Opinião
Esperança infantil
Esperança infantil
De NUBIA SILVEIRA*
Vivo estes dias que precedem o segundo turno das eleições nacional e estaduais tomada por uma vontade, por uma esperança infantil, de que o relógio ande mais rápido e os dias passem numa velocidade inimaginável. Lembro-me de quando era criança (isto há muitos anos) e queria crescer logo, ser independente, sair pelo mundo. Agora, quero que a noite de domingo chegue logo, para sabermos se teremos futuro ou não.
Imagino não estar sozinha neste sonho pueril. Ao falar com amigos e amigas, me dou conta que muitos estão neste barco do “chega logo”. Não queremos mais passar os dias tomados pela aflição e ansiedade, causadas pela certeza de que o mito tentará o possível e o impossível, o legal e o ilegal, para se manter em seu gabinete no Planalto. A cada factoide, a cada mentira e a cada ameaça propagados por ele sentimos uma agonia infindável. A pergunta que nos fazemos é sempre a mesma: o que o filhote de ditador prepara para a véspera e o dia das eleições? Quem o seguirá numa aventura golpista?
Meu amigo Carlos Bastos, jornalista político desde os anos 1950, tenta me acalmar. Diz que não há clima para golpes e que os golpes militares, como já tivemos, estão ultrapassados. Bastos está convicto de que o presidente aceitará a derrota, se ela vier e por quanto vier. Se isto acontecer, metade do Brasil – ou mais da metade – terá de seguir lutando pela consolidação da democracia, pela manutenção dos nossos direitos à saúde universal, à educação para todos, à segurança que defenda as vítimas e não os criminosos, a um prato de comida, a um teto que nos abrigue com dignidade. Por quê? Porque é evidente que o bolsonarismo seguirá – como preveem todos os analistas políticos – forte e ativo. Eles falam de um mundo que não é o nosso.
Tenho amigos e amigas que não respeitam minha decisão política e me enviam diariamente uma série de vídeos bolsonaristas. Um dos últimos que vi foi do jornalista Fernão Lara Mesquita, da família proprietária do Estadão. A certa altura ele afirma que seu pai em 1964 fez parte do contragolpe. Ao usar esta palavra dá até a impressão de que os Mesquita defendiam o governo de João Goulart. Na verdade, ele se referia a um – imaginado pela direita – plano de Jango para instalar no Brasil uma República Sindicalista.
A verdade é outra. Luiz Cláudio Cunha, jornalista reconhecido nacionalmente, conta em seu texto Máximas e mínimas: os ventos errantes da mídia na tormenta de 1964, que integra a coletânea A Ditadura de Segurança Nacional no Rio Grande do Sul 1964-1985, publicada pela Assembleia Legislativa, que o tio de Fernão, Júlio Mesquita Filho, e seu pai Ruy, foram ativos colaboradores dos governos militares.
Para não ver e ouvir coisas como estas que, além de me deixarem ansiosa, me deixam furiosa, é que tenho a esperança de deitar agora e acordar no domingo à noite com a vitória de Lula.
*Jornalista, trabalhou em jornal, TV e assessoria de imprensa, em Porto Alegre, Brasília e Florianópolis. Foi repórter, editora e secretária de redação. É coordenadora do programa Espaço Plural da RED – Rede Estação Democracia.
Imagem em Pixabay.
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