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Opinião

A tecnologia precisa da fé para não criar monstros

A tecnologia precisa da fé para não criar monstros

Artigo por RED
05/11/2023 05:30 • Atualizado em 06/11/2023 14:21
A tecnologia precisa da fé para não criar monstros

De EDELBERTO BEHS*

O foco da imprensa internacional de momento é, sem margem de dúvida, a guerra na Ucrânia e o conflito israelense na Faixa de Gaza. Mas há, pelo menos, outra dezena de confrontos, como os conflitos na Síria, no Iêmen, na República Democrática do Congo, Afeganistão, Mianmar, Haiti, alguns mais recentes, outros completando uma década.

A guerra é a “normalidade” vivida pela espécie humana no decorrer da sua trajetória. Estima-se que em mais de 3 mil anos de história, o mundo teve apenas 268 anos sem guerras. Hoje, a guerra é um bom negócio. Tanto no “empreendimento” destrutivo, com bombas, tanques, aviões, drones, quanto na reconstrução do que foi destruído.

No livro “Revolução dentro da paz”, de 1968, o bispo de Olinda e Recife dom Hélder Câmara alertava: “É preciso que a Humanidade acabe prescrevendo as guerras como absurdos e o subdesenvolvimento como indigno do homem no liminar do século XXI”. E perguntava: “Até quando a Humanidade será tão bárbara para ter como critério de razão a capacidade maior ou menor de destruir?”

A humanidade ingressou no século XXI admirada com os avanços da ciência, da tecnologia. Olhando para o futuro, dom Hélder dizia: “Cedo descobrirá o homem, que já começou a viver o século XXI, que a ciência não esgota a realidade humana”. Ele esperava, então, que “depois de tanta maravilha que anda realizando, a humanidade não se divida em blocos, não se arme como nunca, não brinque com forças que amanhã poderão arrasar a terra”.

E a humanidade, em pleno 2023, está diante dessa possibilidade de terra arrasada porque xerifes do mundo brigam por mais poder, mais recursos, mais… mais… que, basta apertar alguns botões e o que for mais deixará de existir, com tudo o que há nesse planeta. 

De novo o bispo: “Por mais que o homem avance na ciência e na técnica, enquanto houver guerras no mundo daremos um triste atestado de falta de amadurecimento espiritual. Enquanto o teste, para demonstrar que a razão está com uma das partes, for demonstrar maior potência destruidora, nós todos, educadores, teremos que reconhecer o nosso fracasso”.

O homem, entendia dom Hélder, é “um sócio de Deus”, mas a tecnologia que ele desenvolver “precisa da fé para não criar monstros”…


Conflito na RD Congo leva mais de 1 milhão a buscar refúgio em países vizinhos

Um dos muitos locais para deslocados internos que surgiram em Kivu do Norte, onde 1,2 milhão de pessoas foram forçadas a fugir de suas casas desde março de 2022.

2 Agosto 2023 NU

Comandante da Missão de Estabilização da ONU no país, General Otávio de Miranda Filho, destaca difícil situação dos deslocados internos e a falta de recursos para atender às necessidades básicas da população afetada pelo conflito; risco de mais deslocamentos é alto, pois conflito continua afetando diversas áreas do país.

A violência na República Democrática do Congo, RD Congo, vem forçando pessoas a buscar abrigo em países vizinhos. Segundo o Escritório da ONU para Refugiados, Acnur, mais de 1 milhão de congoleses são refugiados e requerentes de asilo.

O Acnur afirma que a vizinha República do Congo abriga um total de 61,2 mil refugiados e solicitantes de asilo, quase metade dos quais vem da RD Congo.

Deslocados internos

Em entrevista à ONU News, em julho, o general Otávio de Miranda Filho, comandante da Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo, Monusco, ressaltou as dificuldades que presenciou em um campo de deslocados internos próximo a cidade de Goma. A falta de recurso também foi testemunhada pelo general brasileiro. Segundo ele, a situação dos deslocados na RD Congo trouxe uma reflexão sobre os “objetivos da missão de paz”

Soldados da paz do Malawi servindo na Brigada de Intervenção da Força da Missão de Estabilização da Organização das Nações Unidas na República Democrática do Congo

“Uma coisa que marcou muito a nós brasileiros foi quando nós estivemos em um uma base temporária e ao lado dela nós temos um dos maiores campo de deslocados internos. São mais de 70 mil homens, mulheres e muitas crianças que vivem ali. 

