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Programação cultural – de 20 a 26 de abril

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Programação cultural – de 20 a 26 de abril
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Por LÉA MARIA AARÃO REIS** *O programa é não esquecer o que Amitabh Behar, diretor Executivo da Oxfam Internacional, Comitê de Oxford para Alívio da Fome, disse, esta semana: “Israel está fazendo escolhas deliberadas para matar civis de fome. Imagine como é não apenas tentar sobreviver com 245 calorias todos os dias, mas também ter que observar seus filhos ou parentes idosos fazerem o mesmo. Isto, enquanto estavam deslocados, com pouco ou nenhum acesso a água potável ou a um banheiro, sabendo que a maior parte do apoio médico desapareceu e sob a ameaça constante de drones e bombas”. Publicado na Revista Fórum. *Aproximadamente 300 mil palestinos sobrevivem no norte de Gaza com apenas 245 calorias por dia. Um pão francês de 50g tem 140 calorias. *O programa é seguir o destino dos recém-nascidos e das crianças que estão morrendo de desnutrição, em Gaza, segundo contundente informe da BBC World Service, do último mês de março, autoria das jornalistas Amira Mhadhbi e Stephanie Hegarty. *Abril vermelho: na sua luta pela reforma agrária, nessa semana que relembra o massacre de Eldorado dos Carajás, há três décadas, o MST divulga as 30 ações realizadas das quais 24 são ocupações, em 14 estados. O Movimento dos Sem Terra denuncia a existência, ainda hoje, depois de 40 anos de sua fundação, de 105 mil famílias acampadas às margens de rodovias em todo o país aguardando um pedaço de terra. *Relembrando a fala do Presidente Lula em Bogotá, na Colômbia, esta semana: “Somos um continente colonizado. Nossa cabeça historicamente era voltada, de um lado, para a Europa, onde estavam os colonizadores, e, do outro lado, para uma economia mais pujante, sobretudo a dos EUA. (…) Depois de 520 anos de existência, todos nós continuamos pobres”, se referindo ao desemprego, à desnutrição e a mortalidade infantil presentes no continente sul-americano. *Programa importante: o longa-metragem brasileiro A Queda do Céu, de Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha, vai estrear na Quinzaine des Cinéastes (Quinzena de Cineastas), a mostra paralela ao Festival de Cannes, que promove a descoberta de novos diretores independentes. O filme é um diálogo com o livro homônimo do xamã Yanomami Davi Kopenawa, e de Bruce Albert, antropólogo francês. Uma obra considerada por especialistas um clássico contemporâneo que trata do sonho e da luta do povo Yanomami e da força poética e geopolítica do xamã, filósofo e líder Davi Kopenawa. *Eu devia estar na escola é o título do livro produzido pela ONG Redes da Maré em parceria com a editora Caixote. O volume reúne depoimentos de crianças e adolescentes da Maré que viveram situações de violência em seu território. “Toda criança pode sentir medo e vai sentir medo. Faz parte da vida da criança sentir medo. Mas é diferente sentir medo do monstro debaixo da cama ou de abrir o guarda-roupa à noite e sair de lá uma bruxa, e sentir medo de perder a vida, né? Esse medo de perder a vida, as crianças não deveriam sentir”, diz uma das autoras do livro, Ananda Luz, que acompanhada de Isabel Malzoni, organizou os depoimentos e desenhos das crianças e adolescentes. *Segundo dados da ONG Fogo Cruzado, 642 crianças e adolescentes entre zero e 17 anos foram baleadas no Grande Rio desde julho de 2016. Significa que, em média, a cada quatro dias uma criança ou adolescente foram baleados. Desse total, 289 morreram. *De olho no Festival de Cannes, de 14 a 25 de maio. Este ano, dois filmes brasileiros já têm participação confirmada: o primeiro, Motel Destino, do festejado e premiado diretor cearense Karim Aïnoux. Será exibido no grupo principal da festa da Croisette, seleção de filmes competidores, disputando a Palma de Ouro. Esta é a terceira vez que Aïnouz participa de Cannes. Venceu em 2019 com o brilhante filme A Vida Invisível, na mostra Un Certain Regard e competiu com Firebrand, no ano passado. *O segundo filme brasileiro em Cannes 2024 é Baby, do diretor mineiro Marcelo Caetano. Está no grupo de outros sete candidatos ao premio da Semana da Crítica, seleção de prestígio que este ano contou com nada menos que mil candidatos. É o segundo longa-metragem do cineasta autor de Corpo Elétrico. *Esta semana, na Casa do Povo, no bairro do Bom Retiro, em São Paulo, lançamento póstumo do livro A morte de Vladimir Herzog – a desconstrução da versão do suicídio, de Alberto Kleinas, cientista político que participou do movimento estudantil e dos primeiros anos do Partido dos Trabalhadores. O evento foi organizado com o apoio do Instituto Vladimir Herzog e do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. Foi também uma homenagem ao autor, falecido em 2022 (Editora Alameda). *O lançamento do livro Por trás das chamas: Mortos e desaparecidos políticos – 60 anos do golpe de 1964, de autoria dos jornalistas e escritores Nilmário Miranda, Carlos Tibúrcio e Pedro Tierra (Hamilton Pereira), será no próximo dia 25, das 17 às 19h45, na sede da editora