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Vergonhosos gestos nazistas
Vergonhosos gestos nazistas

Por SOLON SALDANHA*
Que Elon Musk não passa de um menino rico, mimado e desequilibrado, com uma mente perversa, que se alimenta do seu poder econômico e de sua ânsia incontrolável por se impor a tudo e a todos, não existe ninguém que desconheça. Não entre as pessoas que sejam minimamente bem informadas. Pois agora que passou a integrar o novo governo de Donald Trump, como forma de agradecimento deste pelo apoio incondicional e criminoso que recebeu das redes sociais que o psicopata controla, nas eleições, parece que levará para limites mais distantes todas as suas características negativas. Já no primeiro discurso que proferiu, durante a celebração da posse, fez um repugnante gesto nazista para sublinhar o quanto ele e seus iguais desprezam a vida, a liberdade, a convivência e o necessário respeito entre os seres humanos.
Ele agradeceu ao público presente por “fazer isso acontecer”, colocando a mão direita sobre o coração e, em seguida, estendendo o braço direito para a frente, em linha reta. Depois repetiu o gesto – o que comprova ter sido algo pensado, premeditado – para as pessoas que estavam atrás dele. Esta saudação, que hoje os alemães chamam simplesmente de “saudação de Hitler” (Hitlergruß), de forma envergonhada, e que antes era conhecida como “saudação alemã” (Deutscher Gruß), se trata de algo copiado de uma antiga saudação romana e passou a ser utilizada como um sinal de lealdade e culto à personalidade de Adolf Hitler, com a ascensão do nazismo. Ela também expressa uma adaptação de “Sieg Heil” (Salve a Vitória), que foi proposta por Joseph Goebbels, o ministro da propaganda da Alemanha Nazista. Mais ainda: isso foi associado ao número 88, uma vez que junto ao gesto havia a exaltação “Heil Hitler” (Salve Hitler), um duplo “h”, que é a oitava letra do alfabeto.
A bem da verdade, o Brasil também foi pródigo em manifestações de estupidez semelhante, durante o governo de Jair Bolsonaro. Alguns exemplos mais conhecidos podem ser lembrados com facilidade. Em 17 de maio de 2020, ex-companheiros de armas do ex-presidente, na época anterior à sua expulsão do Exército, foram até o Palácio do Planalto para saudar o então mandatário. No momento do cumprimento, coletivamente estenderam os braços direitos para o alto, gritando “Bolsonaro somos nós”. Dias depois, o atual inelegível e seu filho Eduardo, que é deputado federal, beberam um copo de leite puro, durante transmissão ao vivo em perfil do Facebook. Depois da repercussão negativa, o blogueiro Allan dos Santos, que sempre fez parte de uma “linha auxiliar” a serviço da extrema-direita nacional, repetiu o gesto e bebeu leite ao vivo em seu canal.
Aqui uma explicação necessária: o leite se tornou um símbolo, um código adotado por supremacistas brancos. Há uma cena emblemática no filme Bastardos Inglórios (2009), de Quentin Tarantino, na qual o oficial nazista Hans Landa – uma interpretação magistral do ator Christoph Waltz – pede leite para uma família de judeus e o degusta calmamente antes de matá-los. Bem antes disso, em 1971, outro filme icônico trouxe citação semelhante. Foi em Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick. Nele o protagonista é um sociopata ultraviolento, que bebe leite juntamente com seus seguidores, com uma expressão doentia na face.
Voltando às lamentáveis ocasiões nas quais o governo anterior pareceu fazer questão de demonstrar sua simpatia e proximidade com o nazismo, vamos citar mais alguns exemplos. O então assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins, apareceu em transmissão na TV Senado, atrás do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, fazendo o gesto “OK” com as mãos, mantendo três dedos retos em formato da letra “W”. Ele é conhecido e classificado pela Liga Antidifamação (ADL), uma entidade com sede nos EUA que combate o antissemitismo, como forma de identificação de supremacistas brancos.
Roberto Alvim, ex-secretário especial de Cultura, durante manifestação feita em rede nacional de televisão, para divulgar o lançamento do Prêmio Nacional das Artes, copiou e repetiu fielmente um bom trecho de discurso do nazista Joseph Goebbels. Com uma expressão facial de absoluta severidade e com a foto de Bolsonaro ao fundo, ele apenas trocou a palavra “alemã” por “brasileira”, ao citar como a arte deveria passar a ser feita, doutrinadora. “Ou assim, ou não será nada”, ameaçou.
Um quinto exemplo, este de apoiadores, foi dado por Sara Geromini. Ela passou a usar o sobrenome “Winter”, em homenagem a Sarah Winter, uma inglesa que se tornou espiã nazista e integrou a União Britânica de Fascistas, durante a Segunda Guerra Mundial. A brasileira organizou um grupo que chamou de “300 do Brasil”, com o objetivo de combater “a corrupção e a esquerda no mundo” – assim, grandiloquente, indo além das nossas fronteiras. A camarilha manteve, com a devida conivência do governo federal, um acampamento na Esplanada dos Ministérios. E fazia uma série de marchas carregando tochas e vestindo roupa branca, numa clara alusão à estética da Ku Klux Klan (KKK), movimento supremacista branco dos EUA que foi responsável por inúmeros crimes bárbaros.
É impossível esquecer que os nazistas foram responsáveis pela morte de aproximadamente seis milhões de judeus. Perseguiram e mataram ainda ciganos, negros, homossexuais e pessoas com deficiências. Isso tudo torna quase que incompreensível a retomada desta ideologia extremista em todo o planeta. Presente ao Fórum Econômico Mundial, que está acontecendo na Suíça, o chanceler alemão Olaf Scholz reagiu ao gesto tresloucado de Musk – que havia manifestado recente apoio ao partido de extrema-direita da Alemanha, AfD – afirmando que todos na Europa têm direito à liberdade de expressão. Mas, acrescentou, isso não pode ser confundido com permissão para defender essa ideologia. As críticas da imprensa foram praticamente unânimes no mundo todo. E a jornalista estadunidense Anne Bagamery, falando à France 24, questionou se os americanos que apoiam isso alguma vez na vida pegaram sequer um único livro de história. Particularmente, eu duvido.
*Solon Saldanha é jornalista e blogueiro.
Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades.
Foto de capa: ANGELA WEISS / AFP
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