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Em possível caso de lawfare, Cristina Kirchner é condenada a 6 anos de prisão

Em possível caso de lawfare, Cristina Kirchner é condenada a 6 anos de prisão

Internacional por RED
06/12/2022 19:11
Em possível caso de lawfare, Cristina Kirchner é condenada a 6 anos de prisão

Vice-presidenta ainda pode recorrer da decisão e não deve ser presa por ter imunidade.

A vice-presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, foi condenada nesta terça-feira (6) a seis anos de prisão e foi inabilitada a exercer cargos públicos pelo judiciário por “administração fraudulenta”. O Tribunal Oral Federal nº 2 também condenou a diferentes penas de prisão outros envolvidos no processo conhecido como “Caso Vialidad”.

Militantes peronistas fazem uma vigília em frente aos tribunais de Comodoro Py desde às 9h desta terça-feira e denunciam uma campanha conjunta do judiciário e da imprensa contra Cristina. A vice-presidenta também comparou recentemente o processo com um “pelotão de fuzilamento”.

Cristina pode recorrer da decisão na Câmara Federal de Cassação Penal e, em última instância, à Corte Suprema. Além disso, a vice-presidenta pode candidatar-se no ano que vem, dado que a resolução do caso teria de ser firmada pela Corte Suprema em, no mínimo, um ano para que seja barrada do pleito. Ela também não deve ser presa já que tem imunidade garantida por seu cargo.

Em pronunciamento nas redes sociais após a divulgação da sentença, Cristina afirmou que o caso não se trata de “lawfare”, o uso do judiciário contra adversários políticos, mas sim de “máfia e Estado paralelo”.

Entenda o histórico do caso

A vice-presidenta argentina é acusada de formar uma associação ilícita para beneficiar o empresário Lázaro Báez em licitações de 51 obras públicas na província de Santa Cruz. O início desta histórica remonta ao governo de Néstor Kirchner.

Néstor Kirchner chega à presidência em 2003. Lázaro Báez, amigo pessoal de Néstor, recebeu licitação para a construção de rodovias em Santa Cruz, através de sua empresa Austral Construcciones.

Assim, em 2008, a deputada Elisa Carrió (conhecida como Lilita Carrió), do partido Coalizão Cívica, denunciou o presidente por formar uma associação ilícita com Báez. Na denúncia, apontou também contra Julio de Vido, Ministro de Planejamento Federal, Investimento Público e Serviços de Néstor. Usaram como argumentos para a denúncia a amizade entre Báez e Néstor e o enriquecimento do empresário.

O caso foi apresentado ao tribunal de Comodoro Py e, por sorteio, ficou a cargo do juíz federal Julián Ercolini. Este declarou o tribunal como “não competente para investigar as supostas irregularidades denunciadas”, dado que as obras em questão foram realizadas em Santa Cruz, e o tribunal está radicado em Buenos Aires.

O processo de 2008 levantava argumentos utilizados no atual processo que será concluído hoje.

Em 2013, outra deputada da Coalizão Cívica, Mariana Zuvic, apresenta uma denúncia sobre o caso de obras públicas, desta vez em um tribunal em Santa Cruz. Baseia sua denúncia em declarações televisivas de Leonardo Fariña, ex-funcionário da construtora Austral. Ele declarou que as obras estavam superfaturadas, algo que voltou a repetir como testemunha no caso atual.

Como nesse momento Néstor Kirchner já havia falecido, a acusação recaiu sobre a então presidenta Cristina Kirchner. Como a própria vice ressalta, a dúbia figura de “associação ilícita” foi amplamente utilizada durante a ditadura para legalizar as detenções de pessoas sequestradas pelos militares, acusadas de integrar organizações armadas.

A justiça de Santa Cruz concluiu dois anos depois que os delitos denunciados não existiram, e os acusados foram absolvidos.