Expressão Popular e do Armazém do Campo. São relatos sobre Memória, Verdade e Justiça e sobre a luta contra a ditadura civil-militar e as práticas nazistas de agentes da repressão que torturaram e assassinaram militantes na Casa da Morte em Petrópolis, esquartejando seus corpos para incinerá-los na tristemente célebre Usina Cambahyba, em Campos dos Goytacazes. É leitura indispensável. O endereço: Alameda Nothmann, 806 – Campos Elísios. Estações de metrô próximas: Santa Cecília e Marechal Deodoro. Estacionamento na Barão de Limeira. *Outra edição imperdível: Tempos de Chumbo, livro de 22 textos com as memórias de parentes próximos de Jango, o presidente João Goulart – a viúva Maria Thereza e os filhos Denise e João Vicente –, da deputada Luiza Erundina e do ex-senador Pedro Simon. Volume organizado por Carol Brito, filha do saudoso foto- jornalista Orlando Brito, com 41 imagens de sua autoria ilustrando o trabalho idealizado pelo MyNews e publicado pela Editora Alameda. *Acaba de estrear no CinebrasilTV Sérgio Ricardo: Uma Outra História do Cinema Novo, documentário com a trajetória do eclético cineasta, compositor, cantor e pintor na cinematografia. O filme é de Rafael Rosa Hagemeyer e acompanha Sergio desde a Bossa Nova, o aprendizado de cinema com Ruy Guerra, seu amadurecimento como músico, os desafios colocados por Glauber Rocha para a trilha de Deus e o Diabo na Terra do Sol, e seus confrontos com a censura da ditadura. Ziraldo, Antonio Pitanga, Othon Bastos, Ítala Nandi, Alceu Valença e Geraldo Azevedo participam do filme sobre o artista que alguns conhecem como ‘aquele que quebrou o violão no palco’. Filme disponível, na íntegra, no YouTube (clique aqui para assistir). Reprises no Canal Brasil: 19/04 às 23h00; 21/04 às 00h00; 23/04, terça, às 05h00; 25/04, quinta, às 16h30; 27/04, sábado, às 13h30 e 29/04, segunda, às 07h00. *O programa da próxima semana para jornalistas profissionais é participar da votação, no próximo dia 26, para 1/3 do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Imprensa (ABI). É importante votar. *Estreou essa semana nas telonas, Sem Coração, da alagoana Nara Normande e do pernambucano Tião, este já premiado em Cannes no grupo de curtas-metragens. O filme é produzido pela Cinemascópio, empresa de brasileiros e franceses ligados ao cinema, e foi premiado como Melhor Filme e Melhor Fotografia no último Festival do Rio e vem do Festival de Veneza, do ano passado. A história se passa em um verão, no litoral de Alagoas, entre adolescentes. *Classe trabalhadora na capital do agronegócio: terra, trabalho e espaço urbano em Sorriso-MT, do sociólogo Luiz Felipe F. C. de Farias, é mais uma leitura relevante sobre as contradições do cenário das chamadas ‘cidades do agronegócio’. Apoiado em fontes documentais, estatísticas e entrevistas, o autor desvenda o processo de constituição de um espaço em que se revelam “forte segregação social, o encontro conflituoso de etnias e novas formas de exploração, juntando pedaços de um Brasil diverso e desigual”, como ressalta a Editora Alameda, na sua apresentação. *Grande programa, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, a exibição de oito filmes em homenagem a Marlon Brando e Marcelo Mastroianni que completariam cem anos este ano. Brando agora, em abril. Mastroianni em setembro próximo. Pena que a mostra foi rápida demais. Termina no próximo domingo, dia 21. Merece reprise estendida a unidades da Cinemateca em outros estados. *O jornalista e correspondente brasileiro Pepe Escobar, sediado no Oriente, está no Brasil para encontros com o público durante os quais falará sobre o declínio da ordem imperialista e a ascensão do mundo multipolar. Em São Paulo, na livraria Tapera Taperá, sábado, dia 20, entrevistado pelo professor Lejeune Mirhane. Dia 22, Clube de Engenharia no Rio de Janeiro. Em seguida, dia 25, será a vez de Salvador, e dias 26 e 27, Belo Horizonte. Escobar é autor, entre outros, do livro Império do caos. **Jornalista carioca. Foi editora e redatora em programas da TV Globo e assessora de Comunicação da mesma emissora e da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro. Foi também colaboradora de Carta Maior e atualmente escreve para o Fórum 21 sobre Cinema, Livros, faz eventuais entrevistas. É autora de vários livros, entre eles Novos velhos: Viver e envelhecer bem (2011), Manual Prático de Assessoria de Imprensa (Coautora Claudia Carvalho, 2008), Maturidade – Manual De Sobrevivência Da Mulher De Meia-Idade (2001), entre outros. As informações acima são fornecidas por editoras, produtoras e exibidoras. A imagem é uma montagem do site Fórum21. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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O Governo Lula precisa se reinventar

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O Governo Lula precisa se reinventar