Então, quando nosso helicóptero se aproximou para pousar e você vê de cima aquela quantidade de pessoas numa condição assim extremamente difícil, não tem como você não ficar tocado pelo que você vê e não tem como você não usar essa experiência para motivar as suas tropas a fazerem muito mais do que elas vinham fazendo até então, no sentido de pelo menos promover algum tipo de proteção para aquela gente. 

Para eles falta tudo. Falta água, falta comida, falta dignidade, falta habitação, falta expectativa de vida, falta a expectativa de um dia melhor. Eles sobrevivem a cada dia. Então, o mínimo que a força da Monusco pode fazer para amenizar esse sofrimento é protegê-los para que pelo menos eles possam sobreviver.”

Falta de recursos

Para atender a necessidades básicas, a agência solicitou US$ 37,4 milhões em 2022 e recebeu apenas 16% do valor. Já neste ano, o pedido de US$ 40,3 milhões recebeu apenas 8% de financiamento.

De acordo com o Acnur, quase 5,8 milhões de pessoas precisam de assistência por conta da destruição causada com o conflito na República Democrática do Congo.

Em janeiro de 2023, mais de 200 civis foram mortos na província de Ituri em uma série de ataques de grupos armados, que também destruíram casas e escolas. Pelo menos 52 mil pessoas foram deslocadas em uma província que já abriga 1,5 milhão de deslocados internos.

Uma família deslocada vive agora em um acampamento temporário em Plain Savo, na República Democrática do Congo.

Situação no país

Enquanto isso, em Kivu do Norte, o ressurgimento de ataques de grupos armados começou em março de 2022, causando a fuga de mais de 521 mil pessoas. 

Cerca de 120 mil pessoas se mudaram para a relativa segurança dos arredores da capital da província de Goma, mas continuam com diversas necessidades. No total, 2,2 milhões de pessoas estão deslocadas por conta do conflito.

O risco de mais deslocamentos é alto, pois os conflitos afetam muitas áreas. As necessidades de proteção são enormes e aumentam à medida que os níveis de deslocamento forçado continuam a crescer.


… Mas cedo descobrirá o homem, que já começou a viver o século XXI, que a ciência não esgota a realidade humana.

Que depois de tanta maravilha que anda realizando, a humanidade não se divida em blocos, não se arme como nunca, não brinque com forças que amanhã poderão arrasar a terra.

… Mas o Criador e Pai que, ao invés de desconfiar do homem, temer-lhe a sombra e fazer questão de interferir pessoalmente para criar cada ser – o elefante e a formiga, as estrelas e a minhoca -, impeliu a evolução criadora e abriu ao homem, criado à sua imagem e semelhança, um crédito quase ilimitado de participação no poder criador. …

A tecnologia precisa da fé para não criar monstros.

… o homem, este sócio de Deus.

Por mais que o homem avance na ciência e na técnica, enquanto houver guerras no mundo daremos um triste atestado de falta de amadurecimento espiritual. Enquanto o teste, para demonstrar que a razão está com uma das partes, for demonstrar maior potência destruidora, nós todos, educadores, teremos que reconhecer o nosso fracasso.

De duas loucuras maiores, que se completam e se agravam, precisamos livrar a Humanidade: a loucura que leva ao agravamento contínuo das distâncias entre mundo desenvolvido e mundo subdesenvolvido.
As guerras se têm tornado, dia a dia, mais absurdas. Apressemo-nos a recordar as palavras de Arnold Toynbee:

 Os motivos pelos quais um soldado oferecia a vida desapareceram. No passado, era melhor vencer do que ser vencido. O vencedor recebia terras, domínio, compensações, honra e consideração. A bomba atômica se encarregou de destruir todas as diferenças entre vencido e vencedor. 

É preciso que a Humanidade acabe prescrevendo as guerras como absurdos e o subdesenvolvimento como indigno do homem no liminar do século XXI.

O egoísmo, eis o inimigo e a fonte de infelicidade. Egoísmo individual, egoísmo familiar, egoísmo regional, egoísmo nacional, egoísmo continental, egoísmo internacional.

… Até quando a Humanidade será tão bárbara para ter como critério de razão a capacidade maior ou menor de destruir?

