação positiva. A AtlasIntel não traz recorte específico sobre inflação, mas o fato de quase metade dos entrevistados desaprovar a gestão mostra que o custo de vida segue como principal vetor de insatisfação.
O mesmo ocorre no desemprego. Embora o país registre o menor índice da série histórica do IBGE, apenas 30% avaliam positivamente a ação do governo no tema. A diferença entre dados objetivos e percepção popular revela um déficit de comunicação política.
Educação: saldo positivo
Na Ipsos-Ipec, a educação é a única área em que o governo supera a avaliação negativa: 38% de aprovação contra 35% de rejeição. É sinal de que políticas de expansão de vagas e aumento do orçamento para universidades públicas começam a ser notadas.
Aprovação por região
| Região | Ipsos-Ipec (Positiva) | Ipsos-Ipec (Negativa) | AtlasIntel |
| Nordeste | 46% | — | Maior índice de aprovação (sem percentual divulgado) |
| Sul | — | 52% negativa; 65% desaprovam o modo de governar | Crítica, mas com sinais de redução da rejeição |
Aprovação por religião
| Religião | Ipsos-Ipec (Positiva) | Ipsos-Ipec (Negativa) | AtlasIntel |
| Católicos | 37% positiva; 51% aprovam modo de governar | — | Aprovação acima da média nacional |
| Evangélicos | — | 46% negativa; 63% desaprovam | Aprovação bem abaixo da média; rejeição consistente |
Escolaridade e renda
| Segmento | Ipsos-Ipec (Positiva) | Ipsos-Ipec (Negativa) | AtlasIntel |
| Menos escolarizados | 40% | — | Aprovação mais alta |
| Mais escolarizados | — | 44% | Desaprovação acima da média |
| Até 1 salário mínimo | 37% positiva; 54% aprovam modo de governar | — | Apoio consistente |
| Acima de 5 salários | — | 48% negativa; 63% desaprovam | Rejeição predominante |
Voto em 2022
| Eleitorado | Ipsos-Ipec (Positiva) | Ipsos-Ipec (Negativa) | AtlasIntel |
| Eleitores de Lula | 61% positiva; 81% aprovam modo de governar | — | Apoio majoritário, acima de 70% |
| Eleitores de Bolsonaro | — | 67% negativa; 85% desaprovam | Rejeição maciça, mas com leve redução |
Polarização consolidada
Os recortes demográficos confirmam que a divisão entre lulistas e bolsonaristas segue sendo o eixo estruturante da política brasileira. No Nordeste, entre católicos e nas faixas de menor renda, Lula mantém apoio majoritário. Já no Sul, entre evangélicos, mais escolarizados e nas classes de renda superior, a rejeição continua predominante.
Mesmo quando a aprovação sobe em alguns segmentos, a clivagem de 2022 permanece firme. Quem votou em Lula segue majoritariamente a favor; quem votou em Bolsonaro continua contra. Esse padrão atravessa todas as categorias analisadas — sexo, idade, escolaridade, renda e religião.
Comunicação: elo perdido
A distância entre resultados objetivos (como desemprego em queda e expansão da educação) e percepção popular continua a ser o maior desafio do governo. Essa lacuna é histórica no campo progressista. Lula só consolidou aprovação elevada em 2006, quando os efeitos do Bolsa Família e do aumento do salário mínimo ficaram tangíveis. Dilma Rousseff sofreu desgaste acelerado por não comunicar suas políticas. Bolsonaro, ao contrário, manteve sua base fiel por meio de comunicação direta, mesmo diante de indicadores negativos.
Lula 3 repete o dilema: conquistas existem, mas não chegam ao imaginário popular de forma clara. A AtlasIntel sugere que há espaço para recuperação da credibilidade, mas isso dependerá de comunicação mais direta e próxima ao cotidiano da população.
Melhoria desigual, desafios e barreira
As pesquisas de setembro confirmam uma tendência: o governo Lula melhorou sua posição, ainda que de forma desigual. A Ipsos-Ipec mostra avanço limitado, com desaprovação ainda superior à aprovação. A AtlasIntel aponta uma virada simbólica, com mais de 50% de apoio.
O desafio central continua sendo a economia, sobretudo a inflação. Mas o déficit de comunicação transforma ganhos concretos em invisíveis, deixando espaço para narrativas oposicionistas.
Enquanto isso, a polarização segue determinando os alinhamentos: lulistas aprovam, bolsonaristas rejeitam. Essa barreira parece intransponível no curto prazo.
Linhas do tempo comparativas de aprovação governamental
A trajetória de popularidade dos últimos presidentes mostra como dados econômicos, crises políticas e comunicação impactam diretamente a percepção popular.
Lula – primeiros mandatos (2003–2010)
- 2003: início com cerca de 40% de aprovação.
- 2004–2006: crescimento econômico, Bolsa Família e aumento real do salário mínimo elevam apoio a mais de 60%.
- 2006: mensalão provoca queda, mas há recuperação rápida.
- 2007–2010: auge da popularidade, superando 80% em 2010.

Dilma Rousseff (2011–2016)
- 2011–2012: herança de Lula garante aprovação de mais de 55%.
- 2013: Jornadas de Junho derrubam aprovação de 65% para 30%.
- 2014: reeleição apertada, sob clima de polarização.
- 2015–2016: crise econômica e inflação alta levam aprovação a menos de 15%.
- 2016: impeachment encerra governo com rejeição massiva.

Jair Bolsonaro (2019–2022)
- 2019: inicia com aprovação em torno de 35%.
- 2020: auxílio emergencial eleva apoio a 50%.
- 2021: gestão da pandemia e inflação derrubam índices.
- 2022: base fiel de 30% se mantém, apesar de rejeição majoritária.

Lula – terceiro mandato (2023–2025)
- 2023: aprovação em torno de 30–35%, com expectativa frustrada.
- 2024: dificuldades econômicas e políticas limitam ganhos.
- 2025: setembro marca recuperação — 30% no Ipec e 50,8% na AtlasIntel.

Interpretação histórica
As linhas do tempo deixam claro que a aprovação presidencial no Brasil é fortemente condicionada por três fatores: desempenho econômico, percepção da inflação e capacidade de comunicação.
- Lula (2003–2010) foi bem-sucedido porque suas políticas sociais eram sentidas no dia a dia.
- Dilma (2011–2016) fracassou ao não vincular suas ações a uma narrativa convincente, deixando espaço para a narrativa oposicionista.
- Bolsonaro (2019–2022) sustentou sua base por meio de comunicação direta, mesmo diante de indicadores negativos.
- Lula 3 (2023–2025) enfrenta o dilema clássico do campo progressista: conquistas existem, mas a percepção popular não acompanha.
Em suma: comunicar bem é tão estratégico quanto governar bem.
Por BENEDITO TADEU CÉSAR*
Benedito Tadeu César é cientista político e professor aposentado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em democracia, poder e soberania, integra a Coordenação do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito e é diretor da RED.
Ilustração da capa: Lula e as pesquisas – Imagem gerada por IA ChatGPT
Acesse a íntegra do relatório da Pesquisa Ipos-Intel de Avaliação do Governo Federal
Acesse aqui o link para baixar o relatório da Pesquisa Atlas Intel Sobre Aprovação Presidencial Latam Pulse Brasil
Tags: Lula, AtlasIntel, Ipsos-Ipec, aprovação, desaprovação, inflação, desemprego, educação, polarização, comunicação política, opinião pública, pesquisa eleitoral, economia, Dilma Rousseff, Bolsonaro