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De ALDO FORNAZIERI* O governo Lula 3 começou de forma errada. Um erro de embocadura política. Pensou-se como uma linha de continuidade com os dois primeiros mandatos. Parece não ter percebido que os tempos e os ventos mudaram, que os atores mudaram, que a economia mudou, que as expectativas das pessoas têm novas características, que as novas tecnologias produziram enormes impactos sobre as modalidades de trabalho, que as formas de fazer política e comunicação são outras e que o Brasil assumiu uma fisionomia muito mais conservadora. Do ponto de vista político, o Brasil não ficou incólume às passagens de Temer e Bonsonaro no governo. As políticas desconstrutivas dos conteúdos sociais e de direitos foram devastadoras. Neste sentido, Lula 3 deveria ter começado como um novo presidente e como um novo governo, não apenas em relação aos governos conservadores que o antecederam, mas também em relação aos governos petistas anteriores. Lula deveria ter assumido como um novo líder em um novo tempo. Afinal de contas, um novo líder (príncipe) deve se conduzir sempre como um novo governante e não como um governante antigo. Isto é, Lula 3 deveria se caracterizar desde seu início como um governo inovador, com projetos inovadores, metodologias inovadoras e formas de agir e de se comunicar inovadoras. A impressão que fica é a de que o governo entrou numa guerra contemporânea com peças de artilharia da Segunda Guerra Mundial. Quando ocorrem mudanças de circunstâncias e de conjunturas manter condutas arraigadas a um passado porque deu certo, pode ser fatal a um governo. Em tempos mutantes, os governantes precisam repactuar recorrentemente seus projetos e suas formas de agir. A vitória de Lula contra Bolsonaro parece ter sido vista pelo campo governista como uma vitória normal no contexto de uma democracia normal. Não foi. Ela deveria ter sido concebida como uma conquista militar e revolucionária de um novo território. O campo governista deveria ter percebido que a conquista do palácio central não significava o fim da guerra e que o inimigo continuava ocupando boa parte do território. O episódio do 8 de janeiro, que pegou o governo desprevenido, foi uma prova cabal de que a guerra continuava. Mesmo com uma sucessão de erros e de fendas nos flancos oferecidas pelo comando inimigo, o campo governista não soube atacar de forma mais contundente. Não conseguiu enfraquecer o inimigo e permitiu que a cada revés ele se reorganizasse. Em outras palavras: o campo governista não percebeu (ou não quis) a necessidade de impor uma derrota política ao inimigo. Fazia-se necessário adotar uma série de iniciativas de combate político para desarticular a linhagem política do bolsonarismo, desorganizando suas fileiras com deslocamentos e neutralização de parte de suas forças. Esta era uma tarefa fundamental dos partidos e dos parlamentares do campo governista, não propriamente do presidente. O presidente, como chefe da nação, deveria seguir aquela máxima de que “o príncipe guerreiro e infiel deve proclamar incessantemente a paz e a fé”. Mas a guerra nunca pode deixar de ser feita, porque ela é inerente às disputas políticas. No Congresso, com bravas exceções de parlamentes do PSOL e de alguns poucos petistas, a conduta dos representantes é vergonhosa. Abriram mão de promover o embate político e ideológico contra o bolsonarismo e as teses de extrema-direita. Boa parte dos parlamentares do campo governista aprovou o Projeto de Lei do fim das visitas de presos em regime semiaberto às famílias – o famoso projeto das saidinhas relatado pelo deputado Guilherme Derrite (PL-SP). Em vários outros temas de alta combustão ideológica, as esquerdas não estão oferecendo combate nem no parlamento e nem nas redes. Governar e liderar significa imprimir direção e sentido aos acontecimentos e aos liderados. Se as lideranças abrem mão dos embates, a militância, os combatentes, ficam sem rumo e sem comando, As forças se desorganizam na apatia e na imobilidade. E como a política também é uma guerra por ocupação de espaços e territórios, o inimigo termina se reorganizando e avançando no espaço disponível. As esquerdas não perceberam que nas novas condições, bons resultados na economia e bons programas sociais são insuficientes para produzir engajamentos e apoios políticos. Os embates ideológicos e de valores são necessários para convencer e persuadir as pessoas. Há uma guerra política pelas subjetividades, por reencantamentos, e quem foge dela perde batalhas e terreno. O governo se comunica mal. Se comunica de forma analógica, com mensagens ineficientes, em meio à guerra digital. As mensagens não produzem engajamento e mobilização. Dessa forma, o comando governista assume aquela condição de um grupo de generais sem exército e a militância se vê como um exército sem generais. O próprio presidente Lula parece cometer um erro ao dar uma grande ênfase à política externa e a viagens ao exterior. É certo que o Brasil precisava ser reposicionado internacionalmente depois da devastação bolsonarista. Mas Lula deveria dar mais atenção à política interna, assumindo com intensidade o comando político de seu governo, viajando mais internamente. Lula precisa perceber que a condição de sua liderança política e popular não é mais aquela com a qual terminou seu segundo mandato. Se aquela condição é quase que impossível de ser alcançada, a condição atual precisa e pode ser melhorada. Se as condições do governo