Manifesto ao Presidente contra o tarifaço e em defesa da soberania e da democracia

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Por J. CARLOS DE ASSIS*

Senhor Presidente,    

Acima de qualquer outro brasileiro, V. Exa. sabe que o Brasil  passa pelo momento mais grave de sua História. Nossa soberania está sendo desafiada de forma jamais vista pelo dirigente da maior superpotência econômica e militar do planeta, com ataques ao nosso sistema econômico e interferências absolutamente injustificadas ao sistema judiciário e político brasileiros. Portanto, é uma hora de resistência.

O primeiro passo para isso consiste em nos concentrarmos no foco da defesa da soberania e da democracia. Com esse objetivo estamos convocando todos os verdadeiros patriotas e desenvolvimentistas brasileiros a realizarem encontros de emergência com vistas a uma grande  mobilização, a partir do Rio de Janeiro, com o objetivo de deixar claro às forças políticas internas e externas que não nos submeteremos a pressões de qualquer espécie para entregar o País à rapina internacional, com apoio de traidores domésticos.

Para o encontro no Rio, na quinta-feira, deveremos ter como palestrantes cinco personalidades do mundo político com inequívoco compromisso com a democracia, e os economistas Luiz Gonzaga Belluzzo e José Carlos de Assis. Um encontro amanhã, quarta-feira, no mesmo horário e lugar, reunirá lideranças da Sociedade Civil e sindicalistas, com igual propósito de referendar a data de sábado, dia 9, para a realização, especialmente no Rio, embora estendendo-se ao resto do País – nesse caso se houver tempo de convocação -, de grandes mobilizações políticas, sociais e sindicais em defesa da soberania, e contra o tarifaço.  Essas iniciativas nada têm a ver com a defesa de autoridades ou políticos em caráter pessoal, mas exclusivamente em defesa das  instituições brasileiras.

Sugerimos que V. Exa. seja convidado para a mobilização nas ruas e praças do País no dia 9. Seu carisma,  recordando os gloriosos tempos de líder sindical que ajudou a derrubar a ditadura militar, a partir das desafiadoras greves do ABC paulista em fins dos anos 1970, constitui um decisivo fator para atrair multidões de brasileiros, não necessariamente como líder de partido, e sim como representante de toda a Nação.

Entendemos que deve ser dado um caráter prático a essas mobilizações. Para isso, o Brasil tem que “inventar”, além das que já estão sendo divulgadas, soluções originais diante dos desafios econômicos gigantescos que o tarifaço de Trump representa para ele. O Governo pode, por exemplo, em acordo com estados e municípios, estabelecer um compromisso comum, temporário, de isenção tributária em todos os níveis – federal, estadual e municipal – para empresas brasileiras que perderem o mercado americano por causa do tarifaço.

Essa isenção, conforme sugerimos em artigo anterior, deve ser aplicada temporariamente até que as empresas atingidas nos Estados Unidos encontrem mercados alternativos fora de lá. Porém, a condição para que tenham acesso às isenções é que, uma vez estabilizadas suas novas relações comerciais no mundo, não voltem a vender seus produtos para o mercado manipulado por Trump, até que suas tarifas sejam reduzidas para níveis inferiores aos dos mercados alternativos que encontrarmos.

O fato é que, em seus últimos anúncios de redução tarifária, o Governo americano só baixou as tarifas que ele próprio aplicou quando em seu benefício, para favorecer a importação de bens que sua economia não produz. Se voltarmos a exportar para lá, sem que as tarifas deles sejam reduzidas para níveis inferiores às dos parceiros que eventualmente encontrarmos no mercado internacional, estaremos subsidiando a economia americana com recursos fiscais desviados do Brasil.

Provavelmente lhe dirão, Presidente, que essa sugestão é inviável, pois implica abrir mão de uma grande receita tributária e, com isso, prejudicar o equilíbrio orçamentário – ou, pelo menos, o déficit fiscal máximo de 0,25% do PIB previsto no “arcabouço fiscal”. Contudo, como mostramos no artigo “Reforma Econômica”, isso é um fetiche. O déficit fiscal com que o Brasil vem operando é inconsistente com o crescimento econômico a altas taxas, fundamental para atacarmos nossas deficiências de infraestrutura e nossas mazelas sociais. E mais inconsistente ainda quando recaírem sobre o País os efeitos financeiros devidos à acumulação dos danos provocados pelos desastres climáticos extremos.