O objetivo original de “eliminar as armas nucleares dos arsenais nacionais”, expresso na primeira resolução da Assembleia Geral da ONU, em 1946, parece hoje completamente esquecido. Ao mesmo tempo, o diálogo entre as duas principais potências praticamente cessou.  A “suspensão temporária” do acordo Novo START anunciada por Putin sinaliza o abandono dos esforços bilaterais de controle de armamentos.  

Um número frequentemente citado é o de que houve 268 anos sem guerra nos últimos 3.421 anos – 227, 235, e 257 anos de paz também aparecem em algumas estimativas. Tudo isso, contudo, já foi desmentido…


Instabilidade política em países como a Síria, Iêmen, República Democrática do Congo e Haiti deixaram milhares de mortos e seguem em andamento

Por O Globo

28/02/2023 04h30 

Milhares de pessoas que vivem perto da fronteira leste da RDC com Uganda fogem continuamente de suas casas para a Uganda, após ataques de insurgentes BADRU KATUMBA / AFP

Um ano após a invasão russa à Ucrânia, o secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que a guerra causou a maior crise de violação de direitos humanos conhecida. O secretário-geral também destacou a Declaração Universal “atacada por todos os lados” e criticou os governos que “atacam suas bases, ou as derrubam”.

Mas, apesar de a Guerra na Ucrânia estar sob os holofotes, existem hoje vários países envolvidos em conflitos armados ao redor do mundo — muitos deles há várias décadas.

Síria

A guerra civil síria, que começou em 2011, já deixou mais de 400 mil mortos, arrasou cidades e envolveu vários países estrangeiros. Mais de 200 mil pessoas estão desaparecidas e, além dos milhares de mortos, o conflito provocou um grande êxodo, reduzindo a população síria de 21 milhões, em 2010, para 17 milhões em 2019.

Antes dos terremotos que deixaram milhares de mortos na Síria e na Turquia, no começo deste mês, o país já era o que tinha o maior número de deslocados no mundo: são 15 milhões de pessoas que precisam de ajuda humanitária, após 12 anos de guerra civil.

A guerra começou depois que manifestações pró-democracia eclodiram na cidade de Deraa, no Sul, inspiradas pela Primavera Árabe, em março de 2011. Quando o governo do presidente Bashar al-Assad usou força letal para esmagar a dissidência, protestos exigindo sua renúncia eclodiram em todo o país. As manifestações, inicialmente pacíficas, se transformaram em uma guerra civil de grande escala.

Com mais de 40 mil mortos, sobreviventes do terremoto ainda são encontrados sob escombros entre Turquia e Síria

Iêmen

Nove anos após o início na guerra no Iêmen, que já deixou 233 mil mortos, mais da metade deles por desnutrição e ausência de serviços de saúde e infraestrutura, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) estima que 21,6 milhões de pessoas — o equivalente a dois terços da população precisarão de ajuda humanitária e proteção em 2023.

Desde 2014, o país vive mergulhado num conflito entre os rebeldes xiitas houthis, próximos ao Irã, e as forças do governo, apoiadas por uma coligação militar liderada pela Arábia Saudita. Uma trégua de seis meses no conflito foi iniciada em abril de 2022, o que permitiu uma redução das vítimas civis, e agora o governo iemenita e os houthis tentam negociar um prolongamento do fim das hostilidades, que expirou em outubro do ano passado.

A ausência de uma trégua oficial e a frágil situação política e de segurança, no entanto, deixam a população num limbo.

Hoje, os houthis controlam a capital, Sanaa, e grandes extensões de território no Norte e Oeste do país.

“O Iêmen continua a ser uma das piores crises humanitárias do mundo, com 4,5 milhões de pessoas deslocadas internamente e mais de dois terços da população vivendo abaixo do limiar da pobreza”, disse o Acnur, em nota, esta semana.

Segundo a ONU, 5 milhões de iemenitas estão à beira da fome, e 2,3 milhões de crianças menores de cinco anos sofrem de desnutrição aguda, incluindo 400 mil que correm o risco de morrer sem tratamento. Em nove anos de guerra, mais de 10 mil crianças morreram como consequência direta dos combates.

República Democrática do Congo

A República Democrática do Congo (RDC) é um dos países mais pobres do mundo. No Leste do país, área mais violenta, cerca de 120 milícias atuam nas províncias de Kivu do Norte, Kivu do Sul e Ituri. No último ano, os ataques se intensificaram apesar da presença de 18 mil soldados das forças de paz da ONU. Os conflitos provocaram a migração de mais de 521 mil pessoas desde março do ano passado.