no Congresso são difíceis, Lula precisa estar junto ao povo, protegendo e fortalecendo os fracos e enfraquecendo os fortes. Deve fortalecer-se junto ao povo, alargando o espaço de sua liderança, visando contrabalançar a força da direita e neutralizar aqueles supostos aliados que vivem encostando a faca no seu pescoço. Lula deve assumir aquela condição de general de campo, liderar politicamente seu governo, cobrar seu estado-maior e não vacilar em demitir e trocar ministros que não funcionam e não produzem resultados satisfatórios. O que está em jogo não é apenas o destino do governo, mas o destino do país que corre riscos com uma possível retomada da direita ou da extrema-direita. Os setores do centrão que estão no governo negociam atacando, usando ardis e chantagens. O campo governista negocia cedendo, calando, abrindo mão de embates. A reinvenção do governo é urgente. O governo precisa apresentar-se com uma fisionomia ativa, enérgica e inovadora. O governo precisa de comando político capaz de dar direção e sentido ao país. Não se trata de meras mudanças pontuais. Trata-se de uma reinvenção capaz de mostrar um novo governo. *Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo e autor de Liderança e Poder (Editora Contracorrente, 2022). Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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A polêmica revisão das metas fiscais

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A polêmica revisão das metas fiscais
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De PAULO NOGUEIRA BATISTA JR* O ministro da Fazenda anunciou há pouco a revisão da meta de resultado primário para 2025. Antes, o arcabouço fiscal estabelecia um superávit de 0,5%, com uma margem de tolerância de 0,25 % do PIB para mais ou para menos. Agora, o ponto central da banda foi reduzido para déficit zero, repetindo a meta de 2024 e mantendo a margem de tolerância. Decidiu-se, também, suavizar as metas para os anos subsequentes.  Como seria de esperar, o mercado e a mídia tradicional reagiram mal. Deram arrancos triunfais de cachorro atropelado, como diria Nelson Rodrigues. Alegam que o risco fiscal aumentou, com consequências negativas para a economia. Há base para preocupações?  Antecipo as conclusões do artigo: a questão é complexa e controvertida, mas não parece que haja motivo para perde o sono, e muito menos para discursos catastrofistas. O máximo que se pode dizer, a meu juízo, é que algumas projeções e expectativas terão, sim, de ser revistas, mas não de forma a justificar alarme. O leigo deve ter consciência de que os problemas levantadas pelos economistas de mercado, na verdade por qualquer economista, não têm base em certezas, tecnicamente fundamentadas, mas em conjecturas mais ou menos plausíveis. Informed guesses. Em inglês, fica chique. Em português, menos chique, mas mais realista: chutes informados. A coluna será desta vez, por força da complexidade do tema, um pouco mais técnica do que de costume. Farei, de todo o modo, um esforço para torná-lo acessível, pelo menos na maior parte, para não-economistas. Uma sugestão que eu mesmo sigo quando leio textos mais técnicos de outras áreas: não se desencoraje, leitor ou leitora, se topar com uma passagem que parece difícil de entender. Passe batido e siga em frente. Se não forem muitas as passagens não compreendidas, o essencial do texto poderá ser captado.  As questões econômicas são importantes demais para serem deixadas apenas nas nossas mãos. E sempre me lembro da advertência da grande economista keynesiana, Joan Robinson, para quem uma das principais razões para estudar economia era não se deixar enganar por economistas. Desequilíbrio externo e inflação? Mas vamos ao assunto. Quais são as razões macroeconômicas possíveis para se preocupar com a decisão de rever as metas de 2025 e dos anos seguintes? Tentarei passar os principais argumentos em revista. Começo com os que parecem mais fracos.  Um afrouxamento da política fiscal, seja por aumento de gastos não-financeiros, seja por diminuição da carga tributária, gera ceteris paribus expansão da demanda. Em outras palavras: tudo o mais constante, maior despesa e/ou menos impostos se traduzem em maior demanda agregada. O gasto governamental é diretamente um dos componentes da demanda; já menores tributos aumentam a renda disponível do setor privado, o que tende a incentivar os seus gastos de consumo e de investimento. Admitindo-se que haja capacidade produtiva ociosa (algum desemprego das instalações produtivas e da força de trabalho), o aumento da demanda gera crescimento da produção. O que há de errado nisso? Em princípio, nada. A economia brasileira vem crescendo pouco, apenas 3% ao ano, talvez menos neste ano, e um impulso pelo lado fiscal seria bem-vindo. O que se alega como contra-argumento, tradicionalmente, é que esse impulso provocaria desequilíbrio das contas externas e/ou inflação.   