Tomando como base a economia do euro, é perfeitamente possível manter a estabilidade monetária com um déficit fiscal de até 3% do PIB,  mesmo que este pressione proporcionalmente, por algum tempo, a demanda pública e privada. É que, se houver  correspondência dinâmica desse déficit, refletido no aumento da demanda interna e externa, com o aumento do investimento doméstico em produção de bens e serviços, mais as importações, haverá como consequência o aumento do emprego e do PIB com estabilidade da moeda.  

O maior obstáculo que temos nas atuais circunstâncias para superar pelo crescimento interno as consequências nefastas do tarifaço americano são  as taxas de juros extravagantes que temos (Selic). Mas elas podem ser drasticamente reduzidas de acordo com uma reforma monetária que também sugerimos anteriormente. Se esta acontecer, o PIB inexoravelmente vai crescer com estabilidade, por nossas estimativas, a 6% ao ano, pois ele está vinculado diretamente ao aumento da produção acrescida do internalização no mercado doméstico dos bens antes exportados por nossas empresas para os Estados Unidos.

Portanto, Presidente, não tema déficit orçamentário. Ele poderá ser a salvação do País neste momento de crise. Em valor absoluto, um déficit de 3% do PIB, como sugerimos, equivale aproximadamente a RS$ 370 bilhões de reais. Isso é mais que suficiente para que se pague a isenção tributária temporária para compensar o tarifaço de Trump sobre todas as empresas brasileiras que exportam para os Estados Unidos, notadamente as indústrias de aço e de alumínio, taxadas com as maiores tarifas.

Para essas duas indústrias, grandes consumidoras desses metais, o próprio Brasil deve ser o mercado alternativo ao americano, mediante a construção, em parceria com a China, de uma grande rede ferroviária interna já acordada, vinculada à Nova Rota da Seda. Isso cobriria uma necessidade imperiosa de nossa logística que vem desde o Governo Juscelino. Pode vir junto, totalmente interno, um grande programa de construção de casas populares, como o Minha Casa Minha Vida, também grande consumidor de aço e de alumínio.

Assim, o Brasil não está sem alternativas diante das medidas concretas de Trump contra sua economia. Onde o País corre mais risco é na área política. Por algum motivo as tarifas que foram aplicadas sobre os produtos exportados pelos nossos empresários para os Estados Unidos foram maiores que as adotadas contra outros países equivalentes, inclusive europeus. Isso indica uma determinação evidente de intenção hostil contra nós no campo político, por razões não econômicas.

Como temos visto, essa intenção é explícita, embora inegociável. Corresponde a uma intervenção direta no Judiciário brasileiro através dos ataques ao ministro Alexandre de Moraes e ao conjunto do STF, assim como de um impulso aos entreguistas do Congresso para anistiar Bolsonaro e seus cúmplices na tentativa de golpe de 8 de janeiro. Não é uma questão apenas em relação a V. Exa., portanto. São os três Poderes da República que estão sob extrema pressão de Trump.

O presidente americano já recebeu carta branca do Congresso, a seu pedido, para fazer uma guerra “híbrida” contra o Brasil. Conta com aliados internos, a partir da família Bolsonaro e do filho refugiado nos Estados Unidos, Eduardo, para dividir a sociedade brasileira entre bolsonaristas e seus adversários. É uma lástima que a sociedade ainda não se deu conta, plenamente, do fato de que isso pode levar a uma guerra civil no País sob instigação de Donald Trump e dos traidores da Pátria apoiados por ele.

É por isso que consideramos fundamental a mobilização do País contra esse ataque do exterior por parte de uma superpotência econômica e militar contra a qual não podemos lutar diretamente. Se houver, aqui, alguma brecha que poderá ocupar para alargar seu campo de penetração nos negócios brasileiros, até mesmo a guerra, Trump a ocupará. Por enquanto, essa brecha é a família Bolsonaro, ainda contida. Se for ampliada muito, acabaremos sangrando.

O desafio estratégico, portanto, é evitar que se amplie muito o espaço de penetração no Brasil das forças comandadas pelo presidente americano. É para isso, insistimos, que temos de demonstrar uma união das correntes progressistas, espelhada na irresistível campanha das Diretas Já, que derrubou o regime militar. Como naquela época, trata-se de uma campanha que não pode ter dono. Seu dono é o dono da própria soberania, que é o povo brasileiro.


*J. Carlos de Assis é jornalista, economista, doutor em Engenharia de Produção, professor aposentado de Economia Política da UEPB, e atualmente economista chefe do Grupo Videirainvest-Agroviva e editor chefe do jornal online “Tribuna da Imprensa”, a ser relançado brevemente.

Foto de capa: Roosevelt Cassio/Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos

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