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O Ódio: Resposta Inaceitável ao Insucesso

O Ódio: Resposta Inaceitável ao Insucesso

Esporte por RED
29/11/2024 11:30 • Atualizado em 29/11/2024 13:01
O Ódio: Resposta Inaceitável ao Insucesso

Por CÉSAR LUCIANO FILOMENA*

Faz algum tempo que o Prof. Benedito Tadeu solicitou textos meus para o site RED. Muito trabalho, compromissos inadiáveis, falta de inspiração e angústia me impediram de escrever. Hoje, a angústia, agora vergonha alheia pelo ódio proferido, me obriga escrever.

De qual angústia falo?

Falo das emoções e afetos que constituem identidades, como diz Chantal Mouffe[i]. Falo em sentido prático da minha identidade gremista, da situação do Grêmio Football Porto Alegrense: uma das poucas coisas, talvez a única, cujo meu sentimento de paixão e emoções me fazem flertar com os limites da racionalidade. Foco na atual situação do meu time. Precisando, faço referência à coletiva de imprensa em tom ameaçador movido pelo ódio que o treinador Renato Portaluppi deu após o jogo com o Cruzeiro, na última quarta-feira, à qual não posso me omitir.

Antes que me acusem de ser um pseudogremista, “pouco participativo”, me adianto dizer que podem existir outros milhares tão gremistas quanto eu: dentre os 10 milhões que somos, ninguém mais que eu. Afronto com frequência minha racionalidade ao apelar às rezas, às mandingas, às promessas para “ajudar” meu time. Sim, sou gremista e dos “quatro costados”, racional e irracional, e passo mal quando meu time não vai bem, fico triste, minha vida deixa de ir bem, me angustio. Nesse sentido, Eduardo Galleano[ii] me compreenderia, não por amar o futebol como ele, mas o Grêmio.

O que nunca fiz, porém, foi me envolver na política interna do clube. Entendo ser este um ambiente nocivo à sanidade. A par de existirem pessoas dedicadas, no entorno há outros muitos cujos interesses fáticos são os da projeção pública, os dos negócios e dos oportunismos de plantão. Há muito perdi a paciência para demonstrar gentilezas para articular politicamente com pessoas que não me agradam e a frequentar ambientes nos quais não me sinto bem. Então, optei em ser um reles sócio patrimonial (sou do tempo em que essa modalidade existia).

Vamos aos fatos.

Há tempos Portaluppi é acometido pelos pecados capitais da vaidade e da soberba. Para alguns o maior ídolo da história do Grêmio, publicamente compensava ambos com seu bom-humor, gentileza e por uma notável qualidade de liderança, em especial junto a seu grupo de jogadores. Craque que foi, treinador de histórico competente, respondia ao sucesso com autoelogios, mas com justas proteções e referências aos atletas que dirigia.

Recentemente, principalmente após a enchente e aos insucessos continuados do time mudou o tom, principalmente para com a imprensa. Sem respostas em campo, adotou a ira, outro pecado capital, como forma de autodefesa, principalmente contra opiniões dos comunicadores.

Ao ser pressionado pelos jornalistas na entrevista coletiva pós-jogo do dia sobre mais uma atuação inconsistente do gigante Grêmio, Portaluppi, para alguns o maior ídolo da história do clube, em mais uma das longas e repetidas argumentações enfadonhas e iradas, nas quais a culpa pelos insucessos são sempre daqueles que o perseguem, proferiu em tom de ameaça um discurso de ódio temerário.

Disse:

“Se continuarem mentindo, eu vou dar o nome aos bois, vou atacar também, vou chamar de mentiroso, vou chamar alguns de covarde […] que estão se aproveitando da situação do Grêmio. Vocês também têm família, vocês também têm filhos no colégio, vocês também andam por aí […] e o torcedor também conhece alguns de vocês […]”.

Portaluppi, ao proferir essa fala, manchou sua biografia. Independentemente das tensões que o afligem, das dificuldades reais pós-enchente e das limitações que demonstrou em enfrentá-las condignamente nos últimos meses, insinuou ameaças à integridade de trabalhadores das mídias. Não há desculpas: é crime de ódio orientado pelo pecado da ira. Não há notas a posteriori que amenizem o dano.

Para o Grêmio a fala do seu treinador é imperdoável.

Como Instituição esportiva mundialmente reverenciada, a única que carrega no seu nome a cidade de Porto Alegre, só resta àquele que foi elevado à condição de “estátua” em vida sair. Dessa vez pelas portas dos fundos.

Uso “sair”, para apelar ao pouco de dignidade que com certeza ainda resta ao cidadão Portaluppi. Faço porque não vejo no presidente Alberto Guerra uma liderança racional capaz de agir com a urgência necessária para estancar um problema que vai muito além do futebol, mesmo sendo ele alguém a quem reputo uma honesta gestão financeira. Entendo, sem conhecê-lo, que confunde emoções e afetos que fazem dele um gremista, com a idolatria a um ídolo de carne e osso e que, por um paradoxo, hoje é seu subordinado.

Como não sou alguém que idolatra homens, amo o Grêmio, entendo que devo e tenho autoridade para reivindicar. Diante da irreversibilidade do dano, a única alternativa é mitigá-lo: SAIA RENATO!

[i] MOUFFE, Chantal. El poder de los afectos en la política. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2023.

[ii] GALEANO, Eduardo. Fechado por motivo de futebol. Porto Alegre [RS]: L&PM, 2018.

 

*César Luciano Filomena – Gremista, Doutor em Ciência Política, Auditor do Controle Externo, Professor, Politólogo e Engenheiro Civil.

PS1 – Eu, um menino que corria nas arquibancadas do Olímpico levado pelas mãos do meu pai. Sou um reles sócio patrimonial que desde o primeiro salário como profissional, ainda no ano de 1990, jamais deixou de pagar em dia o clube. Alguém que em minuto algum da vida prescindiu de incentivar e promover o Grêmio em qualquer lugar que fosse. Segundo entendo, maior instituição futebolística do Brasil, da América e do Mundo.

PS2 – Negando o homem racional que sou, quando o assunto é Grêmio, acabo apelando para imponderável universo da mandinga para “ajudá-lo”: faço promessa, rezo. Mesmo profissionalmente, sempre respondi negativamente a outras oportunidades de trabalho fora daqui dizendo aos interlocutores dos convites: Onde fica o Grêmio?

Ilustração de capa: Anderson Romão/AGIF)

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