Por quê? Maior crescimento da economia pode gerar aumento da demanda por importações e pode, também, desviar exportações para o mercado interno. Diminuiria, assim, o superávit da balança comercial e aumentaria o déficit do balanço de pagamentos em conta corrente. No que se refere à inflação, o aumento da demanda e o aquecimento do mercado estimulariam maiores aumentos de preços e salários, obstruindo a convergência da inflação às metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. Nenhum dos dois efeitos parece motivo para alvoroço. A posição externa da economia brasileira é extraordinariamente forte. O superávit comercial bate recordes e o desequilíbrio em transações correntes é pequeno. As reservas internacionais do país são elevadas, dando segurança à economia pelo lado externo. Pode-se dizer com alguma certeza que o balanço de pagamentos e o nível de reservas não serão abalados pela revisão da meta de resultado primário de 0,5% do PIB para zero em 2025 nem pela revisão discreta das metas anuais posteriores. A revisão não fará nem cócegas no setor externo da economia. Quanto à inflação, a preocupação é menos descabelada, mas também não chega a ser convincente, no meu entender. O aumento da demanda, argumenta-se, por elevar o grau de utilização da capacidade instalada e reduzir a taxa de desemprego, geraria aquecimento excessivo do mercado, desembocando em inflação adicional. Antes do anúncio do ministro Haddad, as expectativas de inflação já estavam ligeiramente “desancoradas”, isto é superavam um pouco o centro da meta oficial, fixado em 3%.  Uma intensificação do crescimento poderia levar a inflação esperada a distanciar-se mais da meta de inflação que o Banco Central persegue? A resposta a essa pergunta não é clara e cristalina. Os economistas de mercado e o próprio Banco Central costumam alegar que o “hiato do produto” teria se estreitado muito e que qualquer estreitamento adicional seria perigoso para o controle da inflação. O que é hiato do produto? Trata-se de uma medida agregada da ociosidade na economia, uma variável não-observada diretamente, inferida a partir de estimativas do produto potencial. Esse último é o nível de PIB que poderia ser produzido com plena utilização dos fatores de produção. Se o PIB observado é inferior ao potencial, diz-se que o hiato do produto é negativo (e positivo se o produto observado supera o potencial). Acontece que as estimativas de produto potencial sempre são imprecisas. Portanto, o hiato sempre carrega alguma incerteza e a dispersão das estimativas tende a ser elevada.  Para dirimir esse tipo de dúvida, uma possibilidade é deixar de lado as estimativas de hiato do produto e observar diretamente informações existentes sobre a utilização dos fatores de produção. Por exemplo: qual é o grau de utilização da capacidade na indústria? Qual é a taxa de desemprego da economia. Essas variáveis diretamente observáveis sugerem que o hiato do produto está mesmo próximo de zero? Prima facie, os dados disponíveis não confirmam a tese de que a ociosidade é pequena. Segundo a Confederação Nacional da Indústria, o grau de aproveitamento da capacidade instalada está razoavelmente estabilizado abaixo de 80%. E, segundo o IBGE, a taxa de desemprego aberto (pessoas desocupadas que buscaram trabalho na semana de referência da pesquisa) está em queda, mas ainda é considerável, de 7,4% no final de 2023. Além disso, medidas mais amplas de desemprego, também acompanhadas pelo IBGE, indicam que: a) muitos trabalhadores  estão subutilizados, isto é, trabalhando menos horas do que desejariam, e b) existe também um estoque substancial de desempregados que voltariam ao mercado se a demanda por trabalho se recuperasse ou que, por convenção, não são incluídos como desocupados nas estatísticas de desemprego aberto por não terem realizado busca efetiva de trabalho na semana de referência. Estes dois últimos grupos são designados pelo IBGE como “força de trabalho potencial”. Considerando todas essas formas de desemprego, a taxa de subutilização global do trabalho alcançava nada menos que 17,3% no final do ano passado.  Portanto, parece difícil argumentar que a economia brasileira esteja perto da plena utilização da sua capacidade. É pouco significativo o risco de que a política fiscal mais branda possa sobreaquecer a economia e pressionar a inflação – tanto mais que a revisão das metas foi bem cautelosa.  Aumento das taxas de juro de longo prazo?  Mas há pelo menos duas outras linhas de argumentação interligadas, que justificariam a preocupação com o afrouxamento da política fiscal. Uma delas, inconsistente com o argumento anterior, é que a piora do resultado primário esperado resultaria em aumento das taxas de juro de longo prazo. Este aumento provocaria, por sua vez, uma diminuição do crescimento econômico.  