Da REDAÇÃO
Cobertura do The New York Times informa que o presidente Donald Trump declarou nesta segunda-feira (11/8) estado de emergência de segurança pública na capital dos Estados Unidos, Washington, D.C. A medida colocou a polícia local sob controle federal, agora comandada pela procuradora-geral dos EUA, Pam Bondi, e levou às ruas agentes do FBI e policiais federais. A Guarda Nacional também foi mobilizada, com o envio de 800 soldados.
Trump chamou a operação de “dia da libertação” da capital, dizendo que chegou a hora de “ações drásticas” para expulsar moradores de rua e prender “jovens criminosos”. Em postagens na rede Truth Social, prometeu tornar Washington “mais segura e mais bonita do que nunca”.
Na coletiva, o presidente afirmou que a cidade foi “tomada por gangues violentas e criminosos sanguinários”, bem como por “maníacos drogados e moradores de rua”. Para justificar a intervenção, exibiu um gráfico que colocava Washington no topo das taxas de homicídio mundiais, com 41 assassinatos por 100 mil habitantes — acima de cidades como Lima (7), Bogotá (11), Cidade do México (8) e Brasília (13). Em tom provocador, citou capitais latino-americanas:
“Vejam só. Bagdá… dobramos a nossa aposta em Bagdá. Cidade do Panamá, Brasília, San José, Bogotá, Cidade do México, Lima… Então, vocês querem morar em lugares assim? Acho que não”, disse Trump.
Mais tarde, a Casa Branca corrigiu o dado referente a Washington, afirmando que a taxa real em 2024 foi de 27,3 homicídios por 100 mil habitantes.
Reação local e dados oficiais
A prefeita democrata de Washington, Muriel Bowser, rebateu as alegações de Trump, dizendo que a cidade “não está passando por um aumento de crimes” e ressaltando que os crimes violentos atingiram seu nível mais baixo em mais de três décadas no ano passado.
De acordo com o Departamento de Polícia Metropolitana, os crimes violentos caíram 26% nos primeiros sete meses de 2025, após queda de 35% em 2024. A criminalidade geral também recuou 7% no período.
Ainda assim, Bowser reconheceu que a Casa Branca tem autoridade legal para assumir o comando das forças policiais na cidade — um território federal. Porém, classificou a ação como “perturbadora e sem precedentes”. Autoridades locais e grupos de direitos civis afirmam que a medida tem caráter político e não se sustenta em evidências concretas.
Trump afirmou que a operação servirá como “projeto-piloto” para mostrar que os republicanos seriam mais eficientes que os democratas na segurança pública. Ele citou nominalmente cidades como Chicago, Nova York e Los Angeles como possíveis próximos alvos de intervenção federal.
A lógica da Presidência Unitária
A decisão de Trump se conecta diretamente à teoria da Presidência Unitária, defendida de forma enfática por Dick Cheney durante sua vice-presidência no governo George W. Bush. Essa visão sustenta que o presidente é o único chefe do Poder Executivo e, portanto, detém autoridade quase ilimitada sobre todas as suas ações e agências, com pouca ou nenhuma interferência do Congresso ou do Judiciário.
Embora não seja uma doutrina oficial, a teoria ganhou força na administração Bush, especialmente após os atentados de 11 de setembro de 2001. Foi usada para justificar decisões controversas, como programas de espionagem interna sem mandado judicial, a detenção indefinida de suspeitos de terrorismo e a adoção de técnicas de interrogatório amplamente consideradas como tortura. A invasão do Iraque, em 2003, também se baseou na lógica dessa teoria — apresentada como necessária para neutralizar supostas ameaças à segurança nacional —, mas conduzida a partir de provas forjadas sobre a existência de armas de destruição em massa.
Emergência como justificativa
Um elemento central dessa teoria é o uso de crises e estados de emergência para expandir os poderes presidenciais. Nesses contextos, ações que poderiam ser vistas como ilegais ou inconstitucionais passam a ser apresentadas como necessárias à segurança nacional. É exatamente esse discurso que Trump adota agora, ao afirmar que os Estados Unidos atravessam uma “emergência nacional” — mesmo diante de dados que mostram queda significativa da criminalidade em Washington.
Essa lógica não se limita à segurança pública. Trump já utilizou raciocínio semelhante ao impor tarifas sobre importações, alegando que o país enfrentava crises econômicas ou ameaças comerciais que justificariam ações excepcionais e unilaterais. Sob o argumento de proteger a indústria e os trabalhadores americanos, adotou medidas que, para críticos, extrapolam os mecanismos tradicionais de regulação do comércio e se aproximam de uma aplicação econômica da Presidência Unitária — em que o presidente age com ampla autonomia, sem necessidade de negociação prévia com o Congresso.
Risco de concentração de poder
A ação de Trump parece não ser apenas uma medida de segurança, mas um teste de limites institucionais. Se bem-sucedida politicamente, a intervenção em Washington poderá servir de precedente para futuras operações semelhantes em outras cidades americanas, reforçando um padrão de governança alinhado à visão de Cheney — em que a autoridade do presidente cresce proporcionalmente à sensação de crise.
Quando Trump aplicou a lógica da Presidência Unitária
1. Intervenção em Washington (2025)
- Ação: Declaração de estado de emergência de segurança pública, assunção do controle da polícia local, envio de 800 soldados da Guarda Nacional e mobilização do FBI.
- Justificativa: Suposto aumento da criminalidade, apesar de dados oficiais apontarem queda nos crimes violentos e gerais.
- Crítica: Uso de discurso de crise para expandir autoridade presidencial sobre território federal.
2. Tarifas de importação como “ação de emergência” (2018–2025)
- Ação: Imposição de tarifas sobre aço, alumínio e diversos produtos importados, inclusive de aliados como Canadá, União Europeia e Brasil.
- Exemplo com o Brasil: Tarifas atualmente em 50% sobre produtos brasileiros, justificadas por Trump como medida de “segurança nacional” e proteção da indústria americana.
- Justificativa: Alegação de que o país enfrenta crise econômica e ameaça à segurança industrial.
- Crítica: Decisão unilateral, sem aprovação do Congresso, amparada na mesma lógica de exceção usada em temas de segurança pública.
3. Fechamento temporário de fronteiras (2020)
- Ação: Suspensão de voos e entrada de estrangeiros durante a pandemia de COVID-19.
- Justificativa: Proteção da saúde pública em cenário de emergência global.
- Crítica: Medidas tomadas com mínima consulta ao Legislativo e sem coordenação com autoridades locais.
4. Invasão do Iraque como modelo de ação executiva ampliada (2003)
Crítica: Provas foram forjadas; caso emblemático da aplicação da Presidência Unitária em política externa e militar poderá servir de precedente para futuras operações semelhantes em outras cidades americanas, reforçando um padrão de governança alinhado à visão de Cheney — em que a autoridade do presidente cresce proporcionalmente à sensação de crise.porcionalmente à sensação de crise.
Ação: Decisão do governo Bush, influenciada por Cheney, de invadir o Iraque.
Justificativa: Suposta existência de armas de destruição em massa.
Foto da capa: Oficial da Casa Branca por Molly Riley
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Donald Trump, Guarda Nacional, Washington, Presidência Unitária, Dick Cheney, invasão do Iraque, provas forjadas, tarifas de importação 50%, emergência nacional, intervenção federal,EUA