O último processo no caso das obras públicas

Em 2015, Mauricio Macri conquista a presidência da Argentina com a coalizão de direita Cambiemos (que depois, em 2019, passou a chamar-se Juntos por el Cambio, ou Juntos pela Mudança, em tradução livre). Meses depois da mudança de governo, em abril de 2016, o novo titular da Direção Nacional de Rodovias, Javier Iguacel, decide voltar sobre esse mesmo caso. Pede, então, uma auditoria sobre as obras licitadas ao empresário Báez em Santa Cruz. Foi seu primeiro ato de gestão no cargo.

A causa já havia sido encerrada em Santa Cruz, mas como governo nacional e o apoio dos meios massivos de comunicação, os interessados em ir a fundo no caso fizeram com que o processo prosperasse. A própria auditoria encomendada por Iguacel conclui que não há evidências de “diferenças construtivas de relevância, assim como tampouco tarefas que tenham sido certificadas sem executar-se, salvo em casos pontuais que foram detalhados em cada obras”.

Ainda assim, Iguacel apresenta a denúncia sobre irregularidades nas obras licitadas a Báez em Comodoro Py, na cidade de Buenos Aires. O sorteado novamente foi o juíz Ercolini. Desta vez, Ercolini não apenas decidiu tomar o caso – o mesmo que anos antes havia declarado como incompetente por jurisdição – como também ignora o princípio non bis in idem, que estabelece que uma pessoa não pode ser julgada duas vezes pelo mesmo ocorrido.

Cristina Kirchner questiona os “sorteios” que escolhem os magistrados para seus casos e afirma que eles costumam ficar com juízes alinhados à oposição.

A partir daí, o caso foi conduzido rompendo o Código de Procedimento. O sorteio dos juízes a cargo do caso foi realizado a portas fechadas, uma vez que recusaram o pedido do advogado de defesa de Cristina, Carlos Beraldi, de acompanhar o procedimento. Do sorteio, são nomeados para o julgamento do caso os juízes Andrés Basso, Rodrigo Giménez Uriburu e Jorge Gorini.

Segundo denunciado pelo jornal Página 12, o juiz Uriburu integra o mesmo time de futebol, o Liverpool, de um dos promotores no caso, o procurador Diego Luciani. Nesta semana, outro escândalo envolveu um dos juízes deste processo: o próprio Ercolini, quem conduziu o seguimento do caso das obras públicas, foi um dos convidados pelos diretores do Grupo Clarín a uma reunião com outros juízes, funcionários de inteligência e políticos macristas – incluindo o atual Ministro de Justiça e Segurança da cidade de Buenos Aires, Marcelo D’Alessandro.

Durante estes três anos, o processo correu com horas de audiências dos acusadores e da defesa dos 13 acusados. A pena principal, de 12 anos de prisão, recai sobre os considerados “chefes da associação ilícita”, Cristina e Báez, mesmo que não haja qualquer prova de comunicação ou vínculo entre ambos. Os outros acusados ocuparam cargos políticos no governo nacional ou na província de Santa Cruz, relacionados a obras públicas e planejamento.

Em sua última declaração como acusada no processo, no dia 29 de novembro, a vice-presidenta apresentou um documento em que aponta “as 20 mentiras do caso das obras públicas“. O documento busca refutar cada um dos argumentos apresentados pelos procuradores Sergio Mola e Diego Luciani.

Um dos pontos questionados pela defesa, e sintetizado no documento apresentado na semana passada, são os fundos supostamente designados pela presidência à província de Santa Cruz, algo que foi votado e aprovado pelo próprio Congresso Nacional. As obras denunciadas constam na Lei de Orçamento, aprovada também por deputados opositores.

Em audiências deste processo, uma das denunciantes, a deputada Margarita Stolbizer, do Juntos por el Cambio, negou ter sido pressionada para votar a favor do orçamento para as mencionadas públicas. No entanto, ela sustenta que houve corrupção. A deputada opositora alegou na segunda-feira (5) que a condenação de Cristina Kirchner “será uma sentença histórica”.


Matéria publicada originalmente em Brasil de Fato.

Foto do povo nas ruas em apoio à Cristina Kirchner em setembro deste ano – Fernanda Carvalho/FotosPublicas.

 

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