Hoje, o grupo rebelde que está no centro da violência atual é o Movimento 23 de Março, ou M23. A RDC, as Nações Unidas e os Estados Unidos acusaram Ruanda de apoiar o grupo, o que é negado repetidamente pelo governo ruandês. Os ataques do M23 escalaram após o governo congolês não honrar um acordo de 2009 que deveria integrá-los ao Exército. Como consequência, o grupo tomou cidades e vilas inteiras e, segundo ONGs de direitos humanos, bombardeou áreas civis e militares.

O ressurgimento do M23 aumentou as tensões entre o Congo e Ruanda e a ameaça de uma guerra generalizada na região. Autoridades congolesas acusam Ruanda de querer saquear os recursos minerais da nação, ao mesmo tempo em que protestos ocorrem em cidades do Leste. A hostilidade entre os países também levou a um aumento do discurso de ódio e da discriminação contra falantes da língua Kinyarwanda, falada em Ruanda, dentro da RDC, alertaram as Nações Unidas.

Afeganistão

Os ataques de 11 de Setembro de 2001, que deixaram quase 3 mil mortos nos EUA, desencadearam uma série de guerras e intervenções no Oriente Médio, a chamada “Guerra ao Terror”, que tinha como alvo principal Osama bin Laden, líder da al-Qaeda. Após ultimatos ao Talibã para que entregasse bin Laden, grupo extremista que então governava o Afeganistão, a coalizão internacional liderada pelos EUA começou a bombardear o país, tirou o grupo extremista do poder e expulsou a al-Qaeda temporariamente.

Mas a tentativa de construir um Exército afegão confiável se transformou em um fiasco com uma conta de US$ 83 bilhões: foram de 60 mil mortes entre as forças de segurança afegãs e quase o dobro de mortes civis. Nos EUA, mais de 2,3 mil militares americanos morreram e mais de 20 mil ficaram feridos.

Após quase 20 anos de guerra, as forças americanas se retiraram do Afeganistão em agosto de 2021, abrindo espaço para a volta do Talibã. À época, o grupo extremista, que governou o Afeganistão entre 1996 e 2001, se mostrava disposto a rever algumas de suas posições passadas e se abrir para o mundo. Um ano e meio depois, o Talibã se mostrou o mesmo de sempre: manteve o veto à participação de mulheres na sociedade e a perseguição de minorias étnicas e religiosas.

Mianmar

O país enfrenta uma grave crise desde o golpe de Estado de fevereiro de 2021, quando uma junta militar derrubou o governo da Prêmio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, e decretou um estado de emergência em vigor até os dias de hoje.

Desde então, mais de 2.900 pessoas morreram na repressão militar contra os dissidentes e mais de 18 mil foram detidas. Suu Kyi, de 76 anos, foi condenada a um total de 33 anos de prisão, em um processo que grupos de defesa dos direitos humanos tacharam de “farsa”.

No segundo aniversário do golpe, no começo deste mês, a junta militar que governa o país prolongou por seis meses o estado de emergência, o que implica no adiamento das eleições que estavam marcadas para agosto.

Haiti

O Haiti vive uma crise política de enormes proporções desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, morto dentro de casa em Porto Príncipe, em julho de 2021. Ariel Henry, que assumiu após o magnicídio, tem sua legitimidade no posto questionada de forma recorrente, e a ausência de eleições paralisou o Legislativo. Desde então, o país vive um vazio político que deu às gangues ainda mais poder.

Os grupos armados controlam hoje mais de 60% da capital, Porto Príncipe, onde cerca de 4,7 milhões de pessoas enfrentam fome aguda. Um levantamento da ONU divulgado no ano passado deu a dimensão do impacto da violência promovida pelas gangues: só em 2022, mais de 1.400 pessoas foram mortas e mais de mil foram raptadas ou feridas.

Sem Parlamento em atividade na prática, o Tribunal de Justiça também não funciona por falta de juízes, cujos nomes devem ser aprovados pelo Legislativo. Há ainda as disputas entre a Polícia Nacional e o Exército, que não conseguem combater as gangues nas ruas. No ano passado, a ONU descreveu uma “catástrofe humanitária” em curso no país.

Em janeiro deste ano, três haitiano-americanos e um colombiano foram extraditados para os Estados Unido por seu papel no assassinato de Moïse.


*Professor, teólogo e jornalista.

Imagem em Pixabay.

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