Repare, leitor ou leitora, que o argumento agora aponta para um risco oposto – o de que o afrouxamento fiscal possa reduzir o crescimento. A expectativa de um resultado primário menos robusto levaria a um aumento da desconfiança do mercado, que passaria a cobrar juros mais altos para emprestar ao governo a prazos um pouco mais longos. Ora, prossegue o argumento, são as taxas de juro longas que determinam o investimento e o consumo de bens duráveis. Esses componentes da demanda privada, que dependem de crédito, sofreriam impacto negativo dos juros mais altos. O crescimento da economia ficaria prejudicado e também a sua qualidade, se o impacto sobre investimento for expressivo. Uma taxa de investimento que já é baixa cairia ainda mais, comprometendo a possibilidade de sustentar o desenvolvimento da economia no médio e longo prazos. Esse efeito pode ser exacerbado pelo Banco Central, caso ele venha reagir à flexibilização fiscal com aumento dos juros de curto prazo ou com algum sinal de intensificação da restrição monetária nos próximos meses. Dependendo da dimensão dos efeitos envolvidos, esse raciocínio tem um aspecto paradoxal: a expansão fiscal (via diminuição do resultado primário ex ante) pode ser contracionista e, da mesma forma, a contração fiscal pode ser expansionista. A expansão contracionista ocorreria sempre que o impacto recessivo via juros (e, diga-se en passant, via apreciação cambial) sobrepujasse o impacto expansivo via demanda interna agregada.  Todo paradoxo é intelectualmente instigante. Instigante, mas não necessariamente verdadeiro. É o caso deste. O efeito recessivo é baseado em conjecturas difíceis de respaldar quantitativamente. Qual o impacto da mudança da metas sobre as percepções de risco do mercado e a sua demanda por títulos mais longos? E se houver aumento expressivo dos juros longos, qual o efeito sobre o investimento e o consumo de duráveis? Não há como dimensionar esses efeitos com segurança e de forma inequívoca. Conjecturas são quase sempre inescapáveis em economia, uma ciência inexata por excelência. A hipóteses em questão, porém, dependem de conjecturas especialmente frágeis.   Já o impacto expansivo, sobretudo de um aumento do gasto governamental, é mais direto e se faz sentir mais rapidamente. A maior despesa pública, permitida pela metas mais moderadas, reflete-se em expansão da demanda e gera aumento da produção – desde que exista alguma capacidade instalada ociosa e trabalhadores desempregados ou subempregados, como é o caso no Brasil agora. Assim, é pouco provável que o efeito recessivo dos juros prevaleça sobre o impacto expansionista do gasto. Esse último é claro e direto; o primeiro é incerto e sujeito a conjecturas. O paradoxo se desfaz na prática. A expansão fiscal tende a ser expansionista mesmo. E a contração fiscal, contracionista. Observe-se, de passagem, que a expansão da economia induzida, via demanda agregada, pela política fiscal mais branda tem efeitos positivos que nem sempre são levados na devida conta. Primeiro, ao provocar aumento da utilização da capacidade, ela estimula o investimento do setor privado (poucos investem em grande escala enquanto subsiste capacidade ociosa). Segundo, o aumento da base de incidência dos impostos eleva a arrecadação automaticamente, sem aumento de carga tributária. Terceiro, o maior crescimento melhora o resultado primário também pelo lado das despesas públicas. Isso porque o aumento dos postos de trabalho decorrente da expansão da economia reduz gastos cíclicos como o auxílio a desempregados. A insustentável leveza da dívida pública Retomo o fio da meada. O outro argumento também muito popular entre economistas de mercado e na mídia tradicional é o de que menor ambição em termos de resultado primário traz o risco de aumento incontrolável ou insustentável da dívida do setor público. Esse argumento se baseia em grande parte em identidades contábeis. O crescimento da dívida (inclusive passivos monetários) corresponde ao déficit. Este equivale à soma do resultado primário (receitas menos despesas não-financeiras) com as despesas líquidas de juros (despesas menos receitas financeiras). A despesa com juros, por sua vez, resulta da taxa média de juro multiplicada pelo estoque da dívida. A trajetória da razão dívida pública/PIB, a variável que resume tudo isso, reflete portanto três variáveis principais: o superávit primário como percentagem do PIB, a taxa de juro e a taxa de crescimento do PIB. Combinando essas identidades, chega-se ao seguinte resultado, bastante conhecido: a razão dívida/PIB é função inversa da taxa de crescimento econômico e função direta da taxa de juro e do déficit primário. Se a taxa de juro supera a taxa de expansão do PIB, a dívida só se estabiliza em relação ao PIB quando há superávit primário. Quanto maior o diferencial entre taxa de juro e taxa de crescimento da economia, maior o superávit requerido para estabilizar a dívida. Quando o governo abandona o objetivo de gerar superávit primário em 2025, o mercado refaz as suas contas e chega à conclusão óbvia de que, ceteris paribus, a razão dívida/PIB será maior no final de 2025 do que antes se estimava. Ceteris non paribus, porém. Se a suavização da política fiscal de fato elevar o prêmio de risco e a taxa de juro paga pelo governo, como costuma supor o mercado, o crescimento da dívida será ainda maior. Podemos concluir, então, que a modificação da política fiscal traz um risco de expansão desgovernada da dívida? Não acredito e explico por quê. Há várias falhas e omissões no argumento que procurei resumir nos parágrafos anteriores. O primeiro é que uma quantificação do efeito de mudar a meta de um superávit de 0,5% do PIB para zero em 2025 e abrandar as metas dos anos subsequentes dificilmente produzirá diferenças