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Eleições 2024: o “centro” de negócios e a direita avançam e a esquerda encolhe

Eleições 2024: o “centro” de negócios e a direita avançam e a esquerda encolhe

Artigo por RED
09/10/2024 11:00 • Atualizado em 08/10/2024 22:06
Eleições 2024: o “centro” de negócios e a direita avançam e a esquerda encolhe

Por BENEDITO TADEU CÉSAR*

Os grandes vencedores das eleições deste domingo “em todo o Brasil foram os partidos e candidatos ditos de “centro” ou, sendo mais precisos, aqueles que se apresentam como “isentos de ideologias” e congregam políticos mais comprometidos com os “negócios” e as “oportunidades” do mundo político do que com qualquer convicção doutrinária.

Ainda que se apresentem como “não ideológicos”, esses partidos e candidatos inclinam-se, quase sempre, para a direita e flertam, muitas vezes, com a extrema-direita, mas, a rigor, ficam onde estão as “melhores ofertas” que, hoje, estão à direita do espectro partidário, no comando dos orçamentos públicos.

Depois deles, os grandes vitoriosos foram os partidos e candidatos de extrema direita, que se apresentam em geral com a bandeira da antipolítica, e aparentemente negando todas as ideologias, ou afirmando-se com orgulho como os candidatos da direita “verdadeira”. Em ambas as posições, são os representantes do autoritarismo, da repressão e da intolerância política.

As esquerdas e seus candidatos ficaram por último, não obstante os pequenos crescimentos das Prefeituras conquistadas pelo PSB e o PT. O primeiro, passou de 258 para 311 Prefeituras, com um crescimento de 21%, e o segundo saiu de 183 e chegou a 251, com um crescimento de 37%, evidenciando uma pequena reação ao desmonte provocado pela Operação Lava-Jato e a perseguição a que foram submetidas as suas lideranças, militantes e até simpatizantes nas eleições de 2016 e 2020.

Ao lado do desempenho acanhado do PT, a vitória do PSDB em apenas 273 Prefeituras, numa queda de 49% frente à eleição de 2020, explicita outra consequência importante destas eleições: o claro desmonte do sistema de concorrência partidária vigente até 2014, no qual PT e PSDB disputavam votos e se revezavam na preferência dos eleitores no plano federal, o que se refletia nos planos estaduais e municipais, ainda que em menor escala. Este sistema foi sepultado.

Veja abaixo a evolução dos 11 partidos com mais Prefeituras neste primeiro turno, em comparação a 2020, calculada segundo os dados oficiais do TSE:

– PSD: de 662 para 888, — aumento de 34%;
– MDB: de 797 para 865 — aumento de 7%;
– PP: de 701 para 752 — aumento de 7%;
– União Brasil: de 568 para 589 — aumento de 3%;
– PL: de 349 para 523 — aumento de 50%;
– Republicanos: de 216 para 439 — aumento de 103%;
– PSB: de 258 para 311 — aumento de 21%;
– PSDB: de 531 para 273 — queda de 49;
– PT: de 183 para 251 — aumento de 37%;
– PDT: de 318 para 150 — queda de 53%;
– Avante: de 81 para 136 — aumento de 67%;

Para comprovar o crescimento do “centro de negócios” e da direita tradicional, façamos uma conta simples. Somados, PSD (888) e MDB (865), posicionados no “centro”, conquistaram 1753 Prefeituras das 5.569 existentes no país (excetuando-se o Distrito Federal e Fernando de Noronha, que não realizam eleições municipais). PP (752) e União (589), conformando a direita tradicional, conquistaram 1.341 Prefeituras. Juntos, conquistaram 55,5% dos municípios brasileiros.

À esquerda do espectro ideológico partidário, PSB (312), PT (253), PDT (151), PCdoB (19), PV (14) e Rede (4), somados, conquistaram 753 Prefeituras, o que significa 13,5% dos municípios brasileiros, 24,5% das Prefeituras obtidas pelo “centro” e a direita tradicional, e, de maneira ainda mais contundente, menos 135 do total de municípios que o PSD, considerado isoladamente, conquistou.

