Por CASTIGAT RIDENS*
Christopher Landau, vice-secretário de Estado dos EUA, resolveu dar aulas de Direito Internacional em rede social. Com a fleuma típica da escola trumpiana de oratória – onde o berro substitui o argumento – decretou: “Nenhum juiz brasileiro ou outro tribunal estrangeiro pode anular a Primeira Emenda. Ponto final.”
Eis aí, condensada em três linhas, a confusão clássica entre soberania e imunidade, democracia e impunidade.
A Primeira Emenda como talismã
O comentário surgiu como réplica a uma postagem anônima de extrema-direita – claro, sempre atrás de avatares –, acusando o ministro Alexandre de Moraes de “ordens secretas” no X (antigo Twitter). Landau, então, insinuou que o Supremo brasileiro estaria violando a sagrada liberdade de expressão made in USA.
O problema é que sua sentença definitiva – “ponto final” – não encerra debate algum. Ao contrário: revela desprezo não apenas pelo direito internacional, mas também pela mais elementar regra da diplomacia civilizada – aquela que exige reconhecer que cada nação tem suas instituições e sua Constituição.
Liberdade ou salvo-conduto?
Convém lembrar o óbvio: nenhuma democracia sobrevive se a liberdade de expressão virar escudo para mentiras, discursos de ódio, misoginia, racismo ou apelos golpistas. Liberdade sem responsabilidade é só licença para agressão.
E aqui reside a contradição maior. O STF, com Alexandre de Moraes à frente, não usurpa poder algum quando age contra a desinformação golpista. Cumpre, simplesmente, a função elementar de qualquer corte constitucional: proteger a democracia dos que tentam destruí-la usando suas próprias brechas.
O “exemplo” norte-americano
Enquanto isso, os EUA distribuem sanções unilaterais – como a ridícula inclusão de Moraes na chamada Lei Magnitsky – sem pestanejar diante da ausência de reciprocidade. No quintal de casa, perseguem jornalistas, censuram pautas e deixam que fake news circulem como mercadoria de exportação. Mas, claro, a Primeira Emenda segue intocável, desde que sirva a seus interesses.
Entre valores e privilégios
O dilema é simples: liberdade como valor universal ou como privilégio sem controle? Democracia que se defende ou democracia de papel, vulnerável ao primeiro sopro autoritário travestido de “opinião”?
O aviso está dado: a democracia não se intimida com quem tenta sequestrar a liberdade para subvertê-la.
E, talvez, seja hora de repetir algo que Landau esqueceu nos manuais diplomáticos: solidariedade democrática não se confunde com subserviência. Exige clareza, firmeza e, sobretudo, a coragem de dizer “não” – com ponto final.
*Castigat Ridens é uma abreviação da expressão latina “Castigat ridendo mores” que significa “corrige os costumes rindo” ou “critica a sociedade pelo riso”, muito usada no contexto da comédia como instrumento de crítica social.
Ilustração da capa: Christopher Landau, vice-secretário de Governo dos EUA. Imagem gerada por IA ChatGPT sobre Foto: Wikimedia Commons
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