Estatísticas da barbárie

translate

WhatsApp Image 2025-07-28 at 13.22.57

Por CELSO JAPIASSU*

O escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime calcula que o valor do tráfico de pessoas no mundo ultrapassa os 30 bilhões de dólares por ano. As vítimas são na maioria mulheres usadas para exploração sexual, trabalho escravo ou para a extração ou comércio de órgãos e tecidos. Na busca de uma vida melhor, homens, mulheres e crianças são iludidos ou coagidos a se deslocarem para longe de casa e acabam submetidos à escravidão.

Os países da União Europeia registraram no ano passado cerca de 20 mil pessoas que foram vítimas desse tráfico e as estatísticas dizem que 72 por cento são mulheres e meninas. As crianças representam um quarto de todas as vítimas contadas, das quais mais da metade foi alvo de tráfico para exploração sexual. O restante representa os que foram usados para a remoção de órgãos ou foram obrigados a trabalho forçado como a servidão doméstica ou para mendigarem nas ruas.

O tráfico de drogas, armas e de seres humanos são as três maiores fontes de lucros do crime organizado. O tráfico humano é um dos mais lucrativos e cerca de 2,5 milhões de pessoas são vítimas anualmente.

O aumento do tráfico de seres humanos tem aumentado a cada ano. No ano passado o crescimento foi de 25 por cento em comparação com o ano anterior, mas o tráfico para a escravidão aumentou 47 por cento. É a modalidade que mais tem crescido, no universo do crime.

O tráfico de crianças também aumenta. Cresceu em 31 por cento. Desse número quase a metade das vítimas são meninas. Essas estatísticas ressaltam a extrema vulnerabilidade das crianças, que são exploradas para fins sexuais ou para trabalho forçado. Mulheres e meninas continuam a ser as principais vítimas.

Fraudes e escravidão

Uma tendência emergente e preocupante é o aumento do tráfico para criminalidade forçada, incluindo fraudes online. Esta modalidade, que representava apenas 1% do total de vítimas detectadas em 2016, saltou para 8% em 2022, demonstrando a adaptação dos criminosos às novas tecnologias e à exploração de vulnerabilidades digitais. A pobreza, os conflitos e as mudanças climáticas são fatores que exacerbam a vulnerabilidade das populações, criando um ambiente propício para a ação dos criminosos. Os números devem ser bem maiores dada a subnotificação e a dificuldade de identificação pelas autoridades.

A modalidade mais reconhecida e mais comum é o tráfico de mulheres e meninas para exploração sexual. As vítimas são forçadas à prostituição, pornografia ou outras atividades sexuais comerciais, diz o relatório da UNODC de 2024.

A imposição de trabalho sob ameaça de punição caracteriza o trabalho forçado. Inclui a servidão por dívida, quando a pessoa é forçada a trabalhar para pagar uma dívida e o trabalho infantil, em que as crianças são exploradas em condições degradantes. Tem crescido quase 50 por cento a cada ano, dizem as estatísticas.

Uma das formas mais hedionda de tráfico – para extração e venda de órgãos – também tem acusado crescimento. Aproveita-se da vulnerabilidade de pessoas em situações desesperadoras

No tráfico para a servidão doméstica as vítimas são forçadas a trabalhar em residências privadas, muitas vezes em condições de isolamento, com jornadas exaustivas, salários irrisórios ou inexistentes, e frequentemente sofrendo abusos físicos e psicológicos. A natureza privada e isolada deste tipo de exploração torna-a particularmente difícil de detectar.

Outro tipo de tráfico em que são vítimas mulheres e meninas tem como finalidade o casamento forçado, o que pode levar à exploração sexual, trabalho forçado ou servidão doméstica, sob o disfarce de uma união legal.

As causas

A falta de oportunidades e a necessidade de sustento levam à aceitação de ofertas de trabalho ou melhores condições de vida. São as armadilhas do tráfico.

Situações de guerra, violência e deslocamento forçado criam grande número de refugiados e migrantes extremamente vulneráveis ao tráfico devido à situação de desespero, falta de documentação e redes de apoio. Eventos climáticos extremos podem destruir comunidades e meios de subsistência, forçando as pessoas a se deslocarem e as tornando presas fáceis para traficantes que prometem ajuda ou novas oportunidades.

A proliferação de redes sociais e plataformas online tem sido explorada por traficantes para recrutar e controlar vítimas, muitas vezes através de falsas promessas de emprego, relacionamentos ou oportunidades. A natureza anônima da internet facilita a ação dos criminosos e dificulta a detecção.

Grupos marginalizados, minorias étnicas, pessoas LGBTQIA+ e indivíduos com deficiência são frequentemente alvos de traficantes devido à sua posição social e à falta de proteção legal e social. A desigualdade de gênero torna mulheres e meninas desproporcionalmente vulneráveis à exploração sexual.

Há pouco, neste mês de julho de 2025, a polícia espanhola libertou mais de 160 mulheres de origem sul-americana, vítimas de uma organização que as explorava sexualmente em regime de semiescravidão em bordéis disfarçados de casas de massagem. Foram presas 37 pessoas em Madrid, Valência, Murcia, Alicante e Castellón.

As piores regiões

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela que pela pobreza e por falta de trabalho digno a região da Ásia e Pacífico concentra o maior número de vítimas de trabalho forçado e casamentos, com quase 30 milhões de pessoas exploradas. Mas são os Estado Árabes que apresentam a taxa proporcionalmente mais elevada. O alto percentual está associado à exploração de trabalhadores migrantes, que constituem a maior parte da força de trabalho em muitos países da região e são frequentemente submetidos a condições de trabalho análogas à escravidão.

Os piores países

O Índice Global de Crime Organizado, que avalia a criminalidade e a resiliência ao crime em 193 países, identificou os seguintes como os cinco com pior pontuação em relação ao tráfico de pessoas:

Líbia: A instabilidade política e a guerra civil desde 2014 criaram um ambiente propício para a atuação de grupos armados e criminosos, que exploram migrantes, refugiados e requerentes de asilo em tráfico sexual e de trabalho.

Eritreia: O país é acusado de promover trabalho forçado através do serviço militar obrigatório, que pode durar indefinidamente e submeter os cidadãos a condições de exploração.

 Iêmen: A guerra civil e a crise humanitária no país aumentaram drasticamente a vulnerabilidade da população ao tráfico, tanto para exploração interna quanto para o exterior.

Emirados Árabes Unidos: Apesar de sua riqueza, o país é criticado pela exploração de trabalhadores migrantes, que representam 90% da força de trabalho e são frequentemente submetidos a condições de trabalho forçado, com retenção de passaportes e falta de pagamento de salários.

Turquemenistão: O governo é acusado de impor trabalho forçado na colheita de algodão, uma prática que afeta milhares de cidadãos anualmente.


*Celso Japiassu é autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).

Foto de capa: IA

Receba as novidades no seu email

* indica obrigatório

Intuit Mailchimp

Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaoportalred@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia..

Gostou do texto? Tem críticas, correções ou complementações a fazer? Quer elogiar?

Deixe aqui o seu comentário.

Os comentários não representam a opinião da RED. A responsabilidade é do comentador.

Respostas de 2

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

plugins premium WordPress

Gostou do Conteúdo?

Considere apoiar o trabalho da RED para que possamos continuar produzindo

Toda ajuda é bem vinda! Faça uma contribuição única ou doe um valor mensalmente

Informação, Análise e Diálogo no Campo Democrático

Faça Parte do Nosso Grupo de Whatsapp

Fique por dentro das notícias e do debate democrático