Na outra ponta, o PL do ex-Presidente Bolsonaro, que lidera os partidos de extrema-direita, saiu extremamente fortalecido. Ainda que não tenha atingido os 1.500 municípios a que tinha se proposto, ficando com apenas 1/3 da meta estabelecida, o PL elegeu sozinho, até aqui, 523 Prefeituras (e disputa o segundo turno em outros 23 grandes municípios). Comparativamente ao PT do atual Presidente Lula, que lidera os partidos de esquerda e centro-esquerda (e que disputa o segundo turno em apenas 13 municípios), o PL saiu vitorioso com o dobro de Prefeituras conquistadas.

O que teria levado a essa situação?

O cansaço e a insatisfação com a política e com os políticos e também com o Estado, amplamente desacreditados pelos grandes meios de comunicação desde a operação Lava Jato e considerados incapazes de responder às demandas sociais acumuladas, criaram as condições para o fortalecimento dos partidos e políticos “de negócios”, distribuidores de recursos para obras em suas bases políticas, os quais já vinham crescendo desde as eleições de 2016 e 2020 e que agora conseguiram seus melhores resultados.

Para a distribuição de recursos aos municípios e aos cabos eleitorais de sua base, além dos vultuosos recursos do Fundo Partidário, que é repartido proporcionalmente ao número de parlamentares de cada partido, os partidos de “negócios” e a direita tradicional, que mais cresceram nestas eleições, contaram com o avanço sobre o orçamento público federal realizado pelos partidos e políticos integrantes do chamado “Centrão” na Câmara Federal e no Senado da República durante o governo Bolsonaro, com a criação do “Orçamento Secreto” e das “Emendas Pix”, que garantiu polpudos repasses de verbas para os municípios “da base” desses políticos e um imenso volume de recursos para suas campanhas eleitorais e as de seus apoiadores.

Em minoria no Congresso Nacional, com os partidos integrante de sua base política fiel detendo apenas cerca de 1/3 das cadeiras na Câmara e pouco mais de 1/5 no Senado, o governo Lula não teve forças para reverter esse quadro e o controle dos recursos orçamentários e suas benesses continua sob o controle do conjunto do “centro” de negócios, da direita tradicional e da extrema direita.

O cenário geral de cansaço com a política deu espaço para o surgimento e o crescimento de candidatos como Pablo Marçal ou Alexandre Ramagem, que se assumem como “idiotas políticos” (autodefinição assumida por Ramagem) e que canalizam os votos daqueles que consideram a política, o Estado e o conjunto de suas instituições como desprezíveis. Se a política é a expressão e a prática da escória social, por que não votar logo no pior dos políticos, que se apresenta como o antipolítico?

Aparentemente de forma contraditória, os três grandes vencedores pessoais nestas eleições foram, de um lado, Pablo Marçal, em São Paulo, e Eduardo Paes, na cidade do Rio de Janeiro e João Campos, em Recife.

Se o primeiro, como foi dito acima, sintetizou a idiotia extremada dos que desacreditam a tal ponto da política, das instituições públicas e do Estado, que decidiram escolher o pior dentre todos os candidatos possíveis, os segundos sintetizaram a percepção de que a única maneira de enfrentar e vencer o desencanto que gera a idiotia política e possibilita o crescimento dos políticos que visam “oportunidades e negócios”, e dos fascistas, que se alimentam de ressentimentos e ódios, é a construção de frentes tão amplas a ponto de agregar a esquerda, o centro e até mesmo setores da direita democrática.

Marçal, ainda que tenha sido eliminado no primeiro turno, pautou a eleição na cidade de São Paulo e foi notícia em todo o país e, com isso, tendo saído do nada, construiu um capital político que lhe garantirá força para influir no espaço político e que lhe renderá frutos eleitorais em eleições futuras.

João Campos e Eduardo Paes, capitaneando frentes amplas que agregaram partidos tão díspares quanto PSB / PC do B / PT / PV / UNIÃO / REPUBLICANOS / MDB / SOLIDARIEDADE / AVANTE / DC / AGIR / PMB, por parte de Campos, e PODE / PRD / DC / AGIR / SOLIDARIEDADE / AVANTE / PSB / PDT / PC do B / PT / PV / PSD, por parte de Paes. Ambos venceram a eleição no primeiro turno, sendo que Paes o fez no berço político de Bolsonaro, conquistando 60,47% dos votos válidos e, mesmo que o seu adversário de extrema direita tenha conseguido afirmar a força eleitoral bolsonarista, obtendo 30,81% dos votos, lhe impôs uma fragorosa e humilhante derrota.

*Benedito Tadeu César é cientista político, professor universitário e integrante das coordenações do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito e da RED Rede Estação Democracia

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

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