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A Constituição prevê que a propriedade tem função social
A Constituição prevê que a propriedade tem função social
Por LUIZ ALBERTO DE VARGAS
Assim, na forma da lei, pode se configurar a responsabilidade dos proprietários de imóveis pelos danos ambientais que derem causa, como pode ser tipicamente a propagação de incêndios que, iniciados em na área da propriedade, por culpa ou dolo do proprietário, prejudiquem terceiros.
Assim, se a casa do vizinho ou a pracinha da comunidade forem atingidos porque o vizinho resolveu, no fim de semana, queimar o lixo no quintal, a Justiça não tem dúvidas de que o descuidado vizinho será penalizado, civilmente e até criminalmente, se for o caso. Aqui, em qualquer lugar do mundo minimamente civilizado. Tente “queimar folhas do quintal de sua propriedade” nos Estados Unidos e quase imediatamente ouvirá o característico som do carro de bombeiros chamado por vizinhos escandalizados pela falta de responsabilidade comunitária e ambiental de quem não sabe que, até mesmo no país mais capitalista do mundo, a propriedade tem limites e não pode ser exercida de modo abusivo pondo em risco os demais.
O que assistimos no Brasil nos dias de hoje é surreal: o país está literalmente pegando fogo, as matas estão sendo destruídas, os prejuízos materiais são enormes, o comprometimento ambiental é incalculável, os efeitos sobre a saúde da população pela poluição atmosférica causada pelos incêndios preocupam os especialistas.
O fogo se espalha assustadoramente e a fumaça parece ter obliterado a vista dos governantes.
Todos perguntamos: quem colocou fogo no país? Quem vai pagar pelo maior crime ambiental de nossa história do país? E, principalmente, como vamos garantir que isso não aconteça de novo no ano que vem?
Já alguns anos, ouvimos dos mesmos proprietários rurais que agora negam qualquer responsabilidade na crise ambiental a afirmação arrogante que têm direito a dispor livremente de sua propriedade (“se é meu, posso fazer disso o que eu quiser”); que as leis ambientais são um peso burocrático que atrasa o agronegócio e o progresso do país; que os alertas ambientais são exagerados, quando não suspeitos de beneficiar interesses estrangeiros; que as queimadas são uma forma tradicional e eficiente de manejo e não oferecem qualquer risco.
Há dois anos, não assistimos, nas redes sociais do centro-oeste, uma campanha de incentivo às queimadas, chegando-se ao cúmulo de se propor um “mês do fogo”, como uma forma de resistência dos proprietários do agronegócio contra as multas da fiscalização ambiental?
E, principalmente, podemos deixar escondido na fumaça que arde em nossos olhos a responsabilidade dos políticos que, mais do que se omitir, entusiasticamente apoiaram um “modelo de negócios” baseado na destruição das matas nativas e sua substituição pela pastagem para o gado e pela soja, criando um passivo ambiental que já está sendo pago por todos nós, como mostram as enchentes no Rio Grande do Sul e as secas no resto do país?
Um modelo de negócios destrutivo do futuro que, no presente, não faz mais do que enriquecer poucos proprietários e causar imensos prejuízos aos seus concidadãos.
Chame-se isso de qualquer coisa, menos de capitalismo, modernidade, liberalismo ou progresso.
O que vemos é o avesso do Estado de Direito. É, sim, o caos instalado por uma minoria de irresponsáveis.
É a farra dos proprietários.
*Desembargador do Trabalho na TRT 4
Foto: Divulgação ALEP/PR
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