expressivas no estoque da dívida. Não houve revisão radical, apenas ajustes modestos. E o possível reforço negativo advindo da alta dos juros médios fica condicionado às incertezas comentadas quando discutimos o falso paradoxo da expansão fiscal contracionista. Ressalte-se, além disso, que os economistas de mercado focam indevidamente na dívida bruta. A dívida líquida do setor público, variável mais relevante, em que se deduz os ativos líquidos do governo (o principal sendo a reserva internacional do país), é bem inferior à bruta. A dívida líquida situa-se em torno de 65% do PIB; a bruta em torno de 74%. E mais: a dívida pública no Brasil é interna, emitida domesticamente em moeda nacional. A participação de investidores não-residentes na dívida interna é pequena, da ordem de 10%. E o setor público brasileiro, graças à elevada reserva internacional, tem uma dívida externa líquida negativa. Em síntese, em razão da sua composição e estrutura, a dívida é administrável sem grandes sustos. É verdade que o prazo médio é curto, mas o refinanciamento da dívida ocorre sem dificuldades maiores. Não se deve perder de vista, por outro lado, que objetivos um pouco mais modestos e mais realistas aumentam a flexibilidade do governo. Abre-se espaço para continuar com a política de gradual aumento do salário mínimo em termos reais, para o fortalecimento das transferências sociais ou para a recuperação do investimento público, que continua deprimido. Mesmo as novas metas, apenas um pouco menos ambiciosas, serão de difícil cumprimento, exigindo considerável disciplina e obstruindo provavelmente políticas públicas que o governo considera prioritárias. As metas mais moderadas abrem, também, bem sei, espaço adicional para as emendas parlamentares, que em geral pioram a qualidade do gasto público. Mas, enfim, c’est la vie, são agruras de uma situação em que o Congresso ficou mais poderoso e decide com base em critérios muito estreitos, tipicamente paroquiais, sobretudo em ano de eleições municipais. Permanece, de qualquer forma, o fato de que, a não ser em circunstâncias excepcionais que não estão no horizonte, a dívida pública brasileira pode ser rolada com relativa facilidade. A moderação dos objetivos fiscais não modifica esse quadro. Passado o nervosismo inicial (o mercado esperava aparentemente uma redução menor das metas), a poeira baixará. As projeções de resultado primário serão, sim, revistas um pouco para cima, com o argumento de que a suavização das metas indica menos comprometimento do governo com “a responsabilidade fiscal”. Em quanto aumentará as medianas das projeções para os próximos anos? Logo saberemos. Mas acredite, leitor ou leitora, serão novos informed guesses. Não vale a pena se impressionar muito com os chutes, ruídos e grunhidos do mercado e da mídia.  O Ministério da Fazenda não pode, é claro, ignorar olimpicamente as reações da mídia e do mercado. Normal que o ministro e sua equipe estejam monitorando com certa aflição os efeitos das novas metas. Em parte, o problema é auto infligido. Não existiria, pelo menos não na mesma medida, se o arcabouço fiscal estabelecido em 2023 tivesse sido mais flexível e realista, como sugeriram na época diversos economistas heterodoxos ou menos ortodoxos, inclusive este que vos escreve. (Desculpe, leitor ou leitora: não resisti a um pequeno I told you so!) Homenagem do vício à virtude Para terminar, um comentário sobre as hipocrisias do mercado e da mídia. Sabemos que, como dizia La Rochefoucauld, a hipocrisia é a homenagem do vício à virtude. Mas não vamos exagerar, por favor.  A preocupação é realmente com o “risco fiscal”? Duvidoso que seja. Esse risco depende, como vimos, do tamanho do déficit e da trajetória da dívida pública. Ocorre que o déficit relevante para aferir o aumento da dívida não é o primário, mas o déficit total, que inclui também os juros da dívida. E, como indicado anteriormente, o déficit total é, por definição, a soma do déficit primário com os juros.  Ora, o que essas identidades mostram? Entre outras coisas, que mesmo quando há superávit primário ou déficit pequeno, a dívida pode crescer rapidamente se a despesa financeira for pesada. É exatamente o que se vê no Brasil em consequência da elevada taxa de juro praticada pelo Banco Central. A responsabilidade monetária desemboca em irresponsabilidade fiscal – paradoxo, este sim, válido. Para 2024, as previsões do mercado, coletadas pelo Banco Central (antes da revisão das metas), situam a despesa líquida de juros em torno de 6,1% do PIB; o déficit primário, em algo como 0,7% do PIB apenas. Ou seja, os gastos com juros pesam quase nove vezes mais do que o déficit primário! O principal fator de “risco fiscal” é a taxa de juro. Pergunta insincera: por que será que o mercado e a mídia nunca reclamam dela?  Nota: Graças à revisão de Lavínia Lima e Flávia Vinhaes, vários erros, repetições e omissões foram evitados. Porém, é minha exclusivamente a responsabilidade por problemas remanescentes e pelas conclusões do artigo. *Economista, foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, estabelecido pelos BRICS em Xangai, de 2015 a 2017, e diretor executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países em Washington, de 2007 a 2015. Lançou no final de 2019, pela editora LeYa, o livro O Brasil não cabe no quintal de ninguém: bastidores da vida de um economista brasileiro no FMI e nos BRICS e outros textos sobre nacionalismo e nosso complexo de vira-lata. A segunda edição, atualizada e ampliada, começou a circular em março de 2021. E-mail: paulonbjr@hotmail.com Twitter: @paulonbjr Canal YouTube: youtube.nogueirabatista.com.br Portal: www.nogueirabatista.com.br Uma versão resumida deste artigo foi publicada na revista Carta Capital. Imagem em Pixabay. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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A dança ideológica

