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A Revolução que não espera.
A Revolução que não espera.
Por LINCOLN PENNA*
O primeiro quarto do século em que vivemos está próximo de se encerrar. Ele coloca em pauta para a humanidade mais do que uma advertência, pois, na verdade é mais do que isso, é uma sentença: ou o ser humano através das autoridades governamentais à frente dos poderes de decisão acorda para a intensa regularidade dos eventos extremos, que vêm se abatendo em nosso universo ambiental, ou corremos o sério risco de que novas catástrofes tragam tragédias muito maiores.
Diante desse diagnóstico sombrio não há medidas paliativas que possam minimizar as novas e sucessivas ocorrências climáticas. Essa realidade coloca na ordem do dia a necessidade de uma revolução ambiental. Esse alerta pude expressar no livro que publiquei intitulado “Brasil Século XXI. Na expectativa da revolução social e ambiental”, editado pela editora E-papers. Deixara claro, então, e aqui reitero que qualquer mudança significativa nas estruturas sociais só terá consequência positiva se operarmos uma revolução na nossa relação com a natureza.
Para que essa dupla revolução conjugada, a do social com o ambiental, possa vir a acontecer é imprescindível que se tome consciência de que o modo de produção existente, isto é, o capitalismo seja removido. Como fazê-lo? Eis a questão em aberto para que entendamos os danos dele decorrente. Pôr fim a exploração desenfreada dos recursos humanos e naturais empregados para impulsionar essa economia, que só favorece os rentistas, exige uma firme e forte determinação fundada na consciência da necessidade de se prover com justiça social e preservação ambiental um novo mundo.
Essa tarefa pressupõe a construção de uma consciência ampliada e socializada para a construção de um consenso fundado na racionalidade e no compromisso com a vida humana. Afinal, não se trata de um projeto revolucionário calcado exclusivamente numa única vertente ideológica. Trata-se de uma emergência que os tempos em que vivemos está impondo e que, por isso mesmo, exige pronta resposta. E não pode ser outro senão a de se promover uma revolução no que concerne a nossa relação com a natureza profundamente errática até aqui.
É preocupante que se constate uma evidente contradição entre tantas demandas para que se promova mudanças substanciais em nossas vidas visando a melhoria de nossas condições de existência, e não se discuta mais projetos alternativo diante do acúmulo de mazelas que nos cercam. Mais do que em décadas muito anteriores hoje em dia em face de tantos problemas que nos afligem predomina o silêncio obsequioso em espaços onde era comum e pertinente que as questões que diziam respeito às nossas vidas fossem discutidas e elencadas, ainda que nem sempre equacionadas. A julgar o que se passa nas universidades, voltadas para si mesmas, salvo os casos de efetivo engajamento, que não obstante só reforçam a regra geral.
O pouco caso com o que se passa no mundo atual a naturalizar desde as figuras desprezíveis de falsos líderes, supostos defensores do povo, até o advento de guerras ainda localizadas acompanhadas como se não tivéssemos nada a ver com os seus efeitos devastadores. São alguns exemplos do descompromisso que manifestamos com os outros, nossos semelhantes. E não estou a mencionar o que se passa em nossas metrópoles plenas de gente desprovida de dignidade e olhada com o desprezo pelos que demonstram apenas indiferença pela vida alheia.
Em paralelo, cresce em ritmo veloz a destruição de biomas, como os que ainda resistem à devastação dos gananciosos predadores a serviço de grossos interesses privados, assim como o abandono de seres humanos a coexistirem com a concentração de renda por parte de muito poucos, de modo a provocar um inevitável cenário de destruição das reservas naturais e, em paralelo, a massificação da exclusão social. É com o agravamento da deterioração da situação social e ambiental que se radicalizam as soluções.
É preciso chegar a esse ponto para que comecemos a despertar, e quem sabe já tarde demais. De um lado, o recurso das classes dominantes e altamente favorecidas a lançar mão de expedientes que venham a favorecê-las com base em lideranças bonapartistas, aparentemente em apoio às massas, mas no fundo reforçando as estruturas vigentes; e, de outro, a imperiosa necessidade de pôr fim ao modo pelo qual tem sido gerido essa relação entre a humanidade e o meio-ambiente continuamente fustigado por quem exerce o poder econômico que toca as relações internacionais. No primeiro caso, trata-se de um nível mais agudo das lutas de classes. No que diz respeito à questão ambiental essa querela também se faz presente, porque essas mesmas classes que detém o poder são negacionistas em relação à questão do meio-ambiente.
A revolução do século XXI terá de ter uma primazia: a de salvar o ambiente que é representado pelo planeta Terra, a nossa casa, sem se descuidar das forças sociais que têm plena consciência de que não basta criar um poder popular desvinculado da questão ambiental, pois se assim proceder irá com certeza reproduzir por meio de outros mecanismos e objetivos os mesmos problemas com que convivemos.
Assim, para as forças sociais que compreendem a emergência das iniciativas para debelar as ameaças que rondam as nossas vidas se não tomarmos decisões acertadas, diante da lógica que nos governa presentemente, essas forças sociais devem se concentrar na denúncia dos males que provocam o poder do capital. Por parte das classes subalterna a ciência e o uso da argumentação inteligente e bem argumentada e difundida é uma arma poderosa para arrebanhar as massas que não enxergam o amanhã, Àqueles que sonegam conhecimentos sobre o estado em que nos encontramos cabe combatê-los com base na informação fundamentada do que se passa no mundo. É aí que entra o papel da educação, responsável pela formação de cidadania, um quesito que tenho insistido quando se evoca a importância do processo educacional em todos osń níveis.
*Doutor em História Social; Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON); Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos).
Foto: Freapik
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