Da REDAÇÃO
Um dos principais nomes do combate ao Primeiro Comando da Capital (PCC) no Brasil, o promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), Lincoln Gakiya, afirmou em entrevista ao jornal O Globo que a facção criminosa alcançou um nível de poder e infiltração inédito em sua história. Para ele, se nada for feito de forma coordenada, o país corre o risco de se tornar um narcoestado nas próximas décadas.
Presença em diversos setores da economia
Segundo Gakiya, o PCC deixou para trás a fase da ostentação armada e hoje atua como uma organização mafiosa, com negócios lícitos que funcionam como fachada para lavar dinheiro oriundo do tráfico internacional de drogas. Ele destacou que a facção já está presente em setores como combustíveis, fintechs, usinas de cana e comércio de veículos.
“O PCC já pode ser classificado como uma organização mafiosa. Não precisa mais da ostensividade da violência, exibindo fuzis e praticando crimes cinematográficos. Ele já passou dessa fase, está ganhando muito dinheiro, principalmente com o tráfico internacional de cocaína para a Europa. Esse dinheiro volta e precisa entrar na economia formal. (…) É mais fácil dizer em qual ramo da economia ele não está.”
Operações recentes e uso do sistema financeiro
Na última semana, uma megaoperação envolvendo o setor de combustíveis revelou a articulação do PCC com empresários e doleiros. O promotor lembrou que investigações anteriores, como a Operação Sharks, já haviam identificado o uso de fintechs para movimentar recursos da facção entre Brasil e Paraguai. Para ele, a decisão da Receita Federal de enquadrar fintechs como instituições financeiras é “fundamental” para fechar brechas usadas pelo crime organizado.
Infiltração política e corrupção
Gakiya alertou para o envolvimento do PCC em campanhas eleitorais municipais e para a infiltração da facção em órgãos públicos. Ele reconheceu que o crime organizado só consegue se manter porque conta com a proteção de agentes corrompidos, incluindo policiais, fiscais e até membros do Judiciário.
“Já tivemos, nas últimas eleições, provas de envolvimento do PCC em financiamento de campanhas de vereadores e prefeitos em São Paulo e pelo resto do país. O PCC tem todo o interesse, estando na economia formal, de participar dessa fatia do bolo, ou seja, de licitações ou dos negócios públicos.”
“Para o crime organizado manter seu negócio funcionando ele precisa de proteção, e essa proteção não é só feita pelo criminoso armado, mas por agentes públicos. Pode ser policial corrompido, pode ser fiscal, promotor, juiz.”
Defesa de uma agência antimáfia
Crítico da falta de coordenação entre Ministério Público, Polícia Federal e Receita, Gakiya defendeu a criação de uma agência antimáfia nacional, inspirada no modelo italiano. Para ele, a disputa institucional entre órgãos de investigação prejudica o combate ao crime.
“Sou a favor da criação de uma agência antimáfia. Nós já temos máfia no Brasil, o PCC já é uma organização mafiosa. Seria um órgão composto por todas as instituições e não por uma ou algumas delas. Eu defendo este modelo, com base na experiência da Itália.”
Risco de Estado paralelo
Com presença em 28 países e influência crescente nos três poderes, o PCC, segundo o promotor, avança para se consolidar como um Estado paralelo.
“Estamos em um processo de formação — claro que isso pode demorar duas, três décadas — de um Estado paralelo, de um narcoestado, se nada for feito. O crime organizado está num processo de crescimento exponencial. E ninguém sabe onde isso vai chegar se não tomarmos uma providência diferente de tudo que foi feito até agora.”
Ilustração da capa: Promotor Lincoln Gakiya – Imagem gerada por IA ChatGPT
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