A caça aos imigrantes na Europa

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Por CELSO JAPIASSU*

A influência de Donald Trump sobre a extrema direita internacional, especialmente sobre os partidos de teor nazifascista da Europa, tem provocado nos diversos países do continente uma forte pressão social por maior controle da imigração. A exemplo dos Estados Unidos, alguns governos criaram unidades de polícia especializada e passaram a praticar verdadeira caça a imigrantes sem documentos. Governos de países como Alemanha, França, Portugal, Itália, Países Baixos, Suécia e Dinamarca vêm endurecendo as regras, restringindo o acesso ao asilo, acelerando deportações e facilitando o repatriamento de migrantes considerados ilegais.

Foram criados controles rígidos de fronteira e medidas para dificultar que pedidos de asilo consigam proteção. Instalou-se centros de detenção em larga escala e feitos acordos para transferir migrantes aprisionados para outros países. A Itália acertou com a Albânia enviar migrantes resgatados durante a travessia do Mediterrâneo. Alemanha e França passaram a defender sanções mais rápidas e retiram benefícios de quem comete crimes ou viaja para países de origem durante a tramitação do processo de asilo.

Portugal incluiu novas restrições na Lei da Nacionalidade e notificou milhares de imigrantes irregulares para deixarem o país, afetando principalmente brasileiros e indianos.

A Dinamarca recebe pedidos de asilo só se forem feitos de fora do território europeu e reduziu direitos de reunião familiar de refugiados. Há um ambiente hostil para migrantes.

Na Suécia, com novo governo conservador, há mais pessoas deixando o país do que entrando, depois das regras mais rigorosas de combate à imigração. Na Polônia e na Hungria foram adotadas legislações que tiram o direito ao asilo de recém-chegados e reforçam o patrulhamento e controle nas fronteiras.

Endurecimento

A União Europeia cogita criar centros de regresso em países fora do bloco e acelerar a deportação de requerentes de asilo rejeitados, além de tornar mais rígidos os critérios de entrada e concessão de documentos.

A tendência é que as leis europeias se tornem cada vez mais orientadas para políticas de contenção migratória e restrição de direitos. Há na maioria dos países debates sobre o equilíbrio entre segurança, necessidades demográficas e respeito aos direitos humanos.

O único país europeu que já implementou centros de regresso fora da União Europeia foi a Itália, com seus dois centros na Albânia, resultado de um acordo bilateral entre os governos. Esses centros têm capacidade para até 3.000 pessoas a cada mês.

Diversos países já manifestaram apoio à ideia de centros de regresso em outros países, como Áustria, Bulgária, República Checa, Dinamarca, Alemanha, Grécia, Letônia e Malta, mas, além da Itália, nenhum outro país concluiu acordos concretos até agosto de 2025. França, Portugal, Espanha, Irlanda e Bélgica mostraram resistência ou dúvidas quanto à legalidade e viabilidade desses centros.

França

A ascensão eleitoral do partido União Nacional (RN), de Marine Le Pen, tornou o discurso anti-imigrante presente no debate público da França e obrigou partidos centristas e conservadores a adotarem pautas restritivas diante do receio de perderem votos.

Diversas propostas legislativas passaram a conter pontos defendidos pela extrema-direita, como o endurecimento nos critérios de naturalização, restrição de benefícios sociais e aumento das deportações.

Integrantes do governo francês passaram a adotar retórica e medidas tradicionalmente associadas à extrema-direita, aproximando a linha política oficial dos pontos defendidos por esse eleitorado, inclusive em relação à segurança e ao controle fronteiriço.

O governo francês justifica as restrições com a necessidade de proteger seus cidadãos diante das ameaças à segurança, mencionando incidentes que vincularam imigração a crimes e terrorismo.

A veiculação do slogan “ser francês é um privilégio e não uma formalidade” leva ao aumento das exigências para naturalização.

Alemanha

No ambiente político alemão, o partido Alternativa para a Alemanha (AfD), que ocupa hoje o segundo lugar nas sondagens nacionais, determinou a direção do debate, pressionando os conservadores da CDU/CSU e parte do governo a propor leis mais rígidas sobre imigração, deportação e fechamento de fronteiras.

Parlamentares conservadores retiraram a máscara e passaram a colaborar com votos de extrema-direita para aprovar moções de endurecimento migratório, mesmo diante de tensões internas e protestos sociais.

O medo de perder votos para a AfD, que tem crescido associando imigração a crise econômica e insegurança, levou partidos tradicionais a incorporar parte da agenda ultranacionalista na legislação migratória e nos discursos públicos.

O principal argumento é a limitação da capacidade dos sistemas sociais, educacionais, imobiliários e econômicos para integrar grande volume de migrantes. A restrição ao reagrupamento familiar e a facilitação de deportações são justificadas como medidas para dissuadir a imigração ilegal, aliviar o sistema público e retomar o controle estatal sobre fluxos migratórios.

Incidentes relacionados à segurança, como crimes cometidos por solicitantes de asilo, influenciam fortemente a opinião pública, o debate parlamentar e a formulação das leis.

O novo governo conservador, apoiado por grande parte da oposição de extrema-direita, sustenta que a imigração deve ser limitada para preservar a coesão social e garantir a sustentabilidade financeira dos serviços públicos.

Tanto na Alemanha quanto na França o endurecimento das políticas migratórias reflete os argumentos e a ascensão de partidos conservadores e ultradireitistas propagandeados durante as campanhas eleitorais.

Em ambos os países, como também ocorre em outros da União Europeia, a extrema-direita transformou-se de mera força de oposição a protagonista do processo legislativo, moldando as leis de imigração e influenciando o tom político, sem precisar estar formalmente no governo.


*Celso Japiassu é autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).

Foto de capa: Imigrantes são levados em barco de resgate no Mediterrâneo na costa da Itália em novembro de 2022 | SEVERINE KPOTI/AFP

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