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A dança ideológica
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De SOLON SALDANHA* Precedido por uma intensa publicidade, estará se apresentando em São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, entre os dias 26 de abril e 11 de maio, a companhia de dança Shen Yun Performing Arts. O que boa parte das pessoas – encantadas pelo visual de uma coreografia primorosa que antecipam nos anúncios – talvez não saibam é o que está por trás dessa estrutura toda. Este grupo, que faz questão de se autodenominar como “sensação global”, foi criado em 2006, na cidade de Nova Iorque, por imigrantes chineses que são adeptos do Falun Gong. Esta é uma seita que, usando como cartão de visita a arte, ao anunciar o “renascimento da cultura tradicional”, na realidade trabalha pela difusão de valores de uma ideologia extremista. O Falun Gong é um movimento filosófico e religioso fundado em 1998 por Li Hongzhi. Abertamente negacionista, eles se recusam a aceitar, por exemplo, a Teoria da Evolução e quaisquer dos avanços trazidos pela medicina moderna. Combatem o feminismo, acreditam que a homossexualidade se trata de uma aberração, são racistas, misóginos, contrários à democracia e a laicidade do Estado. Ele foi registrado nos EUA como uma organização sem fins lucrativos, tendo uma receita declarada de US$ 8 milhões em 2011. Mas, no ano passado, atingiu quase US$ 230 milhões em ativos, conforme dados oficiais do IRS, que é a Receita Federal daquele país. Além da companhia de dança, que viaja pelo mundo todo abrindo portas para sua pregação, o Falun Gong é dono do jornal The Epoch Times, que foi fundado no ano 2000. Essa empresa de comunicação também registrou crescimento inacreditável, pulando em dois anos, entre 2019 e 2021, de um faturamento de US$ 7 milhões, obtido através da presença online, para US$ 76 milhões. Esses dados foram revelados através de uma reportagem da NBC News. E o jornal New York Times classificou como sendo “misterioso” tal avanço. Parte do lucro gerado foi usado para financiar publicidade favorável a Donald Trump, no Facebook. Ficaram em segundo lugar entre os financiadores, atrás apenas do próprio comitê de Trump. Em nosso país, o jornal também existe oficialmente, desde 2022. Seu capital social é de apenas R$ 1 mil e a sede fica em Curitiba. Consta que o Epoch Times Brasil vive de doações e assinaturas. Por aqui ele tem inclusive uma divisão de documentários, tendo feito alguns alegando fraude nas eleições dos EUA, que a China propagou o vírus da Covid de modo proposital e que vacinas fazem mal para a saúde. Um vídeo especialíssimo afirma que o governo chinês ajudou Lula a se eleger, em 2022. Ou seja, atua como uma central propagadora de fake news e de teorias da conspiração. Voltando às apresentações do Shen Yun, em geral após cada uma delas um grupo de seguidores, com roupas nas cores azul e amarelo, costuma oferecer folhetos e livros com as ideias da seita. Não se sabe se tal fato irá se repetir em alguma ou em todas as três capitais brasileiras incluídas no roteiro. De qualquer modo, o que se precisa evitar é que pessoas de boa fé e desavisadas acreditem que estarão pagando ingressos nada baratos para ver uma simples apresentação de dança. Em Porto Alegre, por exemplo, os preços variam entre R$ 429,00 (estudantes na plateia alta) e R$ 1.028,50 (inteira na plateia baixa). E o produto entregue está mais para gato do que lebre. O bônus do autor é um clipe de dança chinesa (esta é da China mesmo), mostrado em um canal de televisão. Há toda uma história envolvendo cada movimento, sendo a coreografia baseada em parte de um poema escrito por Confúcio, três mil anos atrás. A íntegra do texto aborda o retorno de um soldado aposentado para a sua cidade natal. Neste trecho, ocorre uma demonstração de que mesmo as estradas difíceis que se precisa percorrer na vida têm momentos de leveza. https://www.youtube.com/watch?v=b1TKJUI-l80 *Jornalista e blogueiro. Apresentador do programa Espaço Plural – Debates e Entrevistas, da RED. Texto publicado originalmente no Blog Virtualidades. Os artigos expressam o pensamento de seus autores e não necessariamente a posição editorial da RED. Se você concorda ou tem um ponto de vista diferente, mande seu texto para redacaositered@gmail.com . Ele poderá ser publicado se atender aos critérios de defesa da democracia.

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