?>

Destaque

A resistência de um documentarista

A resistência de um documentarista

Artigo por RED
18/09/2024 18:00 • Atualizado em 18/09/2024 10:28
A resistência de um documentarista

Por LÉA MARIA AARÃO REIS*

Ato de Resistência – a luta dos blogueiros progressistas, que para muitos é conhecido como Ato de Resistência – um filme proletário, é um média-metragem de 45 minutos, do cineasta carioca Silvio Tendler, recordista de bilheteria de documentários nacionais. O trabalho de Silvio está especialmente em foco este mês, pela seleção que fez de filmes exibidos no Projeto Memória, Coração do Futuro, que se estende até o dia 11 de novembro, na Fundação Casa Rui Barbosa, no Rio de Janeiro, com trabalhos relacionados aos 60 anos do golpe civil-militar.

E mais: porque é oportuna também a próxima estreia do seu recente e aguardado Brizola, Anotações para Uma História, uma nova abordagem política do líder gaúcho, no próximo Festival do Rio 2024, de 3 a 13 de outubro. E porque são cada vez mais incisivos e urgentes os debates sobre a necessidade de uma internet gratuita, como mostram os entrevistados em Ato de Resistência. Essa batalha de ideias vem dos jornalistas do grupo Blogueiros Progressistas, reunidos em 2022, na cidade de Maricá, auditório do Cine Henfil, para o 7º Encontro Nacional de Comunicadores e Ativistas Digitais, e filmados por Tendler.

Com roteiro e montagem de Patrícia Granja e Fabiano Skinner, produção de Ana Rosa Tendler e argumento do diretor, os blogueiros — que, dois anos depois do 7º Encontro, vêm se organizando em pequenas e médias empresas de notícias — discutiram sobre:

  • A necessidade de contraponto cada vez mais enérgico e rápido contra a desinformação e manipulação das notícias por parte do movimento dos blogueiros progressistas, o Blogprog, nascido em 2010 para lutar com o infame “partido da imprensa golpista”, o PIG, assim batizado pelo saudoso jornalista Paulo Henrique Amorim.
  • A campanha em favor de Julian Assange Livre, que desde 2019 se encontrava preso.
  • A resistência às bigtechs e o fato de seis entre dez biomilionários, no mundo, pertencerem ao grupo de proprietários de empresas da indústria da comunicação, como é lembrado no filme. (Hoje, dois anos depois, assistimos à crescente e esmagadora influência desses bilionários da comunicação e da área da indústria militar internacional, nos períodos de eleições, como agora, e na vida democrática dos países ocidentais).
  • O combate ferrenho às fake news e desmistificação da propagada ideia de que a repetição de uma mentira se torna verdade depois de algum tempo, como rezam as teorias da cognição.
  • A necessidade dos blogs se organizarem em redes. “Informação na veia”, como dizia o jornalista Paulo Henrique Amorim, e uma ação coletiva e profissional para além da rebeldia pessoal.
  • Financiamentos de blogs, verbas governamentais, treinamento de profissionais para o jornalismo digital, uso de laptops e de todas as tecnologias gratuitas, aprendizado de entrevistas realizadas através de celulares, etc.

Em entrevista ao site de Eleonora de Lucena e Rodolfo Lucena, a dupla gaúcha do Tutaméia, Silvio comentou sobre a sua inspiração para Ato de Resistência. Quando visitou o presidente Lula em sua prisão, em Curitiba, levou seu filme Dedo na Ferida para estrear na Sala Lula Livre, uma área do Espaço de Formação Marielle Franco montado pelo MST, em terreno próximo à Vigília Lula Livre. Então, decidiu que o filme seria “uma espécie de manual da resistência”.

Cinema de resistência é o que Tendler faz. “Meus filmes são um grande quebra-cabeças onde eu vou juntando caquinhos, pecinhas. Ora têm cara de labirinto, como o filme sobre o Glauber, ora cara de caleidoscópio, que é a cara do Utopia e Barbárie. Todos formam um grande e único filme, mas percebo que eles dialogam entre si e compõem uma grande viagem.”

Uma das batalhas de Silvio é contestar a forma de exibição de filmes: “Os cinemas mudaram para dentro dos shoppings. E isso mudou a natureza do espetáculo, mudou a demanda de consumo. Acabou o espaço para os filmes da gente que hoje sobrevivem em pequenas salas, uma sessão por dia, para setenta espectadores. O nosso cinema está sendo assassinado. E aí então vem a resistência.”

Resistência que ainda vai muito longe apesar da espera pela regulamentação das bigtechs, que é urgente e imprescindível. E vale lembrar: existem as plataformas gratuitas, os projetos dos movimentos populares, dos grupos organizados das periferias. Os cursos, os eventos gratuitos, debates programados, as sessões promovidas em escolas e em universidades, e não apenas o cinema online, mas os filmes on life que reproduzem, sem ficção, a vida real das populações. Como os docs do Silvio e dos seus combativos e resistentes colegas.

***

*Em tempo: O 28º Encontro Nacional de Comunicadores e Ativistas Digitais (Blogprog.com.br) foi realizado em julho passado, no Sindicato de Jornalistas de São Paulo. Em Ato de Resistência (exibição no FatoFlix), alguns dos entrevistados, entre outros, são os jornalistas Altamiro Borges, do Centro de Estudos Barão de Itararé, Anderson Moraes, Rodrigo Vianna, Renato Rovai, Luiz Carlos Azenha e Letícia Sallorenzo.

*Léa Maria Aarão Reis é jornalista

Ilustração: Divulgação

Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

Toque